Ana Júlia Machado ESCRITORA POETISA E CRÍTICA LITERÁRIA ANALISA E INTERPRETA O POEMA Folhas de Singelas Origens do Tempo SOB A LUZ DO EXISTENCIALISMO @@@@


Nos versos do escritor Manoel Ferreira Neto “FOLHAS DE SINGELAS ORIGENS DO TEMPO” que amavelmente dedicou-mos e que agradeço de coração.

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Revela suas inquietações, fantasias, mistérios e a humanização cada vez mais escassa no tempo em que vivemos. A futilidade sobrepõe-se aos valores morais e éticos. Hoje em dia a inveja impera. O medo que tire o protagonismo que não o têm. Quem o possui não preocupa-se com os outros nem vangloria-se de qualquer modo, para chamar a atenção dos medíocres. Fala de Vergílio Ferreira e dos portugueses com sensibilidade. Efetivamente tem muito a ver com o autor referido.

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Entre os escritores hodiernos portugueses, Vergílio Ferreira (1916-1996) evidencia-se, especialmente, pela controversa que importuna: um perspicaz humanismo, assinalado pela frenesi do homem enquanto ser no planeta (preocupações inerentes do escritor Manoel e que revela ao longo dos seus versos). Segundo alguns comentadores, as obras virgilianas acarretaram uma inovação estilística à literatura portuguesa, facto de novo posteriormente a Eça de Queirós, o que estimulou a fantasia portuguesa e desfechou novas probabilidades para a armação da história. Entre suas obras, a Estrela Polar (1962) – que o escritor Manoel enuncia as estrelas no texto, quiçá por haver recordado Vergílio Ferreira.

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As obras de Vergílio localizam-se dentro daquilo que a análise designa de etapa existencial, dispondo uma trilogia em que a espécie humana é indagada visceralmente. Dado o interesse dessa trilogia no conexo da obra de Vergílio Ferreira e recordando que a mesma é interposta por uma óptica existencialista (Doutrina filosófica que institui a existência transcendente do homem como início e alicerce para a resolução de todos os enigmas, desde a essência até a interpretação da vida humana. Esse movimento filosófico, que se induz especialmente nas reflexões de Heidegger e de Kierkegaard, tem em J.-P. Sartre um de seus maiores representadores, e admirador do autor Manoel Ferreira Neto), à qual preocupa a existência peculiar do homem, sua subjetividade, seu ser no mundo –objetivo de observar a relação do homem com os espaços que o circundam.

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Em Vergílio Ferreira insiste na extrema inquietação do homem virgiliano com a sua condição e, por dimensão, a da humanidade. Afinal, de concordância com o pensamento sartriano, a independência, nosso princípio elementar, condena-nos porque meditar o homem exclusivo implica opções e envolvimento de todos os demais. Por isso, somos “sentenciados à vida”. Isso corrobora, por outro lado, porque Vergílio Ferreira incessantemente sustentou, acima de tudo, o humanismo, espezinhando, toda forma de tecnicização que, em última força, transporta o homem à insensibilidade e, portanto, enfraquece sua humanidade. É o cerne de tudo.

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Como consequência, se o mundo ficcional é funesto, se existe pelejas, perdas, padecimento, incomunicabilidade, contrariedade de sentido entre homens, relacionamentos infrutuosos, existe igualmente muita beldade, muita energia, muitos valores, enfim, permeando as intercalas precisas. E isso é inerente do homem, de sua espécie, de sua comparência no universo. A dialética morte e vida é o suporte de tudo, instilando-se nas diegeses de Vergílio do início ao fim e instituindo, frequentemente, um jogo alvo/negro. O diálogo entre texto e leitor estreia-se com os oportunos nomes, locais despojados que possibilitam a invasão no texto, aliciando o recebedor às conjecturas e incorporando-se à temática dos romances. A isso se adicionam os sinais, os não-ditos, os cortes, as perscrutações, a segmentação temporal, que solicitam a participação do leitor e, consequentemente, a estruturação de um sentido. Na leitura, o receptor habita as práticas dos contadores, partilha seus sentimentos, ânsias, suas explorações, ensaiando o resultado harmonioso e materializando a obra. Dessa maneira, habita seus campos, muito alegóricos, que se aliam às temáticas, campos de reminiscência, de aperto, de aversão, de independência, de remição, de ressurgimento. Pode-se constatar que os homens virgilianos jamais se comparam somente concretamente com os campos das diegeses, espaços estes que sugerem representar um arqui-espaço. Em seus questionamentos e meditações, reinventam o mundo que os rodeia, pela reinvenção da locução, palavra-imagem, cujos resultados no leitor nem sempre são o que consegue-se dizer. A linguagem poética patenteia uma sensibilidade disponível a associar a Arte e a existência. E que dizer mais? É tudo que o escritor Manoel Ferreira Neto pensa e por isso, terá falado no grande Vergílio Ferreira.

Ana Júlia Machado

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RESPOSTA À ANÁLISE SUPRA

Efetivamente que sim... Desde que li ESTRELA POLAR de Vergílio Ferreira, amei de paixão, lendo toda a sua obra romanesca, inúmeras críticas e ensaios de autores credenciados, e Estrela Polar sempre o preferido. Vergílio Ferreira contribuiu sobremodo para a feitura de minha linguagem e estilo. Fernando Pessoa e ele são os meus autores preferidos e amados, a partir deles é que me apaixonei pela Literatura Portuguesa, até hoje sustento com muito orgulho.

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A Faculdade de Letras da Universidade Católica de Minas Gerais, nos anos ´80, fora infestada pelo pensamento de Jacques Lacan, dando origem até a um comentário: “Se o Conselho de Psicanálise baixar aqui na Faculdade, vai levar todos os professores para o manicômio.” Um deles, professor de Literatura Portuguesa I e II, Onofre de Freitas, escreveu uma dissertação sobre Estrela Polar, dentro da perspectiva lacaniana, focalizando a ESQUIZOFRENIA do protagonista do romance, mas fugiu completamente às posições existencialistas, negou-as, aliás, os professores odiavam o Existencialismo, especialmente Sartre. Fui eu convidado a escrever o prefácio da obra de Onofre de Freitas, já que eu conhecia bem o romance e a doutrina, neguei a fazê-lo, dizendo a Onofre de Freitas: “Não corroboro com o lacanismo, a sua análise nega completamente o universo da obra de Vergílio. Não vou fazer o prefácio não. Sou adepto do Existencialismo e da lealdade de análises com a obra analisada, não o sendo constitui falta de ética.” Não se tornou meu inimigo, mas daí para frente sempre me olhou de esguelha, por eu haver dito ele não agiu eticamente com a análise da obra virgiliana.

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Com esta obra Folhas de Singelas Origens do Tempo, a intenção fundamental fora o pensamento de Vergílio Ferreira, as minhas origens Existencialistas, o meu engajamento com a existência, pensá-la  sobre a luz do estar-no-mundo e as inquietações com a problemática que ela traz em seu bojo, a náusea de toda a posição humana frente às ideologias, a busca do Novo Homem, como Vergílio Ferreira focaliza em ALEGRIA BREVE. São as minhas origens esta obra que escrevi como intelectual e homem: “O mistério que envolve os sentimentos/Na anunciação da ETERNIDADE.” Sartre e Vergílio Ferreira, os mestres. A Faculdade de Letras queria-me lacaniano, jamais, apesar de eu respeitar o pensamento dele, traz muitas e muitas contribuições à Psicanálise.

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Como sempre de excelência a sua análise e interpretação, a sua ética com o meu pensamento é divina, Aninha Júlia, Ana Júlia Machado.

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Beijos nossos a você,  à nossa amada netinha Aninha Ricardo, à nossa família.

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FOLHAS DE SINGELAS ORIGENS DO TEMPO

GRAÇA FONTIS: PINTURA

Manoel Ferreira Neto: POEMA

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Epígrafe:

Ah, portugueses, de minhas sensibilidades,

“Sou fã das inspirações” que me concedem,

Enamorado de seus universos delicados,

Que “desabrocham no meu espírito.”

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DEDICATÓRIA

À Ana Júlia Machado, com o meu carinho e amizade

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Se é amanhã, sábado meio-dia,

Ou sombrio poente cobrindo a serra,

Meu tributo às coisas efêmeras

Que deslizam no tempo

Sagrado para as preces ardentes,

Rogando misericórdia para os pecados singelos,

Haverá de chegar

Nalguma nuvem qualquer

Que o céu não escureceu,

O temporal do Destino

Eternamente,

Quer na alegria ou na dor,

Quer no bem ou no mal,

Quer na náusea ou no prazer,

Lançará sombras densas no meu presente,

Fulgurará no meu futuro

Doces esperanças da singela origem

Do sol que me rodeava

Em plena primavera de odores florais.

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Minhas paixões

No pé do mar no anoitecer,

Hora do Angelus, às seis horas em ponto,

Um vento saindo do Bosque das Estrelas,

Acariciando-me o corpo,

Convidando-me a meditar

Na fonte dos sonhos do amor

Divino e pleno,

As estrelas nos ares só me

Lembrando olhares da linda mulher

Que sei amar

Há muitos e muitos anos já,

Sobre a minh´alma da alma

De quimeras e fados,

De sonhos e blues,

Despertando-me no peito

O mistério que envolve os sentimentos

Na anunciação da ETERNIDADE.

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Há uma ou duas estrelas no céu,

Nesta madrugada de sábado para domingo,

Uma estrela de sétima grandeza

Dupla e mutável,

A outra, grande estrela da Lira,

Sentindo-me invadido por elas

Ao lembrar-me do som de uma música

Italiana que sempre me encantou, SILENZIO,

Especialmente lendo Estrela Polar,

Do escritor português Vergílio Ferreira

Numa tarde de outono,

No alto da montanha,

Caindo cada vez mais no mar sem costa,

Ah, portugueses, de minhas sensibilidades,

“Sou fã das inspirações” que me concedem,

Enamorado de seus universos delicados,

Que “desabrocham no meu espírito.”

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Por fim, nesta manhã de domingo

Recorda-me haver debruçado

Sobre folhas de ciência do Passado,

Perdi-me em fantasias e em nada.

RIO DE JANEIRO(RJ), 30 DE JANEIRO DE 2021, 00:38 a.m.

 

 


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