#DERRADEIRA ORIGEM DO MUNDO - I PARTE GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: POEMA



Aroma incerto no vento,
Efetivamente, não é da maresia marítima,
No catavento, redemoinho,
Canto erguido algures
Dentre as terras lavradas,
Dentre as caras lavadas,
A água de chuva, a água de chafariz,
Dentre os pastos de capim seco,
Dentre a grama viçosa nos canteiros
Na praça pública;
Luz que sobe de além da montanha,
Dentre as montanhas separadas à distância,
Dentre as chamas dos caldeirões do inferno,
Embora o inferno é(seja) muito longe daqui,
O mar esplendendo-se ao in-finito,
Raio de sol irisando a poeira
Suspensa na metafísica das misérias e pobrezas,
Na sociologia das moléstias psíquicas e sociais,
No abstrato das fomes e sedes seculares,
No solipsismo das angústias e tragédias
Fugazes e eternas,
Nas metáforas de Paz e Guerra alimentando
Unicamente o poder, são a súbita re-velação
De uma realidade perdida, de um tempo perdido,
E jamais reencontrados ou referenciados,
Porque são só apelos, vozes inaudíveis,
Derradeira origem do mundo origina...
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Profundeza sem fundo, abertura ao vazio,
Limite do ilimitado índice que está para lá
De todos os índices,
De todas as cláusulas e parágrafos ilícitos,
De todas as Constituições ilícitas e jurídicas,
De todas as Bíblias escusas
Se a-nunciam em mim pela pura suspensão,
Ouvido atento e nenhum rumor,
Olhar incerto que procura o que não há,
O que não ec-siste nem em algures,
Recuo brusco para além de tudo o que é referenciável, Representável, a-nunciável,
Questionamento que não duvida de sua razão,
Cegueira trans-lúcida de uns olhos opacos e abertos,
Interrogação que não interroga,
Encantamento de nada, uma ad-vertência, aviso de nada.
De um modo, linguagem e estilo ternos e carinhosos,
disseram-me a plenos pulmões:
" - Vou costurar estes olhinhos. Precisam de descanso."
Quiseram dizer: "Vamos silenciar esta língua.
Está muito cansada."
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Ouço-os de novo a esses cânticos anônimos
Que sobem das regas algures, em parte alguma,
Voz da própria terra,
Como sussurros e murmúrios de suas cavernas,
Buracos e grutas,
Lamúrias de suas próprias entranhas rasas e profundas,
Revejo-as a essas luas enormes
Na ascensão majestosa
De noite quente de Verão,
Sensação térmica de 50 graus,
Sinto-os ainda a esses
Aromas no vento e que aspiro ainda
De narinas dilatadas para que a sua
Realidade entre em mim e eles sejam reais,
Que os possa sentir e deliciar-me com eles.
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E um trêmulo a-núncio fala nas origens do meu ser,
de minha obra,
meus desejos
e vontades de realizá-los com perfeição e apreço,
no que os trans-cende e assoma o ilimitado de mim.


@riodejaneiro, 03 de fevereiro de 2020#


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