#A PROVA DAS CHAMAS DO MISTÉRIO# GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: METAFÍSICA DO FOGO ====



EPÍGRAFE:
"Uma verdade madura... colho apenas das chamas do mistério, à lareira do fogo psíquico.!"(Manoel Ferreira Neto)
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Deixai-me dizer-vos, oh deuses:
Tempos de castigos por não obedecer
Vossas leis nada dizem hodiernamente,
São ultrapassados, até vós sois mitos,
Lendas, são zagaias de mediocridades,
O fogo do conhecimento doado aos homens,
Que valeu a Prometeu
Ser preso ao chão, urubus comendo-lhe o fígado per siempre,
Tem ele agora outro sentido,
São des-metafísicas de valores, virtudes,
Ideologias ardentes de princípios escusos,
Sísifo já não leva a rocha ao topo da montanha,
Sempre caindo antes de colocá-la, empreitada eterna,
Sísifo anda tranquilo no calçadão das praias,
Curtindo os raios de sol,
Os ventos frios, gélidos,
Cogitando a liberdade de artificiar
Os tristes trópicos vistos à distância do mar,
A fora o encontro das águas
Com as nuvens acinzentadas,
Sentando-se numa mesa de quiosque,
Tomando dose de Jack Daniel´s,
Fumando cachimbo,
Olhando o movimento de automóveis,
Transeuntes, dispersando as lembranças
Pretéritos das dores e sofrimentos,
De espírito leve, para ele a alma inexiste,
Convido-vos, cheio de solidariedade,
Compaixão, a engajar à nossa Modernidade
De tudo ser permitido,
Até Zeus deixará de gargalhar com
As cretinices dos homens,
Sentirá ele que ser deus é criação
Peculiar de quem sente profundo
A infantilidade do poder, da fé, no quiosque
ATRÁS DE VOCÊ 7,
Zeus, sério, introspectivo,
Numa caixinha de fósforo,
Compondo lírica de Samba
À moda Blues, mostrará inteligência.
Será ele aquele camarada flamenguista,
Aberto a todas as aventuras do vazio
De preceitos, dogmas, princípios,
Numa expressão inglesa "Light",
Levando os tempos na flauta...
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Seria, oh deuses gloriosos,
Com estas palavras soltas o desejo probo
De dirigir-vos as idéias que faço de vós,
O ideal promíscuo do mundo,
Da terra-mãe,
Estimando o livre-arbítrio da
Vida ser maravilhosa,
Tudo pode ser leveza na língua
Das utopias vadias,
Tudo pode ser... Tudo pode ser...
Até debaixo do oceano
O nada mergulha profuso...
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Hoje estendo os braços para as samambaias do ocaso, para as orquídeas ao acaso, para os crisântemos das coincidências, prudente apenas para tripudiar, para enganar o inaudito como um moleque de rua deserta, jogando "figurinha" ou bola de gude com o companheiro das pintações do sete(nada mais prazeroso que estas diversões infantis; não participei delas, por que as cito, hein?). Hoje desejo ser solidário com o que me dá náuseas, com o próprio destino não quero ser avarento. Só existe uma única sabedoria com um poder infinito: a divina sabedoria da criação, saber das perquirições do Ser.
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Minha alma sedenta do ininteligível, desconhecido, com língua insaciável de nonsenses e vulgaridades, já lambeu em todas as coisas insossas e ingustáveis, em todas as pre-fundidades já mergulhou, mas sempre nada de novo para as nuvens brancas do céu, por causa dessa alma chamam-me Pobre de Fé, Viperino das Utopias, Miserável das Esperanças, Zé Mané das Virtudes. Admiram-me tantos epítetos: não havia chegado a tantas presunções, embora o pernóstico seja uma das características eidéticas e aidéticas.
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Rios sagrados remontam à nascente. Os homens tramam pérfidas conspirações, e a fé nos deuses já não tem raízes nos corações, os querubins não tem já asas, nas imaginações férteis, os mitos clamem por uma in-vestigação da Verdade nos âmbitos da Consciência e Liberdade. Em breve, a fama mudará de linguagem, e não terá conosco louvores suficientes. O delírio da paixão arrasta-se por sobre os mares, através das duplas rochas. O próprio pudor já levantou voo ao céu, quiçá para sentir o que é isto o ar das alturas.
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Nenhum segundo, ainda que ínfimo, se passou desde a solidão de meus idílios compactos, desde o silêncio da alma que refletiu no espelho a imagem da razão/vida, desde o exílio que projectou na superfície do espelho a imagem do des-consolo e anonimato. Nenhum pingo de chuva, ainda que pequeno, molhou o chapéu posto de viés na minha cabeça, a mente sem nenhum pensamento, in totum vazia - toda mente busca ser, ser é viver, viver é compreender, a compreensão alimenta-se da beleza e da verdade. Longínquas paragens, através do profundo mar, pela estreita passagem que abre a planície sem limite das ondas marítimas iguabanas. Nenhum vento úmido, nenhum orvalho de ternura e afeição, nenhuma chuva por mais rápida seja - uma terra de só ensimesmado dia... fissuradas agonias e desesperos, melancolia de trincar os ossos. Agora clamo, rogo e peço à minha ignorância, analfabetismo que não se tornem inauditos nesse deserto insosso: derramai vós mesmos a última gota de tristeza, gotejai vosso orvalho nas minhas vestes miseráveis, sede vós mesmos garoa para a minha caverna ensombrecida, neblina para lançar seus flocos na janela aberta ao tédio do céu luarado e estrelado.
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Outrora mandei as montanhas distanciarem-se o mais possível de minhas sendas perdidas, veredas esgarçadas, esfiapadas - outrora sussurrei aos meus ouvidos "mais raios de sol, ó sombras!" Hoje as seduzo, para que se aproximem de mim, sentem-se ao meu lado e murmurem palavras de esperança: fazei luz ao meu redor com vossos úteros de sentidos!
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O mistério das cousas? Sei lá o que é mistério! - todas as noções esvaeceram-se, todos os conceitos eterizaram-se, realizei todos, não passaram de ledos enganos, equívocos. O único mistério é haver quem pense, in-vestigue o mistério, é haver questionamento sobre ele. A luz do sol é sine qua non, mais que os pensamentos, o som da canção é fundamental, mais que a clareza das idéias. Por mais que por mim enverede, todos os atalhos do meu sonho vão dar a clareiras de angústias, náuseas. Que mal fiz eu a todos os deuses? Que qualidade de castigo será imputado a mim - cortarem-me a língua? Tirem-me as metafísicas, o sued das coisas vãs, o sotim das tramóias e inteligências das corrupções.
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Gozo o orvalho que me legam, a neblina que me dão, a neve que me cedem, a garoa que me con-sentem, a alma que me deixaram nos dedos ágeis, e nada mais questiono, nem elucubro, nem urubuservo. O que deixar escrito no livro dos peregrinos puder, relido um dia por outros, diverti-los também na travessia, está bem. Se não o lerem, será bem também. Quisera fosse quotidiana esta macunaíma de humor, muito além da preguiça, estado sentimental, emocional, psíquico lerdo, lento, o que importam as coisas?
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Desejo ordenhar-vos, ó mulas das profundezas abismáticas do nada, ó leões das superfícies da caverna no vale dos cáctus! Conhecimento morno como leite integral, deliciosa garoa do clímax do amor estendo eu sobre o tapete silvestre do solo.
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Fora, fora, absolutas verdades abertas que insistem perpassar-me as entranhas da alma, afora os ismos que sapateiam no solo, características píticas, mazelas que o mesmo cristaliza! Não quero enxergar em meus picos verdades íngremes e insolentes. Diamantizada de sorrisos e gargalhadas chegue hoje a mim a verdade, pelos raios do sol melada de suor, pelo sentimento de êxtase e volúpia...
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Uma verdade madura... colho apenas das chamas do mistério, à lareira do fogo psíquico!
#RIO DE JANEIRO(RJ), 04 DE NOVEMBRO DE 2020, 14:45 p.m.#

 

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