ESCRITORA E POETISA MARIA ISABEL CUNHA COMENTA O AFORISMO/SÁTIRA /**JERIVÁS NO NADA**/


Mas que sátira tão contundente e mordaz! Neste poema, o sujeito poético dirige-se ao destinatário ideal, usando uma verbosidade carregada de sarcasmo, indignação e carrega bem fundo. A sua intenção é mesmo ferir, é chamar a atenção do seu destinatário para a sua revolta como escritor, como intelectual e como pessoa e, ofendido na sua dignidade, não perdoa e desfere-lhe toda o seu riquíssimo vocabulário como flechas em voo. Não queria ser o seu destinatário ideal, meu caríssimo poeta. Que os deuses apaziguem o seu espírito e nos compense com um poema de perdão e amor. Não é depravado nem doente, possui uma alma nobre e compassiva, eu o atesto como amiga, leitora e seguidora do seu percurso na vida e nas Letras. Um abraço.


Maria Isabel Cunha


#AFORISMO 368/JERIVÁS NO NADA#
GRAÇA FONTIS: PINTURA
Manoel Ferreira Neto: AFORISMO/SÁTIRA


Sou um homem depravado.
Sou homem-doente.


Desencarreirado da enfermidade!
A depravação buliu bem reentrante em você,
A viperinidade remexeu profundo no seu íntimo,
A caguinchice mexeu-lhe na ferida bem pomposa,
A pernosticidade escarafunchou as suas prefundas malignas,
Conceberam-lhe enrubescer de tanta pudicícia,
Receio das línguas-de-vaca
Satirizarem suas atitudes e portes,
Mangofarem de suas idéias e ideais,
Pensamentos e utopias, razões e puerícias,
Venosidades, inúteis do psicológico e índole.
Desceu tão fundo no abismo de suas esquisitices,
E orgulhoso de uma inteligência e capacidade incomuns,
Que realizar a liberdade de quem desce fundo,
Sobe o mais que puder,
Não estimaria sabê-lo, as línguas-de-trapo castigam com veemência.
Não declarei nentes,
Não se revelou,
Nem possuiu a bonomia de refutar,
Ordenar-me escarafunchar baba do boi no não-ser.
Se o confecionasse, declararia:
"Não percebo o que é baba de boi
Você caminha comigo onde consigo escarafunchá-los,
Exibi-me, recolho.
Concertado assim?"
Sou prepóstero, retrocedido
Em cogitando nisso que sou...
Em conjecturando nisso que de mim é...
Em presumindo nisso que é de mim...


Pervertido da moléstia!
A perversão mexeu bem fundo em você,
Fez-lhe corar de tanta vergonha,
Medo das línguas de trapo
Pasquinizarem suas condutas e posturas,
Viperinidades, trastices do psíquico e natureza,
Gibinizarem suas etiquetas e performances,
Quiçá colocarem no livro do Guiness...


Ah, sim...
Parece-lhe que estou a enviar-lhe um bilhete
Em duas linguagens diferentes,
Para o seu entendimento, estimo sabê-lo,
Estou a subestimar a sua inteligência e sensibilidade,
Para quem sabe escrever o verbo pode ser substantivado,
Não me esqueça a mim deste pormenor sui generis:
Intelectualidades olhando-se mutuamente,
Verbos incógnitos se re-velam com clareza e solércia
Não disse nada,
Não se expressou,
Nem teve a pachorra de contestar,
Mandar-me catar coquinhos no nada,
Ou jerivás, se o quiser,
Já que pode substantivar o verbo,
Concedo-lhe, con-sinto-lhe este obséquio
Da escolha do termo.
Se o fizesse, diria:
"Não sei o que é coquinho.
E jamais ouvi esta palavra "Jerivá",
Assim o coquinho é conhecido noutras culturas?
Você vai comigo onde posso catá-los,
Mostra-me, apanho.
Combinado assim?"


Sou in-vertido, re-vertido
Per-vertido
Em pensando nisso que sou,
Em cogitando nisso que de mim é
Caracteres de meu caráter e personalidade,
Pensei na sua per-versão,
A in-versão re-vertida da per-versão,
A re-versão per-vertida da inversão,
A per-versão re-vestida da re-versão in-vertida
Habitam-me os mais profundos interstícios de minh´alma
E não residem na psique de seus alucinados tesões,
De sua libido doentia de desejos carnais
Desculpe
Se confundi alhos com bagulhos,
Não separei o trigo do joio,
O pervertido sou eu,
Você é apenas a in-versão da perversidade,
Porquanto
Chamar-lhe pervertido é obtuso, oblíquo
Devo chamar-lhe de per da versão obtusa
Ou vertido de obtusa per
Da natureza humana
Com todas as suas lídimas neuroses, psicoses
Distorções da personalidade e caráter?...


Há uma questão primordial, podem considerá-la excêntrica:
Se lhe chamar de per da versão obtusa,
Os utopistas que trilham os seus caminhos,
Sentir-se-ão deverasmente subestimados,
E o bando de capachos que me seguem
Irão se sentir orgulhosos com o olhar de lince
Me foi inspirado para o conceituar, definir.
De nada lhe chamo...


Letras de minha índole e temperamento,
Meditei na sua libertinagem, libidinagem,
A anástrofe retrocedida da depravação,
A devolução transviada do hipérbato,
O envilecimento recapeado da ancestralidade prepóstera
Residem-me as mais penetrantes frinchas de Minh ‘alma
E não habitam na alma de suas enlouquecidas tesuras,
De sua libido doentia de desejos carnais
Indulgencie
Se misturei espertalhões com graúlhos,
Não desagreguei o bom do mal,
O transviado sou eu,
Você é unicamente a anástrofe da malignidade,
Pois
Evocar-lhe desencarreirado é tosco
Presto convocar-lhe de depravação bruta
Da essência humana
Com todas as suas vernáculas neuropatias, psicopatias
Deformações do temperamento e índole...


Ah...
O instante crucial desta facécia resultante de um equívoco:
Pensa então, e sapateará sobre um tapete persa,
Ser uma verdade incólume, e pode comprovar com todas as
verborréias cognoscivas, a dialética da iluminação doa, entrega à carne o verbo da atração, a carne se sente atraída pelo intelecto, vice-versa, e o intelecto doa à carne a reflexão... A carne reflete? Nem vou terminar a idéia, verdadeiro despautério.


Sou um homem depravado. Sou homem-doente.


(**RIO DE JANEIRO**, 06 DE OUTUBRO DE 2017)


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