**SARTRE E A LIBERDADE** - ENSAIO FILOSÓFICO: Manoel Ferreira Neto​


Como encontrei "tentativa de poetizar o pensamento, idéias" de Foucault, epistemólogo frances, que já teci as minhas considerações, apresentando um Esboço de uma Ética dos Valores, encontrei antes poema apresentando a questão da Liberdade em Jean-Sartre.
Eis a minha RESPOSTA a este Poema, analisando o pensamento de Sartre.

Sartre, em Diário de uma guerra estranha, diz haver perdido a fé aos 12 anos.  Sua mãe fez-lhe fazer a primeira comunhão, mas ele crê, por respeito à liberdade futura do que por verdadeira convicção. A fé não é desprovida de religião, mas tem uma religiosidade vaga que a consola um pouco quando precisa e que, durante o resto do tempo, a deixa em paz.

A sua vida de escritor? O que ela significa: um diário, um testemunho que vale por milhões de homens. É um testemunho medíocre e por isso mesmo geral. Intervém aqui um artifício do Diabo, como diria Gide: sou estimulado pela própria mediocridade da sua condição, não teme mais se enganar e fala ousadamente sobre a guerra, porque seus erros terão valor histórico. 

A liberdade é um fazer, tal fazer é necessariamente histórico, não só porque supõe a historicidade como rasgo essencial do homem, como também porque a determinação histórico-metafísica do que seja o homem determina inclusive a essência da liberdade.

A validade eterna do sujeito livre, que se realiza através de sua liberdade, é a validade de sua própria história-terra e por isso ela é também sempre co-determinada internamente pelos momentos impostos que constituíram a situação temporal do sujeito da liberdade, co-determinada pela história da liberdade de todos os outros que entram no mundo concreto de suas relações pessoais.

A interpretação cristã dessa situação do sujeito da liberdade diz que essa situação determinada pelo mundo das relações sociais é inevitavelmente plasmada também, para o indivíduo em sua livre subjetividade e em sua decisão histórica particular, pela história da liberdade de todos os outros homens. 

Busque-se, desde já, compreender e entender. Abraão ouve a voz de Deus e se dispõe a matar o filho; depois um anjo de Deus lhe segura a mão, impedindo o assassinato. No entanto, a decisão, em última instância, foi dele. Como ter certeza de que a voz que nos fala de Deus, de um “espírito maligno” ou de nossa própria mente? Sartre, pensando o drama do patriarca hebreu, comentava: “não há escapatória, o ser humano está condenado à liberdade” .

A escritura não diz que Abraão haja feito algo; somente creu em Deus e por isto foi justificado. Portanto, a justificação em Abraão como em todos os demais homens não é um prêmio ou uma paga, senão um dom gratuito, uma graça, mas requer “a fé”.

A fé de Abrão, segundo Gn 15,6, consistiu na confiança em uma promessa humanamente irrealizável; mas na mente de Paulo há uma consideração mais profunda, a saber: Abraão creu em Deus, e Deus o fez justo, isto é, o filho grato a ele, perdoando-lhe os pecados.

O grego diz literalmente “a fé de Cristo”. Entendemos este genitivo de Cristo como objeto da fé. A fé é a adesão  do homem à pessoa de Cristo.

A liberdade é “conteúdo” de uma experiência transcendental (isto é, de uma experiência que fundamenta a possibilidade geral de sentir livre o homem em atos livres concretos), e não um dado isolado de nossa experiência objetiva. Não podemos, por nós mesmos, numa experiência individual, como nos diz Juan Luis Segundo:

“... indicar com segurança determinado ponto de nossa vida e dizer: exatamente aqui, e em outra parte alguma, produziu-se um sim ou um não realmente radical diante de Deus” .

A liberdade tende a decidir sobre o homem como realidade total, o homem é a sua entrega à busca de seu sentido, do que lhe falta. Esta consideração nos coloca, agora, outra questão: até onde é possível ao sujeito, que age livremente, praticar de fato em sua decisão essa tendência em dispor totalmente de si, em toda a amplidão de seu ser?

Haverá sempre, e de maneira essencial, uma tensão entre o que o homem é, como realidade simplesmente dada, e o que o homem quer fazer de si mesmo.

“... escreverei qualquer coisa, sem humildade. Vê-se aqui a astúcia do orgulho. Muito lúcido para atribuir valor a tudo o que escrevo (tagarelices, falatórios, vaticínios políticos, estados de espírito), passo a passo passo a conferir valor a todas as minhas notas, sem exceção, por um desvio da História” . 


(**RIO DE JANEIRO**, 21 DE FEVEREIRO DE 2017)

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