#AFORISMO 111/CANÇÃO DISTANTE VELANDO O TEMPO# - GRAÇA FONTIS: ESCULTURA/Manoel Ferreira Neto:


À Eliete Araujo Duarte e Antônio Nilzo Duarte com todo apreço e amizade.


Há um asilo para escritores indigentes e um hospital para maus poetas.


Há uma canção distante velando o tempo, tempo de solidão desértica da verdade, tempo de silêncio secular das utopias, tempo de ideais efêmeros, tempo de sentimentos e emoções do há-de ser.


Há uma noite que custa a passar, inda o alvorecer distante, mas está por se realizar, micos se divertindo no fio de alta tensão, pássaros cantando... pensamentos, idéias a-nunciam-se, esvaecem-se de imediato.


Há uma prosa silenciosa re-versando, in-versando palavras às sara-palhas dos ventos de leste, palavras desérticas de signos, símbolos, metáforas, a língua toca os lábios à busca de sabor de prefixos, sufixos, temas e radicais, a alma circunspecta, introspectiva vagueia por florestas, mares, bosques.


Há ipseidades, facticidades circunvagando idílios, sorrelfas, quimeras; há forclusions, manque-d´êtres circundando medos, inseguranças, náuseas.


Há um canto de melancolia, salmo de nostalgia artificiando pós regenciais de sonhos que preencham os lapsos de memórias, lembranças, recordações; inda me não fora dada força suficiente para o último ímpeto e audácia da cigarra, até à garganta me sobem o pulsar de meu coração quando a ouço cantar... Cítara de verbos milenares... cítara de sons primevos...


Há íntima nascente do espírito, ó famosos sábios, um bálsamo para as impetuosidades dos ventos que sopram nos auspícios da colina onde os lobos uivam na lua cheia.


Há uma vela correndo no mar a sabedoria selvagem que desperta todos os cantos dos que amam, falam a própria linguagem do amor enamorado pela liberdade de ser.


Há clérigos sentados nos degraus da igreja, após a missa matutina, contemplando os canteiros do jardim público, o bem e o mal são apenas sombras inter-postas e áqueas tribulações e nuvens passageiras.


Há fomes seculares, sedes milenares apocalipseando a consumação dos tempos, enfiando a cabeça na areia das coisas celestes.


Há boêmios e vagabundos passeando na praça central, ouvindo músicas nostálgicas, a fonte luminosa ligada, casais sentados nos bancos arrastando todas as coisas vindouras para o instante-limite de suas fantasias do eterno amor.


Há um ad-vérbio entre vírgulas perscrutando o espírito das gravidades temporais, às suas costas há uma eternidade.


Há um verso mudo nas longas ruas que levam para a frente as gélidas névoas.


(**RIO DE JANEIRO**, 21 DE AGOSTO DE 2017)


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