NA ARAPUCA DE MORFEU OS PESADELOS DE SÍSIFO GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: AFORISMO @@@@


Sempre um sepulcro sutil

Ddebaixo do edredom e cobertor,

Altas horas da madrugada,

Minutos antes do canto do galo,

Na arapuca de Morfeu os pesadelos de Sísifo, Assim ou assado,

Churrascado ou cozido,

Em si mesmo petrificado

– Narciso en-si-{mesmado}

Com a sua linda face refletida na água.

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Vomito finalmente o mito repelente,

O mito indecente e indecoroso,

O mito refutável e descartável

O mito inconveniente e indesejável:

Ad-mito ser gente,

Não aceito ser raça humana em ruinância,

Con-sinto em ser humano,

Estar à mercê do tempo,

Estar sujeito a trans-formações,

Estar sujeito a ser o outro de mim,

Envolvido em todos

Os princípios e verdades do final.

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Três horas da madrugada: reclamam as asas da alma espaço para voar além do corpo e do catre, além do bairro e da praça, além do chapadão e dos córregos, além da ilha e do bosque, quer a alma excitada voar além da cidade, além das florestas, apesar dos morangos e pêssegos deliciosos e apetitosos, que tanto aprecio, a boca até saliva só de pensar nestes frutos, além dos mares que se perdem no infinito, confundem-se com as nuvens brancas e azuis, abacates, abacaxis, mangas, maracujás da ilha, deixam olhos extasiados e voluptuosos de prazer com a beleza e magia do uni-verso, universo que des-lumbra o barroco de sua apoteose, que a-lumbra o expressionismo dos sofrimentos e dores da alma, suas tragédias homéricas e ulisseanas, que con-templa as novas e inéditas visões, sensibilidade, percepção, intuição de outros princípios e preâmbulos de sonhos e utopias, Assim Palmilha a Humanidade o Campo de Lírios... Pois que voe a desalmada, voe mais que águia, deixando o corpo em soluços, dissolvido sonrisal, alka-seltzer num copo de solidão.

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Sempre uma dose de angústia sobre o acrílico do medo no barzinho da periferia onde, amargo, me exilo, penso e sinto o que me convém, o que me apraz no corcovado do tempo, o que está de acordo com a minha alma e ser, as saudades indescritíveis e indizíveis se me anunciam todas, sou todo saudades, sinto-me sendo o outro de mim, e mando o resto para a “tonga-da-mironga-do-cabuletê”, ou ainda naquela dança de passos contrários, cantar aquilo de "Se a liga me ligasse, eu também ligava a liga, mas como a liga não me liga, eu também não ligo a liga" ou pentear macaco no pálido crepúsculo das montanhas... catar jerivás no planeta Marte.

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Apesar de tudo, quanto mais latir com aquela coragem da ferocidade e perigo letal, mais assustarei, deixarei os ouvidos sensíveis, até paranóicos, a alma em alvoroço com todas as dores e sofrimentos. Apesar de tudo, quanto mais discriminado e perseguido mais o que latir irá ser inscrito nas laias e estirpes da história das hipocrisias e falsidades da raça humana, isto é o que mais me apraz, saltito de contentamento. Apesar de tudo, quanto mais perdido mais encontrarei as veredas por onde trilhar os passos em direção aos infinitos da eternidade e imortalidade. Apesar de tudo, quanto mais traído mais resplandeço, mais a minha estrela brilha no espaço sideral – sensível e espiritualmente envio beijos à amiga muito querida, quem num cartãozinho dissera-me da minha estrela que brilha, silenciamos-nos por defecções ad-nominais e ad-jacentes, na memória inúmeras lições, a estrela brilha mais com o silêncio. Apesar de tudo, quanto mais responsável e compromissado com os ideais de liberdade e sinceridade mais me sentirei disposto a seguir a jornada que a mim foi vocacionada desde toda a eternidade. Apesar de tudo, quanto mais unido às buscas mais menos serei. Minha memória eriça a fúria das ondas e nas profundezas do coração, lá nas suas pré-fundas, uma velha bandeira de pirata baloiça serenamente.

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O céu, forrado de estrelas, é um olho arregalado na penumbra do alpendre onde sombras se apalpam. Onde sombras se fazem de carne, cheiro de vida, de carne sendo mordida, de "carne-luz encarnada". A lua, em quarto - minguante, é um seio de soslaio que uma língua procura.

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Sigo a jornada dos obedientes, sabendo que no meio do mundo há quem empurre a pedra com dinamite nos olhos. Montado num jegue, saudando sertão a fora com os braços desenhados no ar. No canto, peças do "cangaço que se paira", e paira o sertão nas sombras ócias da noite, nos vultos preguiçosos da madrugada, no tédio do alvorecer de neblina densa. Cangaceiro é lua cheia no sertão, e vem a noite, vem a brisa, silêncio inominável; no sono, a recordação. Na verdade, na verdade, a lua não se interessa pela conversa baixa, cochicho, sussurro dos gatos, dos ratos e dos homens – uma fraude fatal a favor de fulano de tal e cicrano bis. As paredes de cores e cores e cores, imagens subjetivadas, estão imitando o poeta dos versos livres/oprimidos, no sentido da Katharsis, o escritor de prosa re-versa/inversa, o homem de silêncio/latido; estão imitando o filósofo das revelações e averiguações do porquê da vida obscura, misteriosa e seus desencontros; estão imitando o apenas e o tudo/nada sem igual, o sem raiz de um touco morto pelo progresso, pela indiferença, pela Modernidade que enfim assumiu haver morrido, caiu vez por todas no chão duro e trincado pelos raios do sol, seu esquife está sendo levado para o sepulcro no pálido crepúsculo da primavera, em verdade final dela.

RIO DE JANEIRO(RJ), 13  DE ABRIL DE 2021, 20:55 a.m.

 

 


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