CRIANÇAS OUTRA VEZ GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: AFORISMO @@@


A idade...

Há um tempo em que a idade é o centro sine qua non dos pensamentos, reflexões, meditações in totum introspectivas, das preocupações sobre os equívocos e culpas das atitudes obtusas, com o além, se existem ou não o inferno e o reino paradisíaco, o que é compreensível e saudável, alfim é o reconhecimento e o amor à vida, e muito se transforma até a consumação inevitável do fim, este se torna leve e sereno.

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Qual é a idade mais alegre, feliz, agradável? Aquela idade em que a vida são prazeres, ilusões, fantasias, tudo são maravilhas e magias? Nem a língua necessita mover-se, produzir o som da palavra para responder, o pensamento não precisa pensar. É a infância. O que torna as crianças tão especiais, tão alegres, contentes, sobretudo tão amadas, queridas pelos adultos, idosos, pelas pessoas? O que nelas leva a afagá-las no peito, carregá-las no colo, beijá-las com todo afeto? Ao ver estes pequenos ingênuos, até o insensível, o bruto se enternecem e os amparam.

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Qual é a causa? Não diria o ponto de vista ser ausência de senso, reverso, inverso à sensibilidade, outro nível sim de visão, interessante até. A natureza concedeu às crianças certo ar de loucura, por inter-médio do qual obtêm a redução dos castigos por suas pentelhices tolas, por suas mazelas inocentes, dos seus responsáveis e educadores, de seus pais, e se tornam merecedoras de afeição sem fronteiras, do coração dos familiares.

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Existe outra indagação de suma importância: de quem a criança recebe os seus atrativos, quem lhe oferece esta dádiva tão primordial, com tanta benevolência? De mim que sou despirocada, amalucada, sem qualquer senso, de mim que lhe concedo a graça de brincar, divertir, gozar livremente. Desejo com todo ardor que os homens me conceituem, definam, tachem-me de mentirosa, se não for verdade, se for fruto de imaginação fértil que os pubescentes, adolescentes mudam por inteiro de personalidade, caráter logo que principiam a ficarem homens e, orientados pelas contingências e experiências do mundo, entram no infeliz destino da sede de conhecimento, da fome de sabedoria, da carência de espiritualidade. Esvaece-se, esfuma-se aos poucochitos a sua beleza simples, diminui a viveza, as energias, some de vez a candura, acaba por anular-se o natural frescor.

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Ah, sim... Não há duvidar se a reflexão é sincera, arrancada dos recônditos da alma. Quanto mais o homem se distancia, afasta-se de mim, tanto menos desfruta dos bens, das felícias, investindo de tal modo neste sentido específico que logo atingem a fastidiosa, intragável velhice, tão indesejável para si como para todos de quaisquer crenças. Os homens seriam lastimáveis, dignos de dó e pena sem mim na consumação de seus dias. Quando a zopa velhice põe os homens à soleira do túmulo, faço-os de novo meninos, crianças, pentelhos. Os velhos retornam às criancices, voltam a ser crianças outra vez.

RIO DE JANEIRO(RJ), 09 DE JANEIRO DE 2021, 20:32 p.m.

 

 


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