ENTRE-VISTA COM JOÃO ALVES DA FONSECA FILHO, “JOÃO COMUNITÁRIO” - Manoel Ferreira


J. A. F. F. – Razão In-versa completa mais um ano. Como você avalia sua trajetória?

M. F. – Em verdade, secretário, sinto-me feliz e satisfeito com a trajetória de Razão In-versa. Não há outra perspectiva de avaliação senão a partir da aceitação e reconhecimento dos leitores. Digo-lhe sinceramente não haver pensado que este suplemento-caderno literário-filosófico fosse tão aceite e reconhecido. Isto porque, em primeva instância, ser inédito na história da cultura e das artes curvelanas. Curvelo não estava preparado para receber este impacto, muito pouco nosso povo dá valor à cultura, às artes, muito pouco os curvelanos lêem, hesitam bastante em assimilar o novo, apesar de já haver sofrido mudanças nos últimos tempos. Em segunda instância, a minha obra é de cunho filosófico, linguagem e estilo profundos, não há esta dimensão filosófica em nossas obras, escritores que assim escrevem. Lê-se obra filosófica com a sensibilidade ou com a razão. Conhecimentos filosóficos poucos têm, e não são profundos. Para ler a minha obra é preciso ter alguns conhecimentos a priori? Sim. Mas não é o preponderante. Por nas linhas mesmas da obra a poética se fazer presente, sou poeta na prosa; a leitura é com a sensibilidade, espírito, sentimentos e emoções, intuição, percepção, sonhos da alma e utopias do espírito. É uma leitura sensível, a razão se sensibiliza e assimila os versos da filosofia. Paulo César dissera-me certa vez não fosse a dimensão poética de minha obra não seria lido por ninguém.
A aceitação tão grande dos leitores se fez com a linguagem e estilo poéticos, a sensibilidade que nas linhas se revela, a busca da vida verdadeira, a busca da verdade de nossa vida. Os leitores se sensibilizam com a leitura, passam a re-fletir e meditar sobre a vida, a desejarem outros horizontes e universos, outros sonhos realizarem.
O título Razão In-versa, bastante sugestivo, como dissera Dr. Antônio Fernandes Drumond: “Adoro este título de seu suplemento, Manoel. Você estava mesmo muito inspirado para criá-lo. Não há outro igual”. O título é a alma da obra, e eu para intitular sou muito bom, modéstia às favas. Exerceu influência, chamou a atenção, despertou as curiosidades em conhecer a obra. Título só não responde por nada; era preciso profundidade, era preciso originalidade, era preciso mensagem de vida e de espiritualidade que essencializassem o título, tornasse o suplemento sui generis. Digo mesmo: Razão In-versa me superou, transcendeu-me, por isto tantas dificuldades na sua produção, não só sofro e rebolo, peno mesmo; tenho de ombrear, andar ombro a ombro com “ele”, mas a luta é mágica, cresço e amadureço espiritualmente, revela-me a oportunidade de saber o eu do sou que me habita, o sou do eu que me inspira e me lança em busca do verdadeiro verso de mim. Isto a cada edição vou trabalhando e aprofundando.
João, não me esqueço de um comentário seu, aquando no primeiro aniversário de Razão In-versa, no salão nobre da Casa de Cultura: “Não é grande número num evento cultural que faz o valor dele. Nos seus eventos literários de lançamento, são poucas as pessoas, mas são sensíveis, cultas, artistas, intelectuais, seus amigos verdadeiros, reconhecem seus valores e virtudes”. Não há muitos leitores de minha obra, mas os que são realmente pessoas sensíveis, cultas, intelectuais, é a elite cultural, profissional que me lê, e pessoas que têm sede de conhecimento, de transformações sensíveis e espirituais.
Desde quando ainda escrevia nos jornais, jamais pensei ou desejei conquistar leitores de todas as classes, seria impossível devido à minha linguagem e estilo; encontrei no final de julho de 2008 num botequim copo sujo, a página de Razão In-versa na privada, pode imaginar o lugar, tendo sido uma das razões por haver Razão In-versa haver se tornado independente. Infelizmente, não nas cidades do interior, não em nossa Curvelo, no mundo inteiro, a Literatura é para poucos, a literatura-filosófica para menos dos poucos. Razão In-versa conquistou, é objeto de admiração, amor, carinho, consideração, reconhecimento da elite cultural, mas uma elite sensível, espiritual, uma elite que verdadeiramente traz em si, nos interstícios da alma e espírito, para além da vida e da morte, desejos e vontades de encontro com o espírito da vida.
Os meus leitores, você, João, é um deles, têm todas as edições, nalgum momento de folga e lazer lêem algumas linhas. Não esperava eu isto. Dr. Antônio Fernandes Drumond, César Frutuoso deixam suas edições no escritórios para a leitura dos seus clientes, dizem eles ser o modo deles de me divulgarem. Quem de meus leitores têm todos os livros publicados de outro curvelano? São edições mensais, não são publicadas eventualmente, com espaço de tempo de anos. Eu mesmo lhe doei, com muito carinho as obras memorialísticas todas de Nilzo Duarte, com o objetivo de divulgar as obras de meu grande amigo, fiz o mesmo com outros leitores.
A trajetória de Razão In-versa nestes dois anos para mim é mágica, mostra que estou nas letras construindo um novo tempo, um tempo que busca o verso da vida verdadeira, e tudo isto com o carinho e reconhecimento de meus leitores.

J. A. F. F. – Razão In-versa tem atingido seus objetivos?

M. F. -  Meu objetivo principal de publicação de minha obra, através de livros, três, de jornais, sempre fora não apenas divulgação de minha carreira de escritor, mas contribuir com a cultura e artes curvelanas, com as buscas e sonhos das pessoas de valores outros que não estes que estamos vivendo neste mundo virado de cabeça para baixo, não há mais qualquer valorização dos princípios morais, éticos, religiosos, impera nele corrupções em todos os níveis, violência ilimitada, falta de questionamento, poder, valores materiais, a vida simplesmente perdeu o seu sentido, os homens estão se arrastando no mundo e na vida. Você sabe o momento crítico que a cultura curvelana está vivendo, imperam vaidades, orgulhos, hipocrisias, fama, sucesso, colunas sociais, até plágio há em Curvelo, ninguém está de verdade interessado em lutar por transformações, por engrandecimento de nossa Curvelo culturalmente, pela realidade vivencial e vivenciária de nosso povo. Tudo isto encontra campo para crescer porque ninguém olha para a cultura e as artes como o que salva a vida humana de todos os seus despautérios, e vai continuar assim até que o povo exija seriedade, respeito à cultura, aos princípios éticos e morais.
Razão In-versa traz em si mesmo este objetivo: se nos livros, nos jornais estava latente, nele há a radicalização, carrega nas costas a responsabilidade e compromisso de luta real contra todos os despautérios, hipocrisias de nosso tempo. Razão In-versa não deixa pedra sobre pedra. A hipocrisia da Academia Curvelana de Letras, com seus membros que nada escrevem, hoje não é mais vista com bons olhos, isto porque rasguei os verbos, mostrei aos curvelanos a farsa que nela impera.
Razão In-versa atinge seu objetivo, quando ouço leitor, Dr. Antônio Carlos da Silva, dizer que com a obra ele está aprendendo muito; quando Dr. Antônio Fernandes Drumond pede para eu escrever mensagens espirituais aos homens que estão sofrendo, perdidos, angustiados, desesperançados; quando Geraldo César Frutuoso Guimarães diz que depois de mim a literatura curvelana jamais será a mesma de outros tempos; quando Antônio Nilzo Duarte diz sou um homem sério com a vida, com os objetivos que procuro realizar a critério, para citar algumas falas, já que há outra pergunta neste sentido. Razão In-versa atinge seus objetivos, quando por intermédio de meus leitores a obra é recomendada a outros, e eles adquirem edições, como recentemente é o caso de Dr. Éder Martins Sobrinho, Dr. Gerado Sebastião. Razão In-versa atinge seu objetivo, quando realmente é lido, degustado, interesse em saber o que professa em suas linhas e entrelinhas.
Verdade, em dois anos de circulação Razão In-versa tem alcançado coisas que eu mesmo não imaginava fosse. Dois anos é muito pouco para haver aceitação, ainda mais por ser algo inédito em nossa cultura literária e filosófica. Sinto-me, em verdade, admirado com o reconhecimento que adquiriu neste espaço de tempo. Isto porque ele tem profundidade, responsabilidade, compromisso. Além de ele haver nascido imortal, por ser inédito, nasceu grande, nasceu com objetivos a serem realizados a critério e rigor. Superou-me. Sinto-me pequeno diante dele, e tenho de andar ombro a ombro com ele.
Não serei hipócrita comigo, com ninguém. Sempre sonhei com a imortalidade, sempre quis deixar os meus passos e traços no mundo, não morrer e ser esquecido, sou homem carente em demasia. Não fosse ser escritor não sei o que seria a minha vida. Atingi este objetivo com Razão In-versa: os leitores todos em uníssono dizem que sou imortal na cultura curvelana – quer maior felicidade que esta de estar presenciando em vida a minha imortalidade? Não conheço outra. E por isto a responsabilidade é ainda maior, tenho de produzir obras profundas, que realmente professe buscas espirituais.

J. A. F. F. – Os leitores têm feito qual tipo de comentários?

M. F. - Um dos comentários mais presentes é o fato de escrever tanto. Ainda não contei quantos textos de minha autoria já foram publicados, mais de quinhentos foram, críticas, poemas, crônicas, romance, contos, sátiras, ensaios filosóficos, tese, dissertação, monografia, o texto de minha única peça teatral. Isso é incomum. Então, a inspiração é ainda mais comentada. Os leitores querem mesmo saber como se dá em mim este fenômeno da escrita, escrever tanto, e só obras profundas. Há uma pergunta que se repete nestas entrevistas que concedo a vocês leitores, justamente sobre a inspiração. A busca da perfeição é a grande responsável por eu escrever tanto, nunca estou satisfeito com este ou aquele escrito, penso poderia haver sido melhor, poderia haver trabalhado mais a linguagem, o estilo, poderia haver mergulhado em mim, revelado-me mais, manifestado o meu íntimo, idéias, pensamento. Aí não tem jeito: tenho de escrever, escrever, escrever, não passo um dia sem escrever, se acontece, às vezes, fico completamente perdido e desnorteado. Já ouvi de leitor não haver condição de dizer que um texto meu é inferior a outro, cada um é cada um, e todos têm valores inestimáveis. A única vez que ouvi dizer que um texto meu foi uma porcaria foi justamente de meu compadre Paulo César, o texto foi Desde o intróito, texto encomendado, escrito para um discurso no Clube dos Diretores Lojistas por ocasião da saída de Nilton da Costa Quadros, irmão do vereador José Rafael. Paulo César me chamou a atenção mesmo, não publicasse mais textos nestes níveis, negligenciaria a minha imagem, tinha de respeitar-me; se não tivesse textos bons para publicação, ficasse sem publicar. Este texto foi publicado no jornal E agora? Aqui em Razão In-versa, não. Não tenho coragem mais. Desde então, me tornei ainda mais exigente com isto de publicar. Há inúmeros textos que não serão publicados nem nestas páginas, nem em livros, por pensar não têm qualquer valor. Minhas agendas estão cheias de textos que não serão publicados.
Quando ouço todos os leitores dizerem de minha literatura, de minha carreira, dos valores de Razão In-versa, como dissera Dr. Antônio Fernandes Drumond, quando lhe comuniquei haver realizado o seu pedido de escrever mensagens espirituais: “Tudo o que você faz, Manoel, é perfeito!”, quando me elogiam pela sensibilidade, pela inteligência, pela minha autenticidade, originalidade de linguagem e estilo, pelo meu compromisso e responsabilidade com a cultura, por  ser escritor nato, pela minha facilidade de escrever, pela produção de trinta e uma edições em dois anos de existência de Razão In-versa, só tenho de agradecer-lhes pelo carinho, reconhecimento, só tenho de agradecer a Deus pelos dons que me doara gratuitamente, pela missão que me incumbiu de realizar no mundo, à minha querida Marize por me haver dado condições de me dedicar inteiramente à literatura, à minha carreira, pelo seu amor, carinho, ternura, o grande segredo de minha carreira literária-filosófica estar sendo realizada com sucesso, aos meus compadres, Paulo César, Nívea Marinha, Luquinhas, por seus reconhecimentos, amor, carinho, por escreverem seus textos neste suplemento
Já comentaram até que tenho todos os motivos do mundo para ser um escritor orgulhoso de mim mesmo, de minha carreira. Sinto-me orgulhoso disto, sim, mas daí sentar nas nuvens e olhar para baixo não tem qualquer sentido. Sinceramente corro disso. Também não tenho tempo, tenho de produzir, tenho de sair pelas ruas da cidade entregando minhas edições aos leitores. Orgulhos passam rápido, e com eles obras verdadeiras e profundas não são produzidas. Meu mestre Dostoiévski teve esta fase em sua carreira, se achava grande mesmo, e ele se sentiu verdadeiramente culpado deste comportamento espúrio, meteu-se em barcos furados, furados mesmo.

J. A. F. F. – Onde você encontra inspiração para produzir Razão In-versa?

M. F. – Há uma diferença em perguntar de onde vêm as inspirações, se do quotidiano observado, se da ficção, como fizera Roberto Figueiredo dos Santos, e esta sua, onde encontro inspiração para produzir Razão In-versa.
Na entrevista concedida ao Robertinho, dissera que o escritor mesmo é inspirado todo o tempo, tendo sido até radical com a consideração. Aqui retifico. Depende do escritor. Graciliano Ramos mesmo reclamava de falta de inspiração para escrever. Sinto-me inspirado todo tempo para escrever. Mas já aconteceu algumas vezes de ficar minutos a fio com a página branca à frente e nem uma palavra se me haver revelado, angústia, desespero foram as conseqüências. É incomum.
A sua pergunta se refere à produção de Razão In-versa. Se a de Robertinho Figueiredo me fez rebolar para responder, pegou-me ele pelo suspensório, a sua é ainda mais difícil, complexa de ser respondida. João, digo-lhe que nestes dois anos de existência de Razão In-versa, apesar de todas as dificuldades, ansiedades, angústias, jamais tive tantas dificuldades quanto tive nesta agora. Normalmente, produzo uma edição em vinte, vinte e cinco dias. Para produzir esta levei quarenta dias. Há uma razão específica para isto. Em abril, faleceu um de meus maiores amigos, Toninho Fernandes, dias depois faleceu minha mãe-Améllia, a última de minha família, sinto-me bastante atordoado, desnorteado com o falecimento deles. De mãe-Améllia está ainda mais difícil de aceitar, sou o último da família, não tenho mais família, estou sozinho no mundo – há Marize, minha esposa, há vocês os amigos e leitores, há os amigos íntimos, Nilzo, a família inteira de Paulo César, mas a ausência de família é muito dolorosa -, há a biológica, mas ela jamais significou qualquer coisa para mim. Meu Deus! Que dificuldade! Escrevi várias porcarias na minha agenda, a inspiração me foi difícil, não conseguia pensar, os sentimentos não se me revelavam. Jamais cheguei a Marize, dizendo-lhe: “Marize, você precisa escrever alguns poemas para mim, ajudar-me a terminar a edição”. Na leitura dele, você vai perceber com clareza o que estou lhe dizendo. Só depois que fui a Gouveia para visitar a sepultura de minha família, consegui escrever num botequim de lá um texto bom, depois de uma semana  de textos menores, que estão aqui publicados. Mas com a visita ao cemitério, senti-me melhor, podendo produzir outros textos melhores. Não fossem estas entrevistas com vocês, sinceramente não iria sair esta edição, ficaria para o mês de julho.
A minha inspiração para produzir Razão In-versa vem de meus objetivos com a cultura, as artes, meus sonhos e utopias de outros horizontes e uni-versos da vida, existência, meus desejos e vontades de con-templar a verdade, das críticas à modernidade, aos valores ridículos e mesquinhos que a nossa atualidade está cultivando. O pedido de Dr. Antônio Fernandes Drumond para escrever mensagens espirituais veio a calhar muito bem com estes objetivos, isto é, ser a espiritualização um dos grandes objetivos de Razão In-versa. Sem a espiritualidade, nada somos neste mundo, devido à sua ausência é que estamos neste momento mais do que crítico, tudo está sendo permitido. Aliás, alguns leitores já comentaram sobre a presença da teologia na minha obra.  Agostinho dizia que enquanto ele foi só filósofo, sua vida era uma angústia sem limites, depois que despertou para a teologia, para a espiritualidade, sua vida sofreu grandes transformações, sentiu-se feliz e realizado. O mesmo aconteceu comigo. A Vida, os homens, a humanidade são as grandes inspirações para produzir Razão Inversa.

J. A. F. F. – Nesta data qual mensagem você gostaria de desejar aos leitores de Razão In-versa?

M. F. – A mensagem que desejo aos leitores diz respeito à “felicidade”. Há um poema de minha amiga D. Ernestina Barbosa, da Academia Cordisburguense de Letras Guimarães Rosa, que, aliás, foi por mim comentado num texto publicado no jornal E agora?


Ser Feliz

O que é ser feliz?
Perguntou um dia o poeta.
= Ser feliz é ver as estrelas,
o céu, a noite...
É estar perto de Deus.
É ficar sempre alerta.

Ser feliz, por exemplo,
pode ser “ver a rosa”,
observar o vento,
andar de bicicleta,
dar uma prosa,
viver o momento,
ter a alma poeta.

Ser feliz pode ser:
andar pela campinha,
saudar a matina,
amar e viver,

conversar com o amigo,
distribuir o sorriso,
falar de alegria,
na noite limpa e fria.

Quero mesmo desejar a todos os meus leitores e amigos muitas felicidades, alegrias, seus sonhos e utopias sejam realizados.

João, quero agradecer-lhe cordial e espiritualmente o seu reconhecimento por minha carreira, seu sempre presente incentivo, apoio, desde que nos conhecemos, seu carinho e amor por nosso Razão In-versa. Muito obrigado por tudo mesmo. Espero que tenha respondido  a critério e rigor  aos seus questionamentos, sinta-se satisfeito com as respostas. 

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