#À SOLEIRA DO FOGÃO DE LENHAS# GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto/GRAÇA FONTIS: POEMA



Nas labaredas, o afeto, a afetividade,
À soleira do fogão de lenhas,
Murmúrios, sussurros,
Vozes estrídulas,
Crio, gosto de criar,
A imagem dos entes queridos à mesa,
Panelas de ferro, a comida quente,
Limita-me, queimo-te!
Hei-de transformar tudo
Em essência o tempo todo,
Vermelho brilhante, carente de afagos, aplausos,
Perto da churrasqueira, ao calor do fogo,
Re-colho as labaredas,
As mãos em concha, a verdade de agora,
Pupilas faiscando
De luz, o peito corta a alma em festa
Num tempo exíguo, num instante-já
Amiúde, escorre entre-dedos,
Olhos perdidos nalgum sítio sombrio,
Contudo, aconchegante, dir-se-ia "sereno"?
Na língua, o silêncio linguístico das palavras,
Nós... Ninguém.
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Terra do alto, vem poeira
Poeira das metafísicas, poeira das exegeses,
Poeira das psicanálises,
Lá onde a estrada começa,
A luz do fogo convidando ao aconchego,
O fogo não é só agressivo, há outras dimensões nele,
O devaneio,
Lá onde os desvarios levam a horizonte distante,
Sonhos, utopias, quimeras,
Desejos, esperanças, fé,
Labaredas da compl-etude,
Labaredas chamando os olhos para a sua con-templação,
Ou sei lá de quê,
Lá onde os devaneios são faíscas do sonho,
Re-velar os tempos, a continuidade das querenças
Sob o perene das contingências, dores, sofrimentos...
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Para o vislumbre da luz
Ao se desprender da escuridão uterina
No gesto vertiginoso do membro
Que rompe, crê e liberta
Grito....
Desejo...
Sabor....
E passam, desfilam, e observo
O vento, o homem, a mosca
Eis um arrepio
Os sons são invisíveis
Calo-me comprimido pelo medo
Pelos enganos da morte
E no que mais a loucura agarra
Ou se agarra
No transcurso dos lábios
As essências se multiplicam
No tudo que aos vivos pertence
Transcursando os gestos afoitos
Firmes e fiéis
Por vias no fogo celestial
Que cresce e aquece
Todo peso terrestre
Num ermo espiralado
O ranger dos sonhos da existência
Nas reminiscências exageradas
De elasticidades
Clímax nas mãos sedentas, excitadas
Abrigo da voz revolutiva na madrugada
É um apalpar sombras de estranhos contornos
Um descobertar raízes para vislumbres da luz
Nas sonoridades diáfanas
Invisibilidade dos sinos no alvorecer
A soarem nas chamas inextinguíveis,
Versam felizes
Alegrias, futuro, amor
São lâminas aquecidas
Que da boca soltam-se
No comprimento abrupto da sensatez
Os ventos inoportunos atravessam
São missivas idílicas que a todos consolam.


#riodejaneiro#, 03 de agosto de 2019#

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