#AFORISMO 855/ PENSO, COGITO, COMO SE O ESTÔMAGO DIGERISSE IDÉIAS ESTRUMES, IDEAIS CASCALHOS" - GRAÇA FONTIS: PINTURA/Manoel Ferreira Neto: AFORISMO
"Após as transformações, mudanças somos mais ou menos os mesmos, e
pensamos que somos íntegros, completos, somos por inteiro"(Manoel Ferreira
Neto)
Estou antes de tudo, acima de nada, (como antes), sem saber da
metafísica, da exegese, da antropologia cultural, da teoria do conhecimento, da
ontologia, da poética, das linguísticas e semânticas, semióticas, da filosofia,
do Grande Sertão: Veredas, do Espírito Subterrâneo, das Memórias Póstumas de
Brás Cubas, d´O Ser e o Nada, do Alienista, do re-nascimento do Aforismo, da
poética-pensante; estou antes de tudo, (como agora), sem saber destas coisas,
sem qualquer noção de coisas trans-cendentes, espirituais, pura contingência
não sou, não estou contingente. E antes de nada, (como antes), estou
con-templando o horizonte depois do mar.
O homem há de decifrar enigmas, des-velar mistérios, des-vendar mitos e
conhecer segredos (não degredos), decifrar lendas e causos, amar como nunca o
olho (o perdido), amar a esposa e/ou companheira, o vazio do peito, a náusea da
alma, o nada do espírito. Penso, cogito, como se o estômago digerisse idéias
estrumes, ideais cascalhos. O amor e a morte fossem falácias, verborréias. A
liberdade e o verbo do ser fossem tolices, bobagens. O sonho e o fracasso
fossem metafísicas sublimes do nada.
As
utopias
e
as
frustrações
fossem
simplesmente
puras
exegeses
dos
cânticos bíblicos.
Os devaneios
e as
liberdades
das
criações
fossem simplesmente
Frutos
do Diazepan
que
acabara de tomar.
Como a morte habito a madrugada de agonia, silencio a dor, como homem
re-faço as horas da vida, não sinto que a missão terrena está no fim, ao
contrário, agora que está iniciando, há muito a projetar, há muito a re-considerar,
re-fazer, bater o tapete da "sala-de-visitas", do silêncio e do verbo
de investigar os resquícios das idéias e dos pensamentos, instantes prazerosos
de diálogo e con-versa da vida, dos ideais de ec-sistir por inteiro, na amurada
da varanda, tirando-lhe as poeiras do tempo.
Querer decifrar o silêncio é rir do enigma, querer des-velar a solidão é
ironizar o mito, querer des-vendar o vazio da alma é tirar sarro do eterno,
querer des-nudar as ipseidades e facticidades é riscar o etéreo com a pena de éter.
Minha solidão, angústia, tristeza estão escritas em meu rosto, como antes, em
meus olhos reside o medo, conforme con-templo na imagem refletida, em meu rosto
perdido numa imensa praça parisiense na densa névoa de um inverno tão milenar
quanto o eterno paraíso perdido, numa ilha carioca, no anoitecer, olhando o
in-finito através do pincenez de minhas contingência lie, la, la... lie, lie,
lie, lá, lie, lie, lie..., a esposa descansando no assento do carro.
Faço o verso em luz e desmaio no horizonte oposto ao po-ente. Faço o
poema em verbo e espreguiço na rede ad-jacente ao infinito, faço amor e durmo
de pés entrecruzados com a amada. Faço a erudição na prosa e me deito no chão
de ladrilhos. Faço prosa em semiologia e fon-ética e gargalho a deus-dará do
pretérito dos subjuntivos particípios, e não haverem dúvidas, dos particípios
subjuntivos e subjetivos, para sintetizar. Cubro-me com uma pétala e sou mais
forte que o sol, mas frágil que a lua cheia.
Eu, com meus taos versos trans-cendentes de verbos e luz do ser, vós,
com vossos paletós Pierre Cardan brancos ou pretos, seus bermudões cinco
estrelas, eu calça tergal e camisa de manga comprida, gastos pelo tempo, não
estou sujo e nem rasgado, um forasteiro, eu que costumava me sentir confortável
nos bordéis do silêncio e solidão; eu, com esta consciência do efêmero e da
morte, vós, com o churrasco de picanha e whisky na mesa farta; eu, buscando o
ser inatingível, vós, com gorros e capotes russos; eu, meditando muito sobre
vossos orgulhos e vaidades, vossos poderes, vós dormindo em colchão de notas de
cem reais, eu refletindo na sensibilidade do aforismo, e como revelar isto que
toque a alma dos homens, e vós com idéias fixas de "barroco moderno."
Eis uma grande piada.
Sign-itudes... Simbol-itudes... O in-verno real-iza a alma, e o corpo
verbaliza medos, a-gonias. Frio ads-tringente aos ossos, inspirações e ideais
de mãos entre-laçadas trilham caminhos de trevas, per-correm veredas de luzes,
consubstanciam esperanças outras ad-vindas da síntese do pretérito de
sentimentos vulgares do amor e subjuntivos de emoções insubstanciais do tempo,
do ser, das horas de alegria e felicidade, aos amplexos e palavras gentis,
comemorando o Dia dos Namorados, pensando estou mais velho e mais jovem do que
serei. Sempre de nada projetado no espelho embaciado de poeiras de algures,
orvalho de alhures, a imagem des-facelada, multifacetada, a vida simplesmente
náuseas de outrora. Aquém, antes de quaisquer aquéns, taos de memórias
despetalando a-nunciações de lembranças furtivas inda que incognoscíveis dos
subjetivos interstícios da alma que vagueia solitária no sem-horizonte, sem
lenço para enxugar o suor da travessia da ponte partida ao deserto na madrugada
de idílios de pectivas de pers do inolvidável, sem onde cair morto.
No sono a presença da efígie.
Penso, cogito, como se o estômago digerisse ideias estrumes, ideais
cascalhos.
(**RIO DE JANEIRO**, 12 DE JUNHO DE 2017)
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