O HOMEM NU GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: POEMA @@@@



Aquando a noite cobrira a cidade

De Atenas Atéia,

Um jovem acendera uma vela,

Estava sem energia elétrica,

Descendo do largo de São Judas Tadeu

Até o Largo da Quitanda,

Pela avenida São Lucas,

Não havendo viv´alma em sua trajetória

Precisava fechar as portas

Da Matriz de São Paulo,

Era ele o responsável por essa

Tarefa durante os dias úteis da semana.

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Ajoelhado, mãos postas

Havendo um terço nelas,

Vira um homem nu

Que chorava e debulhava as contas,

Seu cabelo era da cor de cinza,

Seu corpo era branco

Como se jamais houvera estado

Exposto aos raios de sol.

Havia uma ferida no ombro direito.

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Dissera o rapaz ao homem nu:

“Não entendo a razão de estar

Nu, ajoelhado nesta escadaria,

Rezando com tanta devoção.”

Ao que o homem nu respondera:

“Por ninguém choro.

Choro por mim mesmo.

Não sabeis vós, meu jovem:

Por longos anos,

Servi vinho ao pároco

Antes da comunhão,

Dei o braço aos velhinhos

Que mal podiam andar

De volta, após a comunhão,

Até ao banco onde estavam sentados,

Alimentei os mendigos aqui mesmo

Nesta escadaria, com as sobras

Do jantar dos padres na Casa Paroquial,

Cuidei de varrer e passar pano

Molhado no chão de toda essa igreja,

Encerar no sábado pela manhã,

Tirar a poeira das efígies dos santos

Tudo que estivera ao alcance

De minhas mãos eu fiz...”

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O rapaz ouvia tudo o que o homem nu

Dizia, segurando a lamparina

Na mão direita.

Aquando silenciara, perguntou-lhe:

“Mas o que acontecera

Para não mais estar servindo à igreja,

Estar nu, rezando euforicamente.

Nunca ouvi qualquer comentário

Sobre o senhor.

Algo de muito sério deve ter havido”

O homem nu ficara de pé,

Passara a mão no rosto, tirando as lágrimas:

“Fora numa missa celebrada pelo bispo.

Após a celebração,

Os fiéis beijavam-lhe a mão.

Não era algo espontâneo por parte deles.

Dizia o bispo que beijar-lhe a mão

Era o mesmo que beijar a de Deus.

Era ele vaidoso, orgulhoso.

Os beijos alevantavam-lhe o ego,

Sentia-se superior.

Neguei-me a fazê-lo naquele dia,

Retirando-me do altar.

Fui expulso de imediato,

Sem quaisquer direitos”

O jovem introspectivo com a descrição,

O bispo já havia morrido,

O comentário de suas vaidades e orgulhos era público,

Indagou:

“Mas por que a nudez? Onde o senhor mora?,

Respondendo-lhe:

“Jovem, não tenho uma peça de roupa sequer.

Estais vendo aquela cruz no alto da montanha?

Embaixo ao rés do chão, há uma gruta,

É lá que eu moro”

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Terminando a fala,

Descera a escadaria,

Indo embora, passando pelo Largo da Quitanda,

Frente ao barzinho Baiúca.

O rapaz subiu a escada,

Entrou na igreja,

Fechando as portas.

A sua fisionomia mostrava

O quanto estava horrorizado

Com a história do homem nu.

A energia elétrica voltara,

Apagou a lamparina,

Foi embora.

RIO DE JANEIRO(RJ), 01 DE FEVEREIRO DE 2021, 05:53 a.m.  

 

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