#AFORISMO 185/NO POEMA DO ESPÍRITO, A PRESENÇA VIVA DO ETERNO** GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: AFORISMO


Estou aqui onde me crio, re-crio,
Onde me invento, faço-me.
De tinta são os meus traços, caracteres,
De gótica caligrafia são os sentimentos e buscas
Nos mistérios e matagais das contingências.


{As dimensões são herméticas, complicadas,
Diversas, prolixas, eruditas
Não as aprovo in totum,
Mas o que menos aprovo
São os imediatismos da compreensão,
Ver o óbvio onde reside o obtuso,
Ver o divino onde habita o mefistofélico,
Ver o prazer onde está a náusea,
Id-ent-ifico distúrbios sensíveis e psíquicos,
Inda menos o que aprovo:
os rudes fundamentos do entendimento.}


A folha é de papel, linhas, margens,
As letras são cursivas, in-cursivas, des-cursivas.
Esboço um sentimento que retiro de mim dentro,
Garatujo uma emoção que me perpassa o íntimo
Delineio uma idéia que se me a-nuncia,
Burilo um pensamento que se me re-vela:
Ainda não são os originais, não é a verdade minha.
Re-crio-lhes as bordas e ad-jacências,
Recomponho-lhes a imagem, re-faço a face.


Evoco o abstrato, invoco o transcendente,
Faço das perspectivas a minha raiz,
Faço dos ângulos o meu ser,
Das linhas a alma, das entre-linhas o espírito.
Farto de mim, distancio-me, fico à espreita,
Constato: na vida ou na arte,
Em carne, osso, caneta ou lápis
Onde estou-sendo não é quem sou,
Onde sou não é quem estou sendo,
Onde estou não é sempre, não é eterno,
Onde sou não é absoluto, não é para sempre
O que sou é por um lince do olhar.


Temos raiz e temos abertura. Somos como uma árvore, fundados no chão que nos dá força para enfrentar as tempestades. Mas também temos a copa, que interage com o único, com as energias cósmicas, com os ventos, com as chuvas, com o sol e as estrelas. Sintetizamos tudo isso, transformamos em mais vida a nossa abertura. E se não mantemos a abertura - a copa -, o mundo estiola, as raízes secam e a seiva já não flui. Morremos. A dialética consiste em manter juntos o enraizamento e a abertura. Imanentes, mas abertos à transcendência.


Águas re-fletindo imagens
Sob raios numinosos do sol
Lírios brancos à mercê de vento suave,
Belga pousado no arame farpado
Da cerca, trinando seu canto,
Nuvens brancas deslizando no azul celeste
Pétala perdida de rosa vermelha sendo
Levada a esmo pelo rio sem pressa de sua jornada.


Sentimentos leves perpassando o íntimo,
Carinho,
Ternura,
Afeição
Ouço o pulsar do coração, extasiado de emoção,
No que em mim trago dentro, as volúpias da alma
Transcendem as elegias do instante de sonho,
Trans-elevam as sorrelfas compactas do momento de vigília,
Em mim sentindo íntimo, a alegria conjuga versos
A felicidade recita de rimas as fantasias
do amor correspondido,
do amor sentido profundo,
do amor saboreado,
do amor entre-laçado de corpos
em busca do clímax absoluto e pleno
No que em mim deseja de Verdades
As regências verbais tecem de erudição
A estética do estilo sensível, espiritual
As metáforas conjugam de imagens
A linguística do eterno, a estilística do fugaz,
As regências nominais desenham
No horizonte as perspectivas
Da linguagem do Ser e Tempo
E nos interstícios da alma de verbos alucinados,
Esperanças delineiam de perspectivas
Cânticos solenes em uni-versos líricos
Plen-itude de êxtases compõem de estesias
Alhures de sentimentos à busca
De subjetivas verdades
Algures de desejos de felicidade à busca
do espírito de con-templar o absoluto
sentido efêmero,
sentido volátil,
sentido nítido nulo,
sentido susceptível,
sentido volúvel,
sentido estrela cadente,
sentido lua adjacente,
sentido vazio
Sonhos do belo, beleza de re-fazendas conjugam
imagens e intuições,
perspectivas e inspirações,
criatividade e percepções,
re-criando da memória o movimento,
literalizando da recordação os instantes,
no poema do espírito a presença viva
do eterno feito amor,
do efemêro feito desejo


do há-de ser feito querência
do simples feito grandeza
do nada feito travessia para o além...


(**RIO DE JANEIRO**, 15 DE SETEMBRO DE 2017)


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