#AFORISMO 133/FILOSOFIA DO SIBILO NOS INTERSTÍCIOS DA ALMA# - GRAÇA FONTIS: PINTURA/Manoel Ferreira Neto: AFORISMO


No vazio, um corpo estranho. Dilata, quando o sol está amareliçado e brilhando, deixando pingar no chão as gotículas do amarelo, de sua tinta. Comprime, quando é sombra violácea ou chanfrada. Nos olhos envidraçados, envoltos no tênue e irreversível nada, envelados no duro e espesso fio do tempo extinto, a dor viva, "estribuchante", tremulante, exposta, espontânea e livre. A dor nos olhos. O vazio vai furando feridas, como um punhal. Mexe e remexe. A dor em todos os sítios, em sítio algum. O translúcido de ponta a ponta. A claridade até ao fim.

Alvorece
Infinitas emoções perpassam-me o íntimo
Pássaros gorjeiam, saúdam o tempo de novos sonhos
Uni-vers-itudes re-nascem de primevas utopias do ser
Plen-itudes nascem lívidas de vernáculos de antigos desejos
Con-templo fora de minha porta no longínquo eterno do horizonte
Esperanças enovelando estesias de velhas idéias, pensamentos
As etern-idades são flores amarelas de ipês que tapeteiam as calçadas
Brilharei de luz, trilhando as estradas,
E, atingindo o projeto do além,
De onde con-templarei as gaivotas à beira mar,
As águias alçando vôos no infinito,
Os lobos uivando no ápice da colina, orvalho da noite
Ouvirei o canto da coruja nalguma galha de árvore
Quem sabe me diga em silêncio:
"Andar andei... Andei muito
Mas eis-me aqui
Sou o além que as estesias de sonhos, de verbos
Me fizeram, re-versaram, in-versaram
Sou o além que as linguísticas de cor-agens, de utopias
Elencaram, re-colheram e a-colheram nos interstícios de projetos
Sou o além-aquém que as semânticas de entregas ministraram
As lições do empenho e empreendimento, perspicácias"
Sou o aquém-além:
Verbos de etern-idades flutuam aos meus olhos
Verbos de etern-itudes pervagam-me o íntimo
Verbos de uni-vers-itudes são sementes de outros passos
Verbos de in-fin-itudes são húmus que alimentam o verbo de amar,
Verbos de nad-itudes são águas que saciam os desejos do sublime.

Estou suspenso no tênue fio do tempo. Meus olhos tergiversam-se. Sou-me inerente. Fixo as vistas num monte de papéis rasgados e amassados. Uma lágrima insiste em deslizar-se em meu rosto, mas nada permite este ato. Meu corpo jaz em cima desta ponte. Está inerte. Fixo-me no dedo mínimo. A princípio, consigo delinear a sua forma, o seu comprimento. Tudo escapa. Um mosquito voa, emitindo um som angustiante. Pudesse, iria acabar com sua vida, cortar-lhe em pedacinhos ínfimos. O máximo: suportar este barulhinho infernal.

Alvorece
Luzes, palavras, sons
Versejando no silêncio dos sentimentos
Volúpias, êxtases, sorrelfas
Etern-itudes de etern-idades velam as carências do ser,
Sussurrando estrofes que sibilam nos interstícios da alma
Etern-idades de etern-itudes des-velam a felicidade do verbo
De ser, murmurando esperanças, outras esperanças do uni-verso
Vedas: "Let it be".

Oh tu,
Quê in-finitivo de vozes
e náuseas,
Irás suspender as chamas
da vela,
em sete braços do castiçal...
Uma presença de nebulosas brumas. Um frio envolvente e espesso, transformando tudo, infiltrando-se no gosto agridoce e pastoso, iluminando uma presença que aparece ausente, nas suas circunstâncias de medo e pavor.

Poiésis da aurora
Festejando, dança de querubins, o espírito de outros verbos
Que nascem lívidos de olvidados sonhos
Tempo de compor o vernáculo da alma
Enamorada da vida de outros horizontes, universos.

Demônios cinzentos, adocicados. Um inferno frio, estupidamente gélido, vai até os ossos. Os antes foram excluídos e, no íntimo, uma presença forte, compacta, decisiva. Na absolutez e totalidade, uma sensação livre. A existência é absoluta. No prosseguimento, a luta constante dos absolutos. A morte é absoluta. O tempo a matar cada absoluto. O absoluto maior, aproximando-se.
Tudo em mim pesa. Nem mesmo um guindaste seria capaz de levantar-me a cinco centímetros do chão.
Caminho. Olho para trás a todo instante.


(**RIO DE JANEIRO**, 30 DE AGOSTO DE 2017)

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