**INTERSTÍCIOS OCULTOS DO NADA** - Manoel Ferreira


POST-SCRIPTUM:



O Nada é um estado de recriação do Ser que acontece no infinito do seu tempo interior. É a síntese da existência que se encerra para a revelação de si mesmo.
Heidegger, num trecho de ininterrupta insistência mística, escreveu sobre a experiência do nada, em O que é a Metafísica?. Ela surge em momentos de tédio cósmico: momentos em que todas as distinções se achatam; um tédio que se sabe antecipadamente impossível de afastar, pois é antes metafísico do que o efetivo ennui de uma tarde monótona, que se pode pelo menos esperar venha a ser rompido, porque aparece na noite esura da alma. Então encontramos o nada como o limite do ser e não como demarcação dentro do ser, e ele evidentemente exige uma percepção da totalidade e, portanto, de fronteiras, antes de poder surgir à consciência. Sartre concede que o "não-ser existe apenas na superfície das coisas" querendo dizer que o nada é uma espécie particular de algo, não é uma espécie de coisa. Mas Sartre não supoe que cheguemos a uma consciência do nada somente em momentos extremos, do tipo apontado por Heidegger. Podemos nunca ter o tipo de experiência em que, numa frase que se tornou lugar-comum do contra-senso no alegre apogeu do Positivismo Lógico "o nada nada". Como pode esse nada extramundano explicar aquelas pequenas poças de não-ser que encontramos a cada instante no mais profundo do ser? Constato que Pierre não está no café, ou não tenho dinheiro, ou que a carta não chegou. E são essas experiências que me revelam o nada, melhor do que a experiência global, na qual os limites da realidade como um todo são esmagadoramente desvendados a uma apreensão essencialmente religiosa. Sartre se refere a esses nadas domésticos como "negatités" dispersas pelo mundo na medida em que nele se vive. Assim, a explicação de Heidegger é por demais grandiosa, muito além da experiência rotineira na qual o nada surge de maneira geral, diária. Uma criança o conhece ao aprender o significado de decepção; adquire-lhe o conceito ao adquirir a fala.
O nada não é uma entidade. O nada é engendrado. É uma espécie de sombra que projetamos, em vez de uma vacuidade pré-existente que descobrimos. Se o Ser se faz continuamente, a continuidade é também o Ser. O nada é um estado de re-criação do Ser na continuidade do tempo, acontecendo no in-finito de seu tempo interior. Como diz você, Rita Helena, tão magistralmente: "É a síntese da existência que se encerra para a revelação de si mesmo." Neste texto, busco revelar como se dá esta síntese da existência.



Manoel Ferreira Neto.



**INTERSTÍCIOS OCULTOS DO NADA**



Re-versos atrás de éritas pectivas retros de imagens res-plandecendo na superfície lisa do espelho, inda que ínfimas e minúsculas, nos átimos do tempo, pre-nunciando mistérios do além, aqueles tais de in-consc-ientes que velam medos e tremeliques do há-de ser, des-velam fugas e outras condutas de má-fé, permbular pelos baldios dos becos, sob a cintilância das estrelas, brilho da lua - que romantismo sem precedentes! -, cantando "não estou com sono/não há para onde ir...", a madrugada não custa a passar, o orvalho continua a cobrir as flores do jardim, o alvorecer será apenas um fenômeno da natureza, morrer ou viver não é a questão, a questão é deslizar no vazio, nada se há-de re-colher, nada se há-de a-colher, nalgum canto aquém de confins o epitáfio escrito com as gotículas de garoa do tempo nos devaneios de paulicéias do verbo e do nada, que os in-fin-itivos de arriba olvidaram as fin-itudes em uníssono recitando os pleonasmos vicios do eterno, os cacófatos do ab-soluto.
Vernáculo de solidão nad-ificado de értios resquícios das melancolias do in-fin-itivo querendo as sorrelfas do genesis deixadas ao léu nas bordas das im-perfeições perfeitas das perfect-itudes, das nostalgias do gerúndio, desejando com excelência da sensibilidade e do espírito, nas margens invisíveis dos horizontes de perfeitas im-perfeições das nad-itudes em cujas fáceis visíveis do in-visível alumia o semblante do abismo abismático de abissais sensações, a continuidade que se faz continuamente, a morte é a última esperança, saudades do particípio naquela fissura mais que compulsiva do apocalipse do Tudo, do Eterno, do Ab-soluto, projetadas, melhor ainda, jogadas a esmo qual confetes na soleira das pectivas intro que re-nunciam, nunciam desde o caos no instante do ser cosmos, a mostragem na moldura dos núncios do vir-a-ser em nome, sobrenome, nome completo do "Eu", silêncio e infra-silêncio nada mais são que sombras da linguagem, penumbras do estilo, brumas do dis-curso.
No crepúsculo do nada, sempre as cintilâncias da luz que, re-versas e in-versas de ad-versas vers-itudes, redimensionam as iríases do verbo e ritmam melodicamente as éresis da con-ting-ência da etern-idade, das etern-itudes e, por além dos tempos e ventos, aquela balalaika dos ventos soprando os tempos para adiante, os tempos movendo os ventos para trás, alfim os tempos requerem liberdade para jornadearem ao longos dos interstícios do nada oculto de poeiras da estrada, do nada à luz do rio cristalino de per-curso, de-curso, sem fonte, sem margem, entregue livre às forclusions e furtividades das sendas e veredas à mercê dos passos a passos em direção à vida do viver, à existência do existir...
Nada é luz do silêncio. Nada é luz do infra-silêncio. Nada é luz da verdade, também das in-verdades. Nada é a vida, em cujas tessituras e tecituras se projetm o Ser-do Verbo, o Verbo-do Ser.
Verbo e silêncio... Verso-Uno do Ser...



Manoel Ferreira Neto
(*RIO DE JANEIRO*, 13 de novembro de 2016)


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