**MÁXIMA ÁSNICA: "VENTO SOMBRIO E EFÊMERO HABITA MINH´ALMA"** - Manoel Ferreira


Isto, em verdade...
Queiram discutir as criaturas humanas neste ou naquele ângulo, desde que alegrem os calafrios, deixemos de lado os brios, não carece de entrar nestes méritos; estou velho, não posso ter fortes emoções, relinchos, outra coisa não é possível senão deitar no chão e estrebuchar de tanto rir com tão perniciosos pensamentos; as mocinhas de boa conduta desejo que saltem este relincho, ajuda a conservar os calafrios antes dos brios, se é que me expresso numa língua ásnica compreensível aos espíritos imbecis e pernósticos, façam-lhes chorar de tanto rir; mas o reverso desta moeda é tão triste e melancólico que faria as Górgonas ajoelharem-se diante das pedras, pedindo-lhes perdão e compaixão por atitudes tão vergonhosas com os homens, não importando o sexo, se olhasse a Medusa, tornar-se-ia pedra e nada havia que ou quem pudesse reverter a situação... Pediriam perdão, estavam arrependidas de haverem tornado pedras tantos homens, mas as livrassem da nostalgia, melancolia, tristeza... coisas assim do arco-da-velha, não importando aqui e agora tratar desta questão, estou retornando do passeio com a família Neves. Não me consta, jamais ouvira dizer que as pedras perdoam. Se perdoassem, alguém já teria dito que as pedras também perdoam. 
 Há um ditado árabe que diz o seguinte: “se você jogar uma pessoa de sucesso em um rio, ela certamente sairá de lá, com um peixe na boca”. Isto porque, onde ela estiver, o sucesso vai estar ao lado dela. Não posso dizer que tenham os Neves conhecimento deste ditado, mas em verdade, tendo-lhes ouvido dizer, que se jogar um imbecil no Rio das Pulgas, ele sairá de lá com um cágado na boca, pois não sabe discernir o que é o quê nesta história, imagino que alguém tenha recriado. Há muitos que são versões de sabedorias milenares, bíblicas.
Para mim, não me é dada a liberdade de separar a alma e o corpo, como faz o povo, e ainda menos diferenciar alma e espírito. Não sou rã pensadora, aparelho de objetivar e registrar, de entranhas congeladas; tenho de parir constantemente os pensamentos e idéias na minha dor, insatisfação, angústia, desespero e dar-lhes asnicamente todo o sangue, coração, fogo, alegria, paixão, tormento, consciência, destino e fatalidade que existem em mim. Viver é transformar em luz e flama tudo aquilo que se é e também tudo aquilo que nos atinge; não podemos agir de outra maneira.
 Asno não procria; não é preciso castrar. A menos que... Será que alguém em Atenas Atéia teve a magnífica idéia de me castrar, assim não poria no mundo outro asno intelectual. Vá que a moda pegue! Seria concorrência desleal com os intelectuais humanos: enfim de quem tirar a razão das perspectivas observadas das mazelas e picuinhas humanas: dos intelectuais humanos ou dos ásnicos intelectuais? Bem, há-de se considerar que asno não procria. Na mente ateniense atéia, tudo é possível e permitido.
Meu instinto “particular”, o secreto amor que nele cresce, mostra-me situações em que sou dispensado de relinchar de mim; no mesmo sentido em que até agora o instinto de mãe da mulher conservou a situação dependente da mulher. Em última instância, exijo bem pouco, a máxima é: “quem possui é possuído” (possuo instinto sou possuído pelo instinto) – isto, como tenho de repetir vez por outra, não por virtude, por uma meritória vontade de singeleza e moderação, mas porque o senhor supremo assim exige, prudente e inexoravelmente: tenho em conta uma coisa, e apenas para ele junto e acumulo tempo, energia, amor, interesse. Essa espécie de homem não gosta de ser perturbada por inimizades, tampouco por amizades; esquece ou despreza com facilidade. 
Os instintos são os testemunhos de tempos idos e não retornados, mas que na cauda e nas orelhas trazemos sempre a sensação de vento sombrio e efêmero habita a alma...



(**RIO DE JANEIRO**, 15 DE DEZEMBRO DE 2016)

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