CAPÍTULO VIII ERROS DE ESPÍRITO OU DE SENSO GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: NOVELA @@@@


Erros de espírito ou de senso!

Creio ser de extrema relevância esta questão. Dizer ser louco não é tão simples – antes, referi-me ao juízo, julgamento. Nesta base é que ora me fundamento, o intuito é de esclarecer, elucidar. Inda não me decidi, sei lá o que de por trás possa haver atrás disto. Alguma coisa há, até eu possuo lá os meus níveis de inconsciência, mas ao longo do tempo vou desnudando-a, desvelando-a, verbalizando-a. Seria que devesse ou não chamar, conceituar sem distinção qualquer de loucura todo erro de espírito ou de senso? Então, olhando por este prisma de visão, sou um erro do espírito. Agora é que as coisas se tornam complexas e complicadas: uma deusa dos homens acaso pode ser um erro de espírito? Sendo isto, não haverá quem acredite, possa crer em mim. Haverá sempre respostas para tudo. Não me calo, pois que sei construir os meus argumentos com perspicácia e profusão. Não por intermédio de oratórias ridículas, de nonsenses, como é de práxis nesta nossa Idade Moderna, mas através das contingências da vida, das experiências. Isto é apenas um xeque. Xeque-mate é impossível dar-me. Tentar é inútil.

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Diz-se ser louco todo aquele que, sendo curto de vista, sendo bitolado,  toma um burro por jumento, confunde uma cabeça de alho com bugalho, ou por ter pouco discernimento das coisas considera de excelência um mau poema, ser um gênio da poética artificiando rimas internas e externas num único verso, continuar a fazê-lo em todas as estrofes, aí se pergunta: “Isto é um poema ou um festival de rimas?” Aliás, venhamos e convenhamos, a rima foi condenada à fogueira desde a Semana de Arte Moderna em 1922 – o que era antes genialidade tornou-se bestialidade - constitui ela uma atitude de péssimo gosto.  Quando um homem comete um erro absurdo, não só de senso, mas também de inteligência, nele persistindo de fio a pavio – por exemplo, ao ouvir o zurro de um asno, julga escutar uma sinfonia dos deuses, pobre e de origem humilde imagina ser Onassis ou Bil Gates – neste caso, diz-se que o pobrezito desmiolou-se. Essa loucura é bem mais sarapalhada do que em geral se imagina, pensa-se. Por vezes, é um louco que se ri de outro louco, – o louco Gogol ria-se de si próprio, sentindo prazer com a própria auto risada  – divertindo-se ambos mutuamente. Também não é inédito ver-se um mais louco rir-se muito de outro menos que ele. Na minha modesta opinião, se se quiser mera, o homem é tanto mais feliz quanto mais numerosas são as suas modalidades de loucura. Se alguém ao vir uma melancia, tomasse-a por uma mulher, dir-se-ia ser o coitado um louco. Mas quando um marido de todo imbecilóide adora a mulher, julgando-a ser mais fiel que a amiga de Sartre, Simone de Beauvoir, mesmo que ela contribua de todos os modos e por todos os meios para fazer crescer na cabeça não apenas um par, mas um bosque de chifres, e intimamente se felicita, bendizendo enormemente o seu destino. Não é que aqui acabo de introduzir o “amor fati”, isto é, o “amor ao próprio destino? Teço apenas um pequeno esboço só para enfatizar a minha idéia. O amor é extravagância existencial, pois que as pessoas vivenciam a loucura da paixão sem a vergonha que tanto impede o florescimento da singularidade.

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Conheci um “Mauricinho”, se se quiser um “Almofadinha”, como se denomina na gíria o burguês de galocha e esporas que a esposa infestou-lhe a cabeça de chifres. Sofreu. Precisou de psiquiatra. Empanturrou-se de medicamentos fortíssimos, no final das contas foi viver com ela novamente, após um certo tempo, as razões não as sei dizer, fato é que se separou da mulher e casou-se com outra – detalhe: só a última letra do nome foi diferente, a primeira terminava com “e”, a segunda com “a”,  isto não é loucura nos tempos hodiernos, tornou-se a coisa mais natural do mundo.

RIO DE JANEIRO(RJ), 14 DE JANEIRO DE 2021, 22:OO p.m.   

 


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