CRÍTICA LITERÁRIA POETISA E ESCRITORA ANA Ana Júlia Machado COMENTA O AFORISMO 401 /**ABAIXO AS TESSITURAS DE LINHO**/


Abaixo as Tessituras de Linho… ora bem, tessituras de linho, termo utilizado por muitos para explicar as tramas da vida, ou seja, a composição, contextura, organismo, organização, de algo que se faça ou tenha intenção de fazer…ou demonstrar o quão oco é muito dos seres…já li textos de docentes em que utilizavam este termo, para explicar em que consiste a tarefa dos mesmos…como tal frase “Ligar os pontos, unir as linhas, enredar a teia, construir novas alternativas... Tecer e refletir... Assim é a construção da identidade docente” Na ficção instrutiva — empregar como um laboratório para a invenção de planetas assombrosos e horrendos — jamais foi tão bem espelhada nas Mídias populares. Hodiernamente, somos todos criativos, enredando seres segundo nossas aptas individuações. Nós cicatrizamos, plagiamos, delineamos nós atuamos, compomos a ação de se trajar como os personagens fingidos de ilustração animosa, debochas, películas ou séries televisivas, geralmente em festas ou convénios com esse intento e conferimos extraterrestres em ludos de tiro, com a calma de divindades cujas criaturas ainda não se amotinaram.
Como dizia um poeta, “um galo sozinho não tece uma manhã, carece sempre de outros galos que agarre esse berro e o lance a distintos..."
Somos o aranhiço enredando a sua teia, o urdidor trançando os fios no tear, a estilista na execução do croché, do tricô, do debruado. Todas essas rotinas nos endereçam à afabilidade, tolerância, afeição na execução de uma empreitada que, ao final, culmina com a estranheza, o sentimento de incumbência realizada e, em muitos factos, com o abarrotar das vistas e do coração. Por termo, a exultação de erudição que colaborámos para que a perfeição ou algo vantajoso fosse inventado.
Tramas para experimentar com as garras, o físico, para lobrigar com os olhos, para escutar e ler com os sentidos. União de talentos. Artes do verbo, artes da visualidade. Artes do tirocínio
Reconhecimento do ser é tecedura…tem trama, tessitura, contextura. A formação do ser tece-se com linhas dos verbos já verbalizados e não pronunciados. O seu urdido salpica-se de cores diferentes, de grandezas Os soslaios são muitos e o leilo, passageiro…


E como afirma o grande escritor Manoel Ferreira Neto , cada oposição, e obstáculo na vereda, um calhau valiosíssimo que se esculpe…
A ninharia que nos acarreta a constrição. Pois, o nentes é a perfaz refutação da plenitude do indivíduo. As tessituras de linho são a inacabada, contraditória, fragilidade do abismo à luminosidade do sobrenatural sem astros, sem satélite.


Não ambiciona chama para acender o cigarro: intenta o cigarro no esconso da boca findo, tal como o abaixo das tessituras do linho, que tanto andam pela boca do mundo. Muitas tão ocas de verdade e ser…
E agora apetece-me terminar com este poema de Fernando Pessoa que pendo que assenta que nem uma luva neste tema…


Gato que brincas na rua
Como se fosse na cama,
Invejo a sorte que é tua
Porque nem sorte se chama.


Bom servo das leis fatais
Que regem pedras e gentes,
Que tens instintos gerais
E sentes só o que sentes.


És feliz porque és assim,
Todo o nada que és é teu.
Eu vejo-me e estou sem mim,
Conheço-me e não sou eu.


Ana Júlia Machado


#AFORISMO 401/ABAIXO AS TESSITURAS DE LINHO**
GRAÇA FONTIS: PINTURA
Manoel Ferreira Neto: AFORISMO


Abaixo as Tessituras de Linho
Alinhando o in-finito perdido nas teias
No tempo que não temporaliza a liberdade
Da Maria-Fumaça que segue os trilhos
De lado e outro, abismos,
Que se contorce e pende nas curvas.
Abaixo as Tessituras de Linho
Que contextualizam os vazios do Ser,
Do Não-ser, da Náusea,
Trazendo de longe a morte do sonho,
As cinzas do eterno, do imortal, do perene


Mestria das conexões, sinais, verbos,
Execuções descobre-se na naturalidade,
Impulsividade da fictícia incorrecção do ser…
Procure o sentido da incorrecção do ser
À claridade da mestria que a escora e protege…
Conhecerei que a todo o instante habito,
Sofro, avisto,
Considero o instante que careço… que é divino, exemplar, Elementar…
Que me desloca, dispõe,
Impulsiona na rédea da autenticação
De quem sou e o que concebo aqui…
Que se conheça a assentar, resfolegar visceralmente…


Que se instrua a acalmar
E hospedar este regularizado intelecto…
Que se instrua a acreditar…
Que se instrua a estacar…
Que se aprenda a observar…
Que se instrua a enlaçar…
Que se instrua a aguardar…
Que se instrua a narrar…
Que se instrua a venerar…


Que se aprenda a admirar a pulcritude do trilho…
Com toda a mágoa, angústia,
Tristeza, temor e anelo de se avistar livre, ditoso…
São essas as energias que me impelem…
Tenho erudição para aceitar
A luminosidade deveras se conheço a escuridade…
Tenho vernáculo para con-sentir
Os brilhos resplandecentes das trevas,
Escuridade só é verídica na inexistência da claridade…
De nada antecipa pretender alumiar a escuridão
Com luzinhas de materialismo ideado
Com chamazinhas de achas respingadas de orvalho…


Sou episódios para a perspectiva, para o infindável desperdiçar-se.
Hoje, sou a anamnese olvidada, sou a idade que já partiu
Sou como os tracejados no pojo que as lágrimas já safaram
Sou como as iras que a imensidão já transportou.
Sou esse vazio que te atesta, sou a quimera da tua imaginação
E teu mutismo. Sou tua reflexão em fútil.


Abaixo as Tessitura de Linho!...
Quem vai contextualizar os fios
Que com-puseram o linho ?


Não quero rir de felicidade:
Quero a felicidade rindo de tanto
Sentir o prazer de ser feliz,
Emocionar com a alegria da felicidade,
Sensibilizar com a verdade quotidiana da busca
Com o sonho nas mãos.


Não quero debulhar as contas do terço,
Rogando a redenção e ressurreição:
Quero todos os pecados lucilando nos recônditos da alma.
Não quero alvorecer com os pássaros trinando no ipê amarelo:
Quero uma tempestade daquelas anunciando o novo dia.
Tenho muita coisa a fazer
Para ficar alinhavando as tessituras das angústias da felicidade,
Das tristezas melancólicas, nostálgicas, saudosas
Do amor que se foi esquecendo a si próprio nas marolas das ondas marítimas,
Não quero o despetalar de "bem me quer/mal me quer":
Quero a rosa no jardim, respingada de orvalho.
Não quero a poesia poetizando a poiésis do poema:
Quero simplesmente palavras sem semânticas e linguísticas.
Não quero cartas dizendo o meu destino:
Quero o destino jogando as cartas aos naipes do eterno.


De nada apressa imaginar eu sou ditoso, eu sou querença, eu sou pacificação, eu sou independente, surripiando a plangência penetrante que me ocupa, ou a mágoa que somente são o resultado instintivo do bem-querer que eu sou…
Como poderei identificar uma realidade pretendendo a todo o instante azular, surripiar, anular a distinta? Não tem sentido racional…
Preciso identificar a natureza elementar onde me abranjo e que se acha além de físico, intelecto, sensações, sensibilidades…
Poderei transitar os dias da minha existência focalizado em “aperfeiçoar” a minha notabilidade, paridade, corpo, sensações, sensibilidades, ligações, enclausurado à alucinação de que isso será a entrada de investida para a minha independência, sentido de quem sou… mas estaremos unicamente representando vagamente...
Careço ir mais além… compreender que eu não sou a minha índole, paridade, físico, comoções, sensibilidades, ligações… que isso somente é uma minúscula constituição daquilo que sou…


Obtusas pectivas de hereges ex-tases
Do espírito que ornamenta e arrebica
As cogitans res do pórtico cócito das sorrelfas do pleno
Com a incólume e insofismável vacuidade
Dos eternos pretéritos
Subjuntivando os gerúndios de declinações
Do in-fin-itivo no jogo lúdico das defecções florando as incongruências efeméricas do nada
Em cujos in-fin-itivos interstícios residem
A ab-solut-idade obtusa
De sentimentos e emoções da náusea vazia
De cânticos cancioneiros da magia misteriosa
Do perpétuo evangelizado e biblicizado
De nonsenses e vulgos do in-finito.


Lá no alto da colina passam ventos,
Caem orvalhos,
Sarapalham neblinas,
O catavento dos im-pretéritos gira
Às in-versas da verdade,
Em cujas bordas os solstícios do crepúsculo
Pre-figuram e con-figuram
De efígies o sacrário das ilusões
Da redenção e ressurreição.


Assim conseguirei admirar cada uma dessas matérias, especuláveis em mim e acarretá-las, orientá-las, sustê-las, enlaçá-las, querê-las, independente da iludida valia que lhes faculto comparativamente à dita que sou, aqui e hoje.


A execução será enriquecida de porte, naturalidade, autenticidade, encargo…
Cada impedimento, estorvo no trilho, um rebo precioso que se cinzela…
O nada que nos transporta a angústia. Pois, o nada é a completa contestação da totalidade do ente. As tessituras de linho são a in-completa, in-congruente, in-consistência do abismo à luz do celeste sem estrelas, sem lua. O nada se patenteia na angústia, mas não enquanto ente. O nada nos fiscaliza simultaneamente com a evasão do ente em sua plenitude. Na angústia se patenteia um recuar, esse recuar arrecada seu ímpeto inicial do nada. A nadificação não é nem uma aniquilação do ente, nem se ocasiona de uma desmentida. O inerente nada nadifica. É a prática do nada, não mental, mas emotiva, que concebe o sentimento de angústia - anuência da inerente finitude.
A anuência da inerente finitude é relevante para todos nós.
A vida se fosse perfeita era uma apatia total….e a perfeição é pura ilusão…ela não existe.
Apenas existe para quem não sabe o que é a vida. Abaixo as Tessituras de Linho.


Não pretendo lume para atear o cigarro: tenciono o cigarro no recanto da boca extinto.


(**RIO DE JANEIRO**, 20 DE NOVEMBRO DE 2017)


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