**LÂMINAS DE ÁGUA NA LUZ DA LUA, NA LUZ DO SOL** GRAÇA FONTIS: PINTURA/Manoel Ferreira Neto: AFORISMO




É manhã nebulosa de inverno.
A luminosidade do sol, ainda fraca e serena, por isto toda a sua beleza e resplendor, cobre a Serra das Águias, vista da janela de meu escritório, janela aberta, re-costado ao parapeito, fumando cachimbo; em alguns pontos, há a presença de sombras, o equilíbrio de sombras e luminosidade tornam a paisagem inda mais bela aos olhos que desejam unicamente contemplar a manhã, senti-la profundo. Penso que estou inspiração - mas isto de inspiração não acontece de repente, como por aí dizem, como dizem "num piscar de olhos", a inspiração é presente a todo instante, nas suas bordas, circundando-a houverem dons e talentos
Nada há a ser feito, não há compromissos, encontros, diversões. É ficar em casa, talvez sentado na poltrona da sala-de-visitas, fumando um cigarro, olhando o tempo, deixando-me vagar nas asas do verbo que in-fin-itiva os ex-tases dos desejos, que gerundia as volúpias dos sentimentos, não importa quem se seja, o que faz da vida, para que lugar está indo, vai, necessita-se de alguém ao seu lado. O mais não se diga, não verterei lágrima alguma coisa, desde que alguém esteja ao lado.
Decido sentar-me nesta mesa, ao lado da janela, escrevendo ao sabor da paz, sem qualquer determinação de estabelecer um horizonte de minhas idéias, pensamentos. Muito menos do sentimento e emoção. Um ato absurdamente gratuito. Escrever é um ato em absoluto gratuito - saber o sentido do "gratuito" leva à compreensão deste dizer, caso contrário, o ato responsável, compromissado com isto é aquilo não produz coisa alguma.
As palavras, penduradas no tempo, suspensas no uni-verso e à soleira da eternidade, vão desfiando novelos de linha, linhas grossas, próprias para crochets, tecendo as letras de uma compreensão e entendimento. Cada instante é, no fundo, insubstituível: necessário concentrar-me, mister dispersar-me, dispersar-me e concentrar-me, a síntese. Quisera-me difuso, um pouco mais. A liberdade espera-me de braços dados, mas quem disse que o seu desejo, vontade não é de abraçá-la sempre, a inspiração, espera-me a cada momento. Conheço-a sempre e jamais a reconheço inteira. Talvez com os segundos teça incólumes figuras, teça imagens com os volos dos ideais do apogeu da compl-etude, esboçando as veredas suspensas no horizonte.
As letras, suspensas no tempo... Tergiverso o olhar para o teto da sala, vendo uma teia de aranha; vão imprimindo no espaço imaginário do papel a lingüística do momento. Emitem, no roçagar da pena, o ruído com grande energia e esfrego as mãos como se estivesse meditando, algo contemplando, sem reconhecê-lo, meditando, não re-fletir, re-fletindo e meditando, em verdade penso e questiono, e quando me pergunto se expresso a verdade que me a-colhe no re-colher da idéia, respondo: “Ora, fique quieto e se deixe levar, deixe-se leve, um passear no entardecer, o sol se despedindo atrás da serra, num bosque sereno”. Deixar-me sentir, deixar-me pensar, deixar-me ser...
Volos dos ideais
Do apogeu da compl-etude
Em cujas asas do verbo os desejos
In-fin-itivam a línguística da verdade
Desfiando simbólicas letras no signo lúdico de sin-cronias e sin-estesias dos instantes que seguem a linha do tempo, enovelando sonhos, a-lumbrando o vir-a-ser em cujas eurítides uni-versais do sublime moram a magia mística do eterno, mistério mítico do espírito. lâminas de água na luz da lua, na luz do sol.


(**RIO DE JANEIRO**, 03 DE MAIO DE 2017)


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