NO SILÊNCIO DA LÍNGUA A VOZ DA SOLIDÃO GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: POEMA @@@@


Desperto de madrugada,

Muito de madrugada,

No silêncio todo da alcova

Dividida, compartilhada com a amada,

No desespero da insônia

Que me acompanha,

É-me álibi e testemunha,

Desde tempos imemoriais,

Saio, fecho a porta,

Vou-me deitar na rede da varanda,

São – o canto do galo anuncia,

O relógio no pulso comprova –

Quatro e meia,

Poucos minutos restam para o alvorecer,

No verão isto acontece às cinco,

E, repentinamente, oh homens,

A cigarra inicializa seu canto,

Solidariedade, compaixão

No término da madrugada,

Preâmbulo do amanhecer,

Cantos do galo e da cigarra

A velarem a insônia?

Estamos despertos,

A humanidade é alheia aos mistérios, enigmas

Dormita, ressona, dorme, sonha, tem pesadelos.

A cigarra, o galo, eu vivemos a luz

De outros desejos, esperanças,

De outras contingências

Que florem o ser na floração do Tempo.

Doente, insone

Não importam os sentimentos de angústia

Que habitam os interstícios da alma,

A noite de ausência de sono,

Infinita,

Só tem a Cáritas dos cantos,

Só tem o fim noctívago,

O início da luz diuturna,

Somos todos a vida,

Somos todos o efêmero e o eterno,

Somos todos o nada e o tudo,

Somos todos o múltiplo

Que advém do Vazio,

No vai-e-vem da rede,

Amplio o olhar para a distância

Que passa entre as folhas de uma árvore,

Amplio os sonhos perdidos

Na incógnita juventude,

Encontro no silêncio da língua

A voz da solidão que me reside.

RIO DE JANEIRO(RJ), 25 DE JANEIRO DE 2021, 13: 29 p.m.     

 

 


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