*POETA? NÃO POETA?** - PINTURA: Graça Fontis/PROSA: Manoel Ferreira Neto


Estudante, desde o início dos estudos universitários, afirmava categórica e radicalmente não gostar de Poesia, não queria ser poeta. A ironia: no primeiro dia de aula na universidade, 13 de fevereiro de 1978, conheci o poeta Paulo Ursine Krettli. Volta e meia, Paulo Ursine questionava-me a razão de não gostar de poesia, gerando um debate de horas. Dizia-lhe: "Como ser uma coisa que não entendo, compreendo? Tenho sérias dificuldades de entendimento da poética. Sinto-me bem com a prosa, entendo-a, compreendo-a."
O grande problema disso não residia em relação a Paulo Ursine, tínhamos liberdade de debater, dialogar. O problema sério residia com relação aos colegas poetas. Sentiam-se negligenciados, menosprezados, subestimados. Julgava-me superior, a deusa era a prosa, poetas eram seres medíocres. Olhado de todas as bandas, soslaios, esguelhas. Insatisfações, raivas, ódios, mágoas, ressentimentos brilhavam nos olhos de todos. Foram-se as Letras, foi-se a Filosofia. Com a Filosofia, ampliei ainda mais o uni-verso da prosa.
Os questionamentos de Paulo Ursine não se calavam. Para alegrá-lo, garatujava versos, dava-lhe de presente. Dizia ele: "Um poeta que se recusa a ser poeta."
Em 1989, já distante do métier acadêmico universitário, submetendo-me a terapia, com todos os questionamentos de Paulo Ursine, decidi responder aos seus questionamentos sobre o porquê de não gostar de poesia, não entendê-la, não compreendê-la, em versos. Escrevi em cinco dias cem poemas, cuja eidética era a dialética existencial sensibilidade e intelectualidade. Entreguei ao Paulo Ursine o livro pronto, sem título. Participei tão logo minha mudança para São Paulo. Esqueci-me do livro, que só agora vinte e oito anos depois Paulo Ursine me devolve.
E, relendo a obra, re-colho versos fundamentais para a compreensão e entendimento de não gostar de escrever poesia, não gostar de ser reconhecido como poeta. "... não posso viver/sem o corpo de meus pensamentos...", presente no poema INTEIRO, sendo o "corpo" da obra, a partir desses versos torna-se trans-parente a razão da recusa de ser poeta, reconhecido poeta.
Apesar de, hoje, as dificuldades de entendimento e compreensão esvaíram-se com o estudo sistemático da Estética, da Poética, escrever poemas continuo não gostando nem um pouco, amo a prosa, vou às nuvens nas suas asas.
Nesta Antologia Poética, Prosa e Poesia estão no Divã Existencial - genialmente intitulado por Paulo Ursine. Sigo as sendas e veredas da prosa, a minha paixão insofismável, e nas sinuosidades dela ouso a poesia, apenas uma ousadia.



(**RIO DE JANEIRO**, 15 DE FEVEREIRO DE 2017)


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