ANA JÚLIA MACHADO ESCRITORA POETISA E CRÍTICA LITERÁRIA ANALISA E INTERPRETA A PROSA #NONADAS E SOMBRAS CINERÍCIAS#





O texto de Manoel Ferreira Neto NONADAS E SOMBRAS CINERÍCIAS, além de à primeira impressão aparentar ser fácil…engana-se quem pensa que é…tudo é sombrio e cinzento para o escritor…vive-se num abismo de talentos que refugia a transcendência do incongruente…


Verbalizaria que debaixo um paraíso despojado de menções, a jura de independência que o reproduz nos feitos da existência incumbiria auxiliar-nos a entender que as normas, muitas ocasiões analisadas como decisivas, aceitam outras perspectivas de estilo onde podemos laborar com a faculdade de refutações diferentes ao desassossego da cultura.
O significado dessa imputação arruína-se, no entanto, nas derivas da dissertação de seres pródigos, que baralha a deslocação do término com a rejeição do espaço do inexequível.


Nós – que distraídos na repartição do proveito sumo bisávamos a busca sempre falhada de um prazer completo – fomos advertidos sobre o temperamento arcaico desse expedito extraordinário roubado ao divo: a bebida que sara os erros da carência – verbaliza-nos a publicidade burocrática – foi arrebatada da habitação das divindades! Para conquistá-la, chega acatar os ditames de uma legitimidade brava que dispõe: Desfruta! Na dimensão dessa expugnação passamos, nesse caso, a admitir jubilosamente como propósito e fado o penacho que nos coage diligenciar incessantemente mais...ainda aliciados pelo compromisso de fartura completa, não compreendemos, porém, a arteirice desse chamamento que ao representar o planeta como um campo coerente no qual tudo é exequível, intima-nos como escravos do prazer numa prisão arriscada da qual raros livram-se. Para além do raciocínio corrente que hospeda a dissertação da independência, essa tradução hodierna da enunciação cristã, que designa como ser servo no planeta e, ainda, continuar independente, aponta-nos, então, o que permanece de pavor no mundo dos deleites eróticos.


A transição do tempo, os impactos com os outros, o precipício inabalável que aparta a intelecção que possuímos de nós mesmos da realidade que nos escapula, a aflição dos encontros ausentes e a convicção do óbito diferenciam para a espécie humana não somente uma grandeza inexequível. A privação que persiste como preceito do carácter – mas, igualmente, o fortuito de criações ilusórias que contesta a essa genuína privação. Embora infrutífera, essa acervação de verdades é, no entanto, muitíssimo cativante, pois nos resguarda em nossas tentativas moucas –, do deparo com o autêntico do qual assomamos, pretendamos ou não, como réplica.


Desse deparo, não pretendemos ninharia erudição... Assim, licenciamo-nos acarretar pelas juras do perfeito que nos acirram a violentar as balizas estabelecidas para reencontrarmos o éden no torpor de um prazer completo! A existência, verbaliza Lacan …só cogita repousar o mais permissível enquanto aguarda o fenecimento... A vida só medita em fenecer... Repousar, fantasiar…quiçá, vida não pretende cicatrizar-se.


Por isso, é sempre propício encarar a tentação dessa licitude funesta cujos ditames nos endereçam a um campo escuro---cinzento, localizado além do cordel onde a rumo da existência adquire o sentido dos aros que aguentam o regresso ao que não possui alma. Dessa norma de sortilégios, de obstinação, injusta, de vaticínio igualmente..., ignoramos o sentido, e essa estranheza estampa o estigma da sua leviandade.


E como menciona no seu texto o escritor: À passagem da areia na ampulheta, aprecio a cavidade preta. Sinto tonturas indignas e inenarráveis nas orlas das sonsices e dos despropósitos da exatidão.


Ana Júlia Machado


#NONADAS E SOMBRAS CINERÍCIAS#
GRAÇA FONTIS: PINTURA
Manoel Ferreira Neto: PROSA


Covil de gênios abriga metafísica do ab-surdo, relatividades do vazio. Antro de néscios desenvolvem teoremas da preguiça, geometria de alfas e betos. Absurdas simetrias e sacras facticidades encontram-se nas linhas perdidas das constelações espaciais. Sentimentos obtusos não escondem segredos, antes articulam expectativas do abstrato caráter degenerativo. Pensamentos da morte envelam gratuidades pretéritas. Canto o que sinto espocar sem cessar. Por que não tenho raiz, copa frondosa das origens?


Perdido. Desmiolado. Esta presença inominável das nonadas e sombras cinerícias seria que discernisse a lucidez de quem se abstraiu do eco de murmúrios que povoa incógnitas da perquirição solitária? Tudo é alheio ao acaso que deita quimeras calientes. Céleres diademas circunspectivando vertentes, falácias, verborréias. À superfície de campinas verdes e viçosas a consumação dos tempos patenteia-se. Primevos preâmbulos das fantasias, tornando-se semens de sonhos, salpicam as paredes da caverna, onde inconteste o silêncio reside.


Ando às pressas na lerdeza do tempo. Marcho a esmo no sibilar dos ventos entre as árvores do bosque. Saltito angustiado e deprimido nos becos e alamedas inóspitos. À passagem da areia na ampulheta, con-templo o buraco negro. Sinto vertigens inomináveis e indescritíveis nas margens das hipocrisias e dos despautérios da verdade.


Apesar de a alma ir pairando no vácuo noctívago, o mundo é quiçá , se não for apesar de acasos a reverterem lembranças à deriva.


#RIODEJANEIRO#, 17 DE MAIO DE 2019#

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