AFORISMO DO SONHO GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: PROSA




Quando sonho com a água límpida não sei com que límpida água sonho. Sei que sonho. É de ouro e de riso que ela se veste.


No meu jardim havia flores de todas as belezas... Rosas de contornos enrolados, lírios de um branco amarelecendo-se, papoulas que seriam ocultas, se o seu rubro não lhes não espreitasse presença, violetas poucas na margem tufada dos canteiros miosótis mínimos, camélias estéreis de perfume... E, pasmados por cima de ervas altas, olhos, os girassóis isolados fitavam-me grandemente. À janela de meu quintal, havia pés de jabuticaba, abacate, de café, de figo, mamão, e o que mais apreciava observar com olhos tergi-versados, a goiabeira, as goiabas não caíam demais, pois que não lhes consentia mais delonga, amareliçadas, tempo de ser degustadas... residia numa floresta, numa casa no centro da cidade, num bosque. Era imensa a área, no centro a casa, estilo tradicional, onze cômodos interiores, duas varandas.


Quando sonho com as etern-itudes in-versas do sonho, sei que é sonho dentro de outro sonho. É de efêmeros e de nada que eles alçam voo. É de vazios e abismos que eles sibilam mensagens e segredos da inconsciência.


Série de sonhos, busca de esperanças, querências do ser, abismos de silêncio, grutas de solidão, quiçá os horizontes de além entre-lacem as estrelas cintilantes, brilho da lua, re-vel-ando o esplendor estético das éresis do tempo, quiça os uni-versos do vazio des-velem os mistérios inauditos da alma, enigmas indevassáveis do não-ser, éter do nada, éter de nonadas, travessias, passagens, ocasos de luzes res-plandecendo o crepúsculo, miríades de raios numinando o anoitecer, anoitecer de idílios, anoitecer de esperanças, anoitecer de perquirições - "onde a resposta?", precedendo "que resposta há?", nada isto pode importar ou despertar curiosidade -, pretéritos subjuntivos acendendo na lareira de defectivos gerúndios a memória do genesis, ascedendo nas asas do vento particípios e genitivos dos lapsos de memória, olvidamento das indagações almáticas das moléstias psíquicas.


Quando sonho com os verbos, regencio os seus tempos e concordo as contingências quotidianas, as acepções outras que adquirem, as gerências nominais de in-verso e re-verso, há-de sensibilizarem os prazeres trancafiados a sete chaves, onde a cor-agem de identificá-los, a sede e saber e desvelar os pretéritos inesquecíveis? Gerencio em mim e fora de mim os espectros itinerantes, colhendo as flores que rezam alguns senhores, contemplando espaços, sítios, lugares outros, as diferenças de sentimentos e emoções, de pensamentos, e efetivamente o pensamento pensa pensar aléias além porteiras, cancelas e fronteira e pensa pensando o persamento de pensar a ausência, o lapso branco das condutas e posturas a virem, apresentarem-se nas situações e circunstâncias.


Quiçá os versos sejam ininteligíveis, nada apresentem de significações, letras escritas a esmo, enfim a inspiração refestela-se na rede da varanda na tranquilidade, serenidade, suavidade da noite; plenifiquem-se de estrelas, boêmios seresteiros deixaram a viola no canto do quarto, encostada à parede, são andarilhos do tempo-nada, são sendeiros do tempo-vazio, são vagabundos do tempo-melancolia, são peregrinos do tempo-deserto, do tempo-silêncio, arrabisco palavritas na página sem linhas, sentado à poltrona, sou o vazio-de nada, e hei-de preencher o nada do vazio de ser, e isto são devaneios e desvairos da alma sedenta de outras ondas e marés...


O meu sonho de viver ia adiante de mim, alado, e eu tinha para ele um sorriso igual e alheio, combinado nas almas sem me olhar. A minha vida era toda a vida... O meu amor era o perfume do amor... Vivia horas impossíveis, cheias de ser eu... E isto porque sabia, com toda a carne da minha carne, que não era uma realidade..., quisesse reconhecer-lhe alguma virtude plausível de ser con-sentida, diria era uma quimera, alfim o sêmen da quimera dera origem ao saber, ao conhecimento, idéias e ideais sensibilizaram as querenças do Ser e da Liberdade.


Quando sonho passos comedidos na orla marítima, observando o amareliçado da luz solar, não perquiro ou intento investigar o que lhe habita os recônditos do inconsciente, não avalio a introspecção e circunspecção do momento, o mundo gira à beira-mar, conquistas e experiências se fazem na orla e no bosque dos gritos e uivos de res-postas à liberdade das origens, con-sentir assimilar outros horizontes e universos da existência, nada importaria, pois que sinto a liberdade de desenvolver passos comedidos, se prefiro a orla marítima, o crepúsculo identifica as trilhas palmilhadas, o que o presente hoje traz em sua algibeira e alforje senão a presença do longínquo que só as águas do mar podem trazer à praia, esparramar nas areias, as ondas... E me vejo perder na distância da orla...


Palavras retrógradas configurando metáforas, zagaias de outrora, zagaias do inolvidável, zagaias do preterizado, zagaias do de-composto, sombras presentes em todos os cantos e recantos - sentidos do nada que me perpassam o âmago recôndito, pleno interstício do ser, abóboda do perene símbolo do que efemeriza as esperanças do sonho no sono noctívago das angústias, tristezas.


Quando sonho com os verbos do sono, infinitivo ou gerundio as orações ad-verbiais, sei que no sonho deste dia senti presente e forte a cor-agem de construir o imperfeito perfeito, aplicar-lhe o veneno da serpente, as res e ins do verso, com toda categoria e empáfia, alfim começar é imprescindível, dele depende o verbo-de ser, devaneios, desvarios... mister e sine qua non ipsis litteris e verbis o verso primevo que origina o tempo, o agora da alma no de-curso e per-curso da vida, e ele delinear os passos e traços da jornada sem limites do Verbo-de Ser Liberdade, e isto custe a trajetória da existência até o instante derradeiro, contudo passos e traços foram deixados.


A chuva cessaria, passadas algumas horas ou mesmo poucos dias, o sol voltaria, seus raios secariam as plantas, as rosas murchariam, cairiam suas pétalas secas.


Quando de sonhado nada me lembra, embora saber o ser humano sonho continuamente, há sonhos de que não se lembra por alguma razão ou jogos da inconsciência não são verbalizados, nada sonhei as origens longínquas esvoaçam, as ondas marítimas veem-me a-nunciar o mundo, veem-me começar a existência, sinas e sagas evolaram-se, houve de ser imprescindível o começo do mundo no crepúsculo, alguma coisa que começa e não houve tempo de terminar, assim é o eterno sob a imagem de meu pincenez, visto a lince de perquirição e surpresa, neste re-verso e in-verso de nada lembrar sonhado, quero o vento que espalha as palavras, o som musical que as faz dançar. O que sei de nada haver sonhado, o mundo é exatamente o que o coração pede.


Nada dizem estes versos, nada expressam estas estrofes, nada significa este poema, o nada de um poema é o não-ser da poesia, poema são estesias da poesia, poema são êxtases da poiética do ser do espírito que sonha a contingência
do vir-a-ser, a melancolia do efêmero, poema são clímaces das dores, sofrimentos ec-sistenciais à luz da tristeza do ser que sobrevoa a floresta das memórias pretéritas do caos, na dialética do efêmero, habita solene o absoluto vazio do não-ser, na dialética do eterno habita pomposo o divino sentimento dos horizontes des-vencilhados, des-cartados, des-velados no deserto do silêncio, no mar sombrio da solidão habita o espírito da felicidade re-versa às trans-cendências da morte, à alma in-versa às contingências do ser-sublime, a-nunciação, re-des-velação do ec-sistir.


Com poesia, Vertente são águas límpidas, seguindo a trajetória da vida em busca do Amor e da Verdade; com poesia, vertente é fonte de emoções serenas, sensibilizando casais enamorados da orla, inspirando cônjuges nos arrabiscos de obras futuras, agendas abertas; com poesia, vertente sacia o amor de verbos, sonhando a plen-itude do espírito; com poesia, vertente são mãos tecendo a beleza do verso, engendrando estrofes no soneto do Eterno; com poesia Vertente são almas comungadas, o instante íntimo do prazer e do êxtase no sonho do verbo, no sonho da liberdade, no sonho do eterno, é produzi-la, criá-la, re-criá-la, inventá-la, sentir disperso, anterior a fronteiras, cancelas, porteiras, a entrega in totum do "nós"; com poesia, Vertente é...


Quando sonho a Vertente do sonho, sei a vertente de meus idílios e devaneios, conheço vertente de meus projectos e razões, sei a vertente de minha consciência...


#riodejaneiro#, 30 de maio de 2019#

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