#LIRA DAS LINHAS E ESPÍRITO ETERNOS# GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: PROSA



Caminho nos pensamentos, esbarrando-me remotos dias, pretéritos medos. Reagrupo-me às sombras; retrilho uma cena qualquer, viajo nos detalhes dos trajes, cores, conversas, a eternidade das mãos troteando o corpo... Desvairado, rendo-me à ficção da noite, perdida no irreversível. Enlouquecido, remedio-me das mentiras da escuridão à luz dos postes, in-verdade das trevas à vista da vela acesa na janela. Disperso, rendo-me à realidade da aurora nas entranhas de uni-versos a serem construídos.
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Veredas...
Fogo de bala,
travessia,
curiangos,
aves pretas,
flor de pau,
cascalho solto,
faísca de ferradura.
A noite é só tocaia,
um descuido é perdição,
é sumiço,
cachorro late-mordendo,
cobra dá bote e esconde,
burro coiceia e refuga:
“Viver é muito perigoso”.
Grito,
perdido na morte,
doce riso,
amargo fim,
viver é pré-liminar à cova.
Passo curto,
passo certo:
Travessia.
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O que me pergunto é: quem em mim é que está fora do eterno prisioneiro das linhas? quem em mim é que está fora até de pensar, elucubrar, imaginar? Se indago com tanta efusividade é que, com sorriso nos lábios, olhos faiscando, alguém me dissera sou eu a inversão, melhor ainda, a inversão sou eu nas re-versas ad-versidades das ipseidades e facticidades.
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A ressonância da pá-lavra per-corre soberana,
con-tornando muros e montanhas,
escoando em ondas.
Risco,
arranho,
demulo,
penetrando alvos.
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No miolo da noite, outra noite acontece, e o que era transluzente, aos poucos escurece como ondas nebulosas, sufocando, envenenando, roubando o nascer do dia, o re-nascer de outras palavras, horizontes e uni-versos.


Meu passo é ponto,
meu corpo,
fonte.
Em que estrela aportará meu sonho?
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Viajo no tempo que voa nas asas da imaginação. Eis o grande desafio: salvaguardar os devaneios, sua sagrada significação para o meu destino de fazer-me voar rumo ao espaço aberto. No momento presente, sei o que foi, o que era, o que vai ser, o que será. Só não descubro o artifício que me contorce nesse ponto/uni-verso onde me encontro passageiro das quimeras, sonhos, fantasias, utopias. O próprio ser que me con-figura sangra ferido: “viro longe no mundo, piso nos espaços, faço todas as estradas”. Num passo de magia a terra vira, torna-se vida nas mãos de lira das linhas e espírito eternos.
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Restaram-me equívocas pétalas das palavras,
diariamente nascentes,
para o nada obliterante do não-visível.
O tempo se faz devagar,
tateando símbolos.
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Roucos ruídos, sugerindo amor às linhas eternas do espírito e das páginas de sonhos e quimeras, penetram meu silêncio. E a flor de meus sonhos de ser segue trans-colorindo a tela vácua do horizonte, sem saber que ingratos olhos distorcidos na distância são labaredas extintas, avesso riso, in-verso amor nas versificadas sedes de encontro e vida, metrificadas fomes de liberdade e ressurreição, ritmadas ilusões de con-templar o ser à luz do verbo, in-versa distância nos des-lustres de ausência: (in)afeição que crio e nela própria des-orvalho o re-verso lado da luz.


#riodejaneiro#, 16 de setembro de 2019#

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