#SENÁCULO DE PANGARÉS - II TOMO #UTOPIA DO ASNO NO SERTÃO MINEIRO#- GRAÇA FONTIS: PINTURA/Manoel Ferreira Neto: ROMANCE



CAPÍTULO XIII - CENÁCULO DE NÓS GÓRDIOS E PRIMAVERAS - PARTE V


Sabia eu sobre o que estivera a dizer. Faz oito anos um jovem de dezessete anos, aquando estive a tomar uma cerveja num barzinho, chegara dizendo que a minha ex-esposa, com quem tive dois filhos, havia caído e batido a barriga numa pedra. Era necessário leva-la ao hospital de imediato. Estava grávida de meu primogênito. Levamo-la de carro, sendo ele o motorista, ao hospital. Felizmente, nada acontecera com o feto. Era seminarista. Cursava o quinto período de Filosofia no Seminário. No sexto período, iria apresentar uma Monografia para a Conclusão do Curso. Pensava em Sartre, as idéias da Liberdade deste filósofo seriam o objeto de sua monografia. Ofereci-lhe para ser o seu orientador.


Após ter socorrido a ex-mulher, não mais nos perdemos de vista, não perdemos contacto. Tornamo-nos amigos, e alguém a quem a cada dia admirava um pouco mais, admirava-me a sua inteligência, sensibilidade, solidariedade... Se chegasse a realizar o seu sonho de ser tornar padre, com efeito, seria um homem quem iria ser um excelente evangelizador.


No ano seguinte, trabalhamos na Monografia por quase seis meses. Houve tempo em que desejou interromper o trabalho comigo, pois estava sendo muito exigente, muito intransigente. O que escrevia, cortava eu. O que escrevia, cortava eu. Chegamos ao final. Apresentou a sua monografia. Ganhou dez dos três professores da Banca Examinadora, ainda menção honrosa. Desde então, sempre dissera ter sido eu quem o ensinara a escrever, quem o ensinara a fazer algo de modo radical, se tivesse de faze-lo.


Terminado o seu Curso de Filosofia, saiu do Seminário. Ficara três anos e meio fora. Tivera neste tempo a experiência de Professor em Faculdade. O seu dom, o seu chamado divino era ser padre. Retornou ao Seminário.


Recebi o seu convite para assistir à cerimônia religiosa de seu Diaconato na Catedral de Santo Antônio, onde resido faz um ano e meio, tendo sido ele quem, através de um convite para uma Palestra para os alunos do primeiro período de Filosofia sobre a Iluminação, me trouxera para esta cidade, e onde minha vida começou a modificar-se plena e absolutamente.


Ontem fomos a esposa e eu ao seu Diaconato. A primeira cerimônia de Diaconato que assistira eu em toda a minha vida. E este amigo-padrinho, padrinho no civil de meu segundo casamento, não deixou de dizer-me que fora eu também um dos que começara o seu sonho e lhe estava vendo crescer, amadurecer. Eram seus primeiros traços e passos, mas sempre se lembraria de minhas grandes contribuições.
À noite do dia de seu Diaconato, digo estas palavras no sonho: “Vá onde eu não fui que você acabará não tendo ido”.
Quem sabe as águas não sejam fonte de inspiração, intuição, percepção e sonho, mas seja o que rega, “agua” a semente dessa busca incansável da sublimidade, esta entrega aos dons do espírito e da alma, por estes serem o húmus essencial da vida, e a cada passo dado sinto que outros ainda terei de realizar rumo à perda de mim, e o encontro insuperável e ininteligível do êxtase e da volúpia...


Quem sabe, não é verdade? Sou eu a dizer e a jurar de pés juntos e mãos postas numa atitude de louvor e respeito aos dons que me foram gratuitamente dados, sou quem devo decidir que serão em nome de um sonho ou de uma utopia; sou eu a dar uma visão porque venho, sem interesses ou ideologias desta ou daquela intenção, intuição, estão as palavras livres, respondem por si mesmas, mostram a imagem que pretendem deixar inscritas nas sensibilidades, na esperança que os humanos dentro trazem em si...
Manoel Ferreira Neto
(JUNHO DE 2005)


(#RIODEJANEIRO#, 06 DE SETEMBRO DE 2018)


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