#INTERPRETAÇÃO, INSPIRAÇÃO, PLÁGIO, INTERTEXTUALIZAÇÃO# - MANOEL FERREIRA NETO: TEXTO


Cogita-se com frequência em todos os níveis culturais, intelectuais o que INTER-PRETA é a razão, ela fica ipsis litteris e verbis nas mãos da razão, eivada e seivada de prismas, ângulos, sob a égide desta ou daquela idéia filosófica, sociológica, teológica, literária, poética, sob a luz de específica e determinada intenção, ideais. Tudo isto são utensílios sine qua non para se atingir os objetivos. Contudo, sem as dimensões sensíveis, intuições, percepções, inspirações nada pode ser interpretado, entendido, compreendido com percuciência. As dimensões sensíveis precedem a razão numa interpretação, numa análise das ciências, das artes. O filósofo alemão ensina com maestria a deixar as coisas perambularem, deambularem no íntimo, livremente, deixá-las terem vida própria, literalizarem-se, o entendimento, a compreensão nascem espontaneamente.


Interpretar, analisar são mais complexos e herméticos que criar a obra, requerem conhecimentos profundos, nenhuma verbalização é capaz de atingir, alcançar o Verbo do Infinito, as ciências, as artes são infinitas, mas as dimensões sensíveis aproximam o Verbo do Objeto. Neste sentido, requerem leituras e mais leituras para a cada uma delas o mergulho ser mais profundo, e mesmo assim são leituras, são visões, são pontos de vista. Obras literárias, poéticas, filosóficas de escritores e filósofos do passado, gregos, latinos, e de todos os tempos são até hoje interpretadas, analisadas.


Há quem leia um texto, uma obra única vez, a primeira vez e pensa que compreendeu e entendeu a obra na sua essência, no seu núcleo, no seu eidos. Isso é possível, mas se quem lê a obra lê com a sensibilidade, com as dimensões sensíveis em uníssono, a sensibilidade mergulha profundo. Mas se a mesma obra for re-lida, outras dimensões serão reveladas, por vezes com certas ad-versidades, que podem ser trabalhadas, delineadas, buriladas. A cada leitura algo de novo se revela. Particularmente, já li A NÁUSEA, de Jean-Paul Sartre, cento e seis vezes, e se a reler hoje outras dimensões serão descobertas, isto porque a sensibilidade da leitura adentrou-se inda mais nos interstícios da obra. Os críticos/comentaristas de minha obra leem e releem para tecer as suas considerações analíticas, interpretações, e todos em uníssono dizem não ser nada fácil fazê-lo, tem de espremer os miolos, aguçar as dimensões sensíveis.


Outra dimensão é a INSPIRAÇÃO. Lendo uma obra de alguém, obra que me toca profundo, sentimentos, emoções, sensações aguçam-se, incentivam-me a criar uma obra em cima da obra lida, sem qualquer relação com o escrito, sem usar qualquer palavra, metáfora do autor, algo que se a-nunciou nos interstícios da alma, nos recônditos da alma; posso, contudo, conservar o eidos do texto, da obra lida, trans-cendendo-o, trans-elevando-o, tornar-lhe de autoria minha, embora no inter-dito estejam as idéias do autor.


O PLÁGIO é o mais arbitrário, gratuito, falta de ética, pois consiste em copiar as idéias, a linguagem, o estilo, até mesmo a forma do artífice da obra, sem qualquer mudança, transformação, o que é considerado crime autoral, sujeito a processo judicial. O plágio é o mais fácil, e há muitos que se utilizam dele para os seus próprios interesses, e na modernidade o que há de plágio não está escrito nas tábuas da Literatura e da Poesia. Agora, se um autor gosta de uma palavra, de uma expressão, de uma metáfora poética do outro não consiste em plágio senão em termos de o autor não lhe der outras dimensões, outras diretrizes, compor outras idéias e pensamentos ao que re-colheu e a-colheu do outro.
Neste sentido, tenho em mãos dois poemas da escritora e poetisa, crítica literária, Sonia Son, contendo neles o termo TESSITURA - mister esclarecer que palavra alguma, metáfora poética é particular, pertence à pessoa, ao escritor, ao poeta, privada ao autor, a palavra é de todos, e o autor faz dela o que deseja.


Por Todo Tempo


Contra tudo enquanto o vento acerra
Encontro no fim da picada a marca
No estreito aberto no marco da terra
Na trilha da madrugada tão parca


No grito calado que na garganta emperra
No passo lento que de tarântula caminha
Meu grande amor que no peito berra
Minh’alma alada pelo céu passarinha...


Na mordedura do beijo na tua orelha
No doce alcaçuz da língua tua
No mel que é puro desejo da abelha
No capuz dos olhos tecidos de lua


De corpo e alma minh’calma te ofereço
Pelo lado direito de o meu humano ser
No encontro do ventre pelo avesso
Pela força terrestre ao mundano prazer


Por todo tempo celeste e terreno
Pelo céu carregado de nuvens plúvias
Pelo manto que desnuda o amor obsceno
Meu sonoro cântico ás rosas rubras...


Na tessitura da tua voz sex que me canta
Toda ternura pelo tempo em fio de urdidura
Na cantiga dia após dia que me acalanta
Qual fio de cabelo ao vento em tecitura


Son Dos Poemas
*tessitura - Música Conjunto de sons que melhor convêm a uma voz ou instrumento: tessitura grave, aguda.
Figurado/organização contextura/enredo


Sonia Gonçalves


Poema bem antigo escrito por ela - nem era amigo da escritora ainda -, e o termo TESSITURA está presente... Poderia a escritora e poetisa dizer que me apossei de sua palavra, roubei-lhe, se eu nem conhecia nesse tempo, fi-lo nesta madrugada, porque ela colocou no meu bate-papo para a minha apreciação. Ademais, a símbolo, o signo, a metáfora dela é completamente adversa ao meu texto. A Tessitura da escritora Sonia Gonçalves diz mesmo a contextualização da voz interdita que existe na alma do poema, o espírito das idéias e ideais de revelar o que é isto - a Arte Poética que não pode renunciar a música dos sentimentos, das emoções, das sensações.


Noutro poema, também contendo o termo TESSITURA de sua autoria a-nuncia, pres-ent-ifica, revela outra dimensão desta contextualização, que é o sentido de TESSITURA, que aliás requer a tecitura dos versos e das estrofes.


Meu Amado face


Escrevo-te nesse poema mais singelo...
Nos meus sonhos de areia e castelo
Quando no infinito te amo bem além
O perfeito vejo nu e no beijo vejo também...


O amor mais puro e mais amado
Nos versos mais loucos transversais
Na sanidade do sentido tateado
No destino pelas vias paralelas e laterais


Escrevo-te nas estrofes incógnitas atemporais
No fazer amor unindo os versos e tudo mais
Meu jardineiro em sintonia infinita
No complô da sinfonia clássica mais bonita


Amado... Escrevo-te em papel timbrado
No favo com ciência e mel extraído
Verso amor que enlouquece a poesia
Que nenhum hospício meu sentir faria sentido


Sinto o sol me tocar á sombra
Ao meio dia á meia luz da penumbra
Sinto-te como segunda pele tecido
Ao toque de cada dia enrarecido


Na tessitura da vocálica intensa
Nas ranhuras que agarras a recompensa
No tom incolor do ar rareado
Perfumo aqui em ternura a ti amado.


Son Dos Poemas ##Sonia Gonçalves#
poesia da Son de 2013


Poema escrito em 2013, que também não conhecia eu. A tessitura desta obra, a sua contextualização versa sobre a "sinfonia clássica", a "sintonia infinita", o tecer destas duas dimensões musicais do amor. Como poderia eu apossar destas metáforas poéticas dela. A minha Tessitura como ela mesma já analisou, interpretou, Ana Júlia Machado também analisou e interpretou, eminentemente ad-versa do universo e horizonte poético da poetisa e escritora. Hoje qualquer uso de palavra, expressão, metáfora de outro usada por outro são considerados "Plágios", roubos de cena com interesses escusos, arbitrários, aquisição ilícita. As palavras não é de ninguém em especial, cada um faz dela o que bem entender.


E vem a outra dimensão, isto é a INTER-TEXTUALIZAÇÃO. A intertualização consiste em re-colher e a-colher de outro um excerto, seja um verso, seja uma estrofe, seja um parágrafo, trabalho conforme a subjetividade, a sensibilidade, intuição, percepção, mas enriquecendo, criando outras dimensões diferentes. Há autores que colocam o retirado do outro em aspas, mostrando não ser dele, outros o fazem livremente, mas de modo que qualquer leitor percebe, vê, enxerga ser de outro, mas com intenção de reforçar os ideais, idéias da estética, da poética. Particularmente eu, se intertextualizado, coloco entre aspas, dizendo que conservo a eidética do adquirido, mas lhe dou outras perspectivas. De minha parte, trata-se de consciência ética. Já intertextualizei tantos filósofos, poetas, escritores clássicos, modernos. Da escritora e poetisa Sonia Gonçalves intertextualizei algumas obras dela.


Mas a inconsciência, a falta de conhecimento a priori das dimensões da Arte hoje tornaram tudo PLÁGIO, Roubo de Cena. Antes de acusar alguém de plágio é preciso ler a obra com toda a percuciência possível e impossível para saber se é Plágio, se é Inspiração, se é Intertextualização.


O senso intelectual, cultural devem estar sempre presente para evitar tais acusações, censuras.


Com esta escritura, espero ter elucidado um pouco as questões.


(**RIO DE JANEIRO**, 21 DE JANEIRO DE 2017)


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