#DEBOCHE À MÁXIMA LATINA "COGITO ERGO SUM"# - GRAÇA FONTIS: PINTURA/Manoel Ferreira Neto: AFORISMO


**A razão precede os instintos**


Odes amorosas ou melancólicas, galhofa e primores níveos ou lilaseiros, avermelhos ou rosáceos, abrilhantem o fatal propósito, o perpétuo fado, perene fátuo, o cobiçado ser independente, para o despovoado arrebatar fundo, no âmago e ser seu, noctívago do entendimento, flectido já em existência sob a concepção do auge enlouquecido, ciente da plúmbea expectativa do babel ressuscitado, eis o que me pretere a existência em todas as suas extensões susceptíveis, razoáveis e intelectivas, plausíveis e instintivas, a sensualidade e os ossos, até mesmo as vísceras das entranhas. A razão precede os instintos.
Ser autônomo é apreciar a essência e entender com agudez e acuidade que o ser humano é a pessoa mais relevante do cosmos e que faz fragmento inseparável da existência e sem ele nunca existirá contentamento, em realidade o universo, a terra, a vida, sensibilidades e abalos que desimpeçam as entradas para auferir diferentes luminosidades a conduzirem os andares em comando ao imenso do bem-querer e da afeição.
Amaria, sim, colorir as flores brancas, desenhar nelas miúdas estrelinhas, uma a uma, com as tintas que perdi, com o pincel que deixei nalgum cofre do tempo, pedir-lhes dar alegria às minhas lágrimas, caminho a esse carinho escondido nos abraços adiados, nos olhares desviados.
Outrora, idade da minha ec-sistência! Outrora, idade das cores essenciais! Outrora, idade de ritmos re-nascidos! Depois de tudo, após a paz, o turbilhão!... a algazarra!...
Outrora, Idade de versos e estrofes inéditos! Antes das rimas e sonoridades, musicalidade, depois do prazer, a Bonanza, cambaleia a solidariedade, a compaixão, dançam o amor, esperança e fé, a valsa do crepúsculo, o tango da noite, o fado da madrugada, a cracoviana do alvorecer.
Outrora, idade da mesa habitual, sobre a terra onde semeei sementes di-versas, cultivei milho e rebanhos, rúcula e galinhas caipiras! Outrora, idade dos reencontros, encontros de faces em torno de mim, com os cheios e os vazios, com o nada e o tudo, com o efêmero e o perene, da verdade! Jamais a felicidade efêmera, prazeres transitórios, alegrias fugazes, nem as quimeras e fantasias que desejam o eterno e o absoluto, a paixão que busca, o amor que aspira o auspício do divino - porque ec-sigem devo olhar de néscios olhos para a beleza, para o que extasia o íntimo e o mais profundo, para a volúpia da carne fresca e ávida de prazeres insolentes.
O que levo dessa vida efêmera tanto vale se é a glória, fama, amor, ciência e vida, como se fosse apenas a memória de um tripúdio bem planejado e projetado. O "xis" da ec-sistência, por ser eternamente definitiva incógnita, dispensa minha ciência, debocha da máxima latina “cogito ergo sum”, aos olhos da sensibilidade e do espírito verdadeiro despautério. O mistério sinistro ou fascinante da morte, por ser assaz metafísico, dispensa o prosaísmo a que estou mais que familiarizado, e sou capaz de elevar-me além do Olimpo, onde os verbos traduzem a conjugação sublime de sua raiz ligada ao sufixo, as palavras verbalizam o eterno de ser sensível. Resolvo, para os devidos fins e conformes, dar o cabo de mim, varrer-me pros confins, muito além do jardim e das sete doses de Campari, a embriaguez com elas é inevitável, nem mesmo o famosíssimo Engov dá conta do recado, após o sono, nem mesmo a água colhida na fonte, cristalina e deliciosa, cura a ressaca.


(**RIO DE JANEIRO**, 16 DE MAIO DE 2017)


Comentários