#APRÉS-ENT-#AÇÃO" DE UM POEMA DE "DESPEDIDA" - A ARTE POÉTICA DE Maria Isabel Cunha# - GRAÇA FONTIS: PINTURA/Manoel Ferreira Neto: AFORISMO


O poema DESPEDIDA, da escritora e poetisa Maria Isabel Cunha, apresenta uma ironia singularmente interessante. Despedir é dizer adeus, é ausentar-se. Mas, ao contrário, o poema acaba de chegar, acaba de se apresentar, acaba de se presentificar. Maria Isabel Cunha está dizendo: "Oi..." Como assim? Neste poema, ela tece, compõe com genialidade o seu fazer poético, as sinuosidades linguísticas, semânticas por que se envereda para escrever, pode-se até dizer que ela passa a perna, faz tramóia, trambique com a inconsciência, na labuta de revelar, manifestar a sua alma, o que lhe reside nos recônditos d´alma, o que lhe habita nos interstícios do espírito. Jogos da mente. Jogos da consciência. Jogos do "fazer poético". Uma lição de criatividade, criação poética. Despedida? Não. Em verdade, #après#-ent-#ação# da vida contingente e do "eu poético." Aliás, muitos que se dizem poetas, poetisas, vangloriam-se com os seus versos, encomiam-se a si mesmos,aplaudem-se a si mesmos, e nada há de arte, de poesia, de literatura neles, deveriam ler, reler, reler até a consumação dos tempos para assimilarem o que é isto o fazer poético. Jamais, Maria Isabel Cunha, deixe de escrever, deixe de publicar. Se, por vezes, você se sente "sapo fora do brejo" com a sua arte, com a sua poesia, diante de tantas vulgaridades, publique, publique, publique. Ensine o que é isto "escrever", e ensine que a Poesia faz a Vida e a Vida faz a Poesia.


Manoel Ferreira Neto


DESPEDIDA


Deixei de querer escrever
Ninguém gosta do que escrevo
Para alguns é muito incipiente
Para outros, pouco sapiente
Naïf, sem criação, sem inspiração
Não mergulho os dedos nas nuvens
nem a cabeça no tempo
nem mesmo escrevo para contento
Escrevo o que sinto, sem escolas
nem estilos, apenas sentimentos,
pequenos remendos da alma
pra não ficar toda cinzenta
clareá-la um pouco, transponho o horizonte
vou procurar água à fonte,
naquela onde a água é mais pura, mais branca
me possa lavar o bolor, o fastio,
o sangue das feridas, causadas pela dor
das desditas da vida.
Vou voltar a enterrar a cabeça na areia
donde não deveria ter saído
pois lá encontra sentido
para o nada da existência
em que sempre tenho vivido
deixar as luzes da ribalta
para quem a procura em alta
descer ao sertanejo, onde sozinha me vejo
por lá passear minha busca, minha sede de evasão
de respostas para a adversidade a que fui votada
desde tenra idade, destino, maldição ou opção?...
Deixo o caminho livre, desinfesto
Quero poupar a poesia do meu incesto...
Nas fráguas da água pura te peguei
será lá que te deponho
para que brilhes, brilhes intensamente
com reflexos prateados dourados
sejas louvada noite e dia
como mereces por doutos e inspirados.
Não te esquecerei jamais, bem o sabes
Tu em mim estás presente
em espirais de fragrâncias
que preencherão minhas reentrâncias
e nelas me banharei com abundância…


MIFC


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