#AFORISMO 352/CORREDORES E CÔMODOS DE SENDAS DE FOGO E INTELIGÊNCIA# - GRAÇA FONTIS: ESCULTURA/Manoel Ferreira Neto: AFORISMO
Se me legar o direito de questionar se as idéias são coerentes, ao menos
neste comenos entre intróito e desenvolvimento, o que preferi buscar fundar com
palavras, diria não ver qualquer sentido inteligível, está havendo algo não
posso definir. Escrevo num fôlego até sentir ser instante de interromper,
deixando tudo de cabeça para baixo, por momento posso sentir começo outra vez.
Se a vida é isto aí, então é tempo de iniciar outra, estabelecê-la ao longo de
sendas de fogo e inteligência.
Daí, encaixo a árdua empresa de revisão, trabalhando aqui e ali,
desejando o que poeticamente me habita; enfim, quem não está diante de homem
cindido em dois que tenta soldar as duas metades, do leite ao caldo de pimenta,
ao ácido crítico andam as idéias, pensamentos sobre o devir?
Isto sem interferir na estrutura, imagens, idéias, utopias, a partir de
ouvi-las dizerem as verdades, e eis a razão de, enquanto crio, ouvir músicas
sei despertam sentimentos e emoções profundos, mesmo não os conhecendo, a
preeminência do intelecto interfere.
Corro pelos corredores e cômodos de sendas de fogo e inteligência,
desejos e vontades, demasiado grande sob o olhar dos homens, indivíduos,
cidadãos, isto é, sob o olhar do outro. O livro, álibi e cúmplice de desejos e
sonhos, seria o companheiro de todos os momentos. A experiência do engajamento,
hoje, está em transcurso: trata-se de saber se existe uma só atitude neste
mundo falsificado de que possa dizer tranqüilamente: fi-lo eu.
Reconheço as ações, responsabilidade, desejo de liberdade e consciência?
Mas não se tornarão outros ao realizarem-se? Não haverá outros que os prossigam
em meu lugar? Outros que me são mais queridos do que eu e que se alimentarão do
meu sangue. Sentir-me-ia justificado se ao menos fosse autêntico, original, não
arrastasse único passo além da fidelidade.
Esse estrangeiro, no íntimo, decidiu o comportamento, hábitos, valores,
ouve os gritos da multidão que lhe habita, algemas e correntes doem nos ossos.
Não intuo outro modo de ação, por quem condena a iniciativa e protesta dizendo
apenas me comprometer mais e mais – ótimo, não se deseja outra coisa senão
fechar as portas, as chaves coloco-as em mão - senão dar as costas, esbagoar as
críticas em esquinas, tabernas, tabernáculos. Cabem-lhe o encômio de seus interesses
e ideologias, a censura aos outros.
Viva agitação se apodera de toda a gente que não conheço, censura-me as
“invertidas”, o caldo de pimenta, ácido crítico que ofereço num cálice, e sob a
sedução de contornos e detalhes, outra alternativa não lhe resta senão
recebê-lo, degustá-lo com os olhos derramando lágrimas fáceis. Cada uma das
palavras, inscrevendo-se na passividade do ser, organiza-se como torniquete
cuja imperiosa inércia define o homem quem sou, o estrangeiro, o outro que
tenho de ser para lhe dar o primeiro impulso e para o renovar incessante.
Se não se deixar as palavras revelarem-se, quaisquer interpretações e
análises serão possíveis e passíveis de desvirtuamento. Alguém das relações
íntimas dissera-me: “Deverá estar atento ao que se interpreta, de todos os
lados que se deseja desvirtuar, o campo está minado”.
Quem sabe houvesse possibilidade de algo, em princípio ininteligível,
tomado de inspiração e intuição, e deste modo, neste estilo sem sujeito,
abordar alguma utopia que foge à capacidade da razão e do intelecto
interpretar?!... Fosse necessária leitura atenta e minuciosa, deixando o
espírito livre. Não saberia a isto responder. Só seria possível estabelecer, se
contemplasse a linguagem sem pressa.
(**RIO DE JANEIRO**, 02 DE NOVEMBRO DE 2017)
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