#AFORISMO 701/ SOU A CORUJA DO VALE# - GRAÇA FONTIS: PINTURA/Manoel Ferreira Neto: AFORISMO



Se é no meu corpo que sou presença a mim, que me presencio, estou nele presente, com o absoluto que a determina, com a verdade suprema que a solidifica e cristaliza, isto para amenizar a idéia, deveria ser “diamantiza”, é nele também que sou presença ao mundo, no mundo estou presente até que a morte registre o ponto final, o nada derradeiro, tudo deixando de ec-sistir, de ser. Por presença a mim, entretanto, não entendo uma impossível coincidência de mim comigo, do “eu” e do “mim”, do "si-mesmo", mas a irredutível, categórica e absoluta afirmação do “eu” que sou, a minha impossível separação dele em qualquer ato que me afirme, em qualquer atitude que me endosse, em qualquer entrega que me patenteie em qualquer gesto que me id-[ent]-“ifique” o bloqueio que o “eu” me instaura, estabelece a impossibilidade de sair de mim, de me não ser, de não ser a mim, de outro ser não ser senão o que sou de mim.


“(...)
Outro, sim, que não eu. – Bardo sem nome,
Com pouco vivo; - sobre a terra, à noite,
Meu corpo lanço, descansando a fronte
Num tronco ou pedra ou mal nascido arbusto.
(...)”


Enquanto a Vida corre,
Abro, vagamente, sobre o Nada,
Sobre a Nonada,
O meu olhar noctívago
De insone,
Sonâmbulas as idéias do vazio
E travessia para o múltiplo
Que me revele o saber
Não apenas a sede dele.


O místico deseja a montanha verde,
Amainar a força das vagas,
Causando o re-fluxo do uni-verso,
A alegria da alma suprindo
A desolação das coisas,
O bosque encantado,
Os rios de águas cristalinas,
O mar de ondas leves, suaves,
O eterno do amor, a carícia da face,
Abraçar singelamente uma pequena felicidade
Beijar ternamente uma pequena alegria
Acariciar carinhosamente um pequeno sonho,
Tocar afetuosamente o rosto de uma senhora,
Olhar de repipe humildemente
Para outra pequena felicidade,
Para outra pequena alegria,
Para outro pequeno sonho;


O profundo silêncio
Deseja dos corpos a consumação do amor,
A felicidade de tais corpos
- corpos flexíveis e persuasivos,
O bailarino cujo símbolo
E expressão
São a alma feliz de si mesma -
E tais almas
Denominam-se “virtude”,
A despedida do último sol,
A esperança da liberdade,
A utopia da terra-mãe.


De si mesmo
Por onde andará o crente?
O mundo se lhe mostra indiferente?
Por onde o “si” do crente andará mesmo?
Vive regendo estranhas contra-danças
No baile de corpos?
Regencia performances dos movimentos
Sin-cronizados, harmonizados
À arte do sublime?


Por si mesmo,
Onde andará o crente?
O ritmo das ruas e avenidas
Convida-o a entrar no bulício quotidiano?


(**RIO DE JANEIRO**, 23 DE ABRIL DE 2018)


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