#AFORISMO 1010/ SONEMAS NO BOSQUE DE SILÊNCIOS E NOTAS DE SOLIDÃO# - Manoel Ferreira Neto: DESENHO/AFORISMO/GRAÇA FONTIS: PINTURA



Idéia louca de ser lua cheia.
Ou crescente.
Ou não ser lua.
Ser estrela cadente.
Ou não ser nada.
Apenas uma coisa de alguém. Um objeto. Que esquece em casa. Deixa na gaveta. Junto com as camisas, cuecas, meias cheirosas. Sem serem dadas ou tomadas. Basta que de vez em quando abra a gaveta. Olhem-me.


Súbito, a frieza da solidão nos ossos. Na posse do apelo mudo, do prazer efêmero, do êxtase volúpia, cego, procurando a luz do paraíso. Na negligência da morte. Plana, rica. Imunda. De modo que o próprio des-equilíbrio teria esquecimento daí. Ocorre-me que recuperaria o rosto e a expressão de inocente hipocrisia, ingênua aparência. Se o impalpável brilho da areia esguinchasse o sono. Se o eco dos meus passos esplendesse pela orla marítima até à fonte das águas do mar.


Ansioso. Lamento. Clamor. A alternância egoísta reluz aos olhos estremunhados do peito. E ronda, no fim da noite, a estranha mão de fogo. Sonoridade de asas de pano. Entranhas chacoalham o vazio.


Meto outro cigarro na boca.
Palavras borbulham quentes.
Debatem-se sobre tábuas ásperas.
O móvel oscila um pouco.
Enérgica distância do que há-de ser
Apagado em silêncios. Inútil, a incompreensão excitada.
Ilusões imergem.


Desvario passageiro, entre as mãos, reduzido ao destino que precede mal ao pescoço que o puxa sempre mais para baixo. Esgares sem palavras. Suspiros sem pensamentos ou idéias. Recorrem com um zelo arrebatado a carniça dialética e a vontade dos carrascos.


O eco significa bastante. Indica que a humanidade se renega e os homens não podem sair nem atingir os limites. O sussurro fornica todos os dons para cacarejar liberdades.
Olho um papel amassado no chão, as letras e palavras borradas. Estou bem só. Virado para o futuro. Não dou por mim que enxugo mal os sonos no ouvido. Enxergo mal ao longe. Miopia. Às portas das tabacarias, não sou nada, não quero ser nada. Atiro navalhas aos fingimentos. Se me sentisse apenas feliz até ao absurdo e aos viscosos. Dúvidas. A descrença cobrir-me-ia de vergonha.


O excesso do louco reside no meu prazer. Mãos ecoam no movimento de dedos. Traço linhas gerais. Facas cortam o osso temporal. Espalham cinzas ao comprido de ausências. Impregnado entendimento de sonhos esgotados.


Irrisórias in-verdades de instantes-limites do verbo de tempos pretéritos - angústias, tristezas, acompanhadas de insônia, medos, inseguranças do porvir. O que era sonho tornou-se pesadelo, originando desespero, era outro e nem imaginava, quaisquer noções. Ad-verso aos preceitos, dogmas, princípios. Andar solitário por entre os homens, sem os lenços, documentos quotidianos, triviais de con-sentimento das idéias, pensamentos, valores e virtudes mundanos, à busca de quê, desejando o quê, esperança de quê, sei lá não.


Feto, aeiou. Feto, aeiou. Feto. Féretro. Falta-me afeto. Falta-me re-descobri-lo. Des-centralizá-lo. Distribuí-lo. Entregá-lo.
Estou um feto. Molhado por dentro e por fora. De dentro para fora. Esse branco.
Esse sol.
Esse reflexo.
Esse eu. Esse não-eu.
Misturo. Tudo. Faço nada. Sensação. Portão. Plutão. Platão.
Este muro já devia ter caído. O céu já caiu no chão. Todos caem. Deve ser ruim cair e não rolar no declive até o caminho estreito entre as águas e a serra. Esse entre nós. Entre eu e eu.


A noite cerra as pálpebras com um olhar morto. A interminável madrugada instaura-se – reconheço a sedução do pecado, do jogo indecente. Só e nu. Por dentro, o cancro da indiferença a comer-me. Sentar-me à beira da vida é o suicídio mais covarde, por manter a aparência de desejar existir, ser sensível.


Só... O manto verde e amarelo vem e corta-me pelo limite do grito. O sobretudo branco e azul some e resgata-me pelo absurdo da audição. Arde-me no corpo a angústia do exílio, queima-me. A namorada já vai caindo fora. Quando não se tem nada, nada se tem a perder. No sangue, a vertigem. Ser inteiro na consciência. Igual a mim e tão abandonado. A serpente da tarde ergue-se, insanamente, do fosso.


Ah, se pudesse ser, nas mãos, só o símbolo do amor e da harmonia. O vento ermo no bosque traz a inteligência no bolso.


(#RIODEJANEIRO#, 17 DE AGOSTO DE 2018)


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