ETERNOS, ?MAS ATÉ QUANDO# GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: POEMA


EPÍGRAFE:
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#?À eternidade... Os ventos res-ponderão.# (Manoel Ferreira Neto)
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Completo silêncio. Na malícia das coisas. Na fuzaca dos objetos. Na algazarra das falas e vozes. Nas ideologias da consciência e da liberdade. Nos interesses de bem-estar, prazer, puro deleite. Nas ironias do cinismo aberto, respeitem a mofa, considerem as mangofas! Nos sarcasmos das ironias, dignifiquem a liberdade! Nas sátiras dos sarcasmos, vangloriem a dignidade, a honradez! Deste neto de palhaço de circo... Silencio dentro do silêncio as palavras, dentro do silêncio silencio os verbos... educado o cavalo alado a sobrevoar as profundezas dos abismos e das sombras, deixo-lhe livre como um abismo sem fim, lembrar que neste instante sinto o sono dos sonhos que hão-de vir.
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A interrogação não seria digna de re-conhecimento, embora a ad-versativa, e não no final do pensamento, da frase, mas a dúvida que se me apresenta, rondando(rodando) a minha cabeça, a paixão do ser devora, até quando, seria o tempo longo, curto, posso esperá-lo tranquilamente, ou terei de sentir o silêncio do vazio de eternizar-se, não tendo-a vivido na con-tingência... assim pensando e sentindo o ponto de interrogação antes do ad-versativo "mas", antes do pensamento e dos sentimentos que percorrem o que há-de eternidade em mim. O que isto importa, o vazio in-coerente, re-verso de silêncio e sons, imagens, contra-luzes, luzes, perspectivas, contra-dictório, levando os cobertores, cobrem bem as carências, e agora, inautêntico, mas a autenticidade está no mov-er o dito, ouvido, silenciado, a fala?
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Os ponteiros do relógio suspensos na parede inertes, o vento silvando, as cadelas, Jana e Paloma, farejando o perfume da coberta da cama, o jornal sobre a mesa, uma cadeira estrangeira, a música na internet, nesta manhã de início da Primavera. A esposa está preparando as coisas do almoço, lá com os seus pensamentos, idéias, inspirações, seus deveres e compromissos, no jogo de improvisar o tempero e o sabor do ensopado de peixe.
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Antepassados ouvem o clamor de vozes e estabelecem um diálogo, ouve-se-lhes silvos. Antepassados e descendentes se tocam, se apalpam pelos seus contrários, dialécticas, nonsenses, compreendem-se e se justificam. Visão de um antepassado se dirigindo do fundo da eternidade, re-colhe imagens nesta travessia, dos panoramas e paisagens, e se projectando diante de si mesma, alargando-se no tempo e se autojustificando existencialmente, ora no imperfeito, ora no futuro do pretérito numa alternância que revela a equivalência estilística de um tempo para o outro. Pros-pectivas de sonhos, utopias.
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Houvesse única voz neste instante de completo silêncio se manifestando, de imediato perquirindo quem seria eu na hora da morte, na solidão de casa onde descanso, ouvindo a contra voz, olhos faiscando de brilhos, e neles as fagulhas de sarcasmo, sátira, por perquirição tão des-cabida, se na hora da morte, seria o início do nada, projectando-se aos in-fin-tivos verbos do infinito, nada mais seria, a contingência e, o vento res-ponderá, que peça de pintura criaria para isto, fosse eu artífice da plasticidade da arte, sentido de liberdade, o seu segredo, é ser livre, e isto é para sempre, na imensidão do mundo e da vida?
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Os pensamentos nascem por trás de mim, como uma vertigem, sinto-os nascer atrás de minha cabeça... se eu ceder, virão para a frente, aqui entre os meus olhos - o pensamento cresce, cresce, e ei-lo, imenso, enchendo-me por inteiro e re-novando minha existência, o impossível o meu tudo preencher o meu nada, o que há de suceder se o sinto nos passos e vertigens entre o aqui-e-agora, entre o pretérito e o que há-de ser ou que seria, tragédia grega da maior profunda melancolia, a vida à luz das perspectivas do pensamento, das idéias e da imagem do eterno, os sons perpétuos, os ventos responderão.
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E vem surgindo um som, uma voz, sussurra, murmura, um grito altissonante: "Faltam-me o arranjo, o som, o ritmo, a melodia, o acorde... Falta-me a música neste instante de silêncio, falta-me a ópera." O grito esplende-se, ecoa, e passando por entre montanha assobia. Levantem a cabeça e olhem ao redor o que deseja criar novos mitos e o que se satisfaz com os antigos, o que ama no homem sua morte, o que ama no homem sua vida, na vida o homem, o humanista alegre, contente, feliz, embora todas as suas dúvidas e questionamentos, que tem uma coisa hilária para dizer, os humanistas deprimidos, que são encontrados sobretudo nos velórios.
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Revérberos semelhantes de uma mesma imagem. Levanto-me da cadeira, dirijo-me ao parapeito da amurada da varanda, vejo um lance do mar ao longe, o tempo virou, nublou-se, venta um pouco, cão late, barulho de carro, de motocicleta, vozes de transeuntes. Sorrio. Acendo um cigarro, trago, expilo a fumaça. É culpa minha se o vinho no copo está sem gelo, se há manchas escuras no espelho, se sou demais, se o mais digno de meus sofrimentos, mais honradas de minhas dores, os mais secos se arrastam e se entorpecem, com excesso de carne e a pele muito larga ao mesmo tempo, com grandes olhos úmidos e comovedores? Faltava-me o som do silêncio: o que de mim seria, fora, sem ritmos, melodias, acordes, careceu-me a ópera. Sigo deslizando entre as antíteses, sem me embaraçar, sem os atalhos da noite, do dia, da hora do almoço.
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Silêncio. Sons. Palavras. Imagens. A eternidade é feita de instantes (Eternos, ?mas até quando), a água que corre já viu a valeta da rua. O rio-tempo fluindo nos instantes posteriores.
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Estamos em nossa cama, após o almoço! Dormir o nosso sono comungado aos sonhos que hão-de vir e de ser!


#riodejaneiro#, 25 de setembro de 2019#

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