CARTA ABERTA À AMIGA, POETISA E ESCRITORA ANINHA JÚLIA, Ana Júlia Machado - Manoel Ferreira


Se alguém nos pergunta a respeito de um texto, de um poema, após algum tempo, não nos lembramos ipsis litteris do que lemos senão que lemos. Apesar de não nos lembrarmos, o lido está na nossa memória, na nossa sensibilidade, versando e con-versando com a nossa vida.
A Carta Aberta que lhe escrevi, minha queridíssima Amiga Aninha Júlia, há dois anos, marcava o início de nossas relações. Tratava-a com minha Secretária - quem comentava os textos, poemas, e quem trazia à luz a profundidade da obra, quem traduzia o que era in-inteligível. Mas, atrás disso, havia sentimentos de carinho, amizade, ternura, amor inestimáveis por você.
E por quê? Fácil é para quem é munido dos academicismos críticos, suas metodologias, mergulhar numa obra e revelar-lhe os seus inter-ditos, dizer-lhe suas dimensões estruturais, mas tais procedimentos deixam de lado, esquecem-se da sensibilidade, da espiritualidade da obra, prima a objetividade. Você, ao contrário, não lia(não lê) com a objetividade crítica acadêmica, mas a sensibilidade, a espiritualidade, a dimensão transcendente. Até a mim surpreendeu, de início, como podia alguém tão distante, o mar nos separando, sentir-me tão abissalmente, sermos o Verso-Uno, nossas almas unidas, comungadas, aderidas, e você traduzir-me, dizer-me, expressar-me com tanta veemência, com uma linguagem e estilo tão mais eruditos e clássicos, tão mais universal. Quanta vez, lendo os seus comentários e críticas, sentia e pensava que nossos espíritos foram divididos, metade em Portugal, metade no Brasil, e só a obra literária iria revelar essa divisão, iria manifestar essa compl-etude. Em verdade, em verdade, desde o nosso encontro, nossas relações, isto causou admiração a muitos amigos, comentavam(comentam) como duas pessoas de caráter, personalidade, cultura, hábitos, costumes podem estar tão unidos, lendo-se e revelando-se mutuamente.
Você sempre deixou mais que público e notório que o nosso encontro foi(é) o responsável por sua escrita, por se tornar escritora, poetisa tão profunda, tão abismática, mostrando os mistérios e enigmas da existência, e isso dirá por sempre a todos os ventos e tempos. E eu, hoje, posso dizer ipsis litteris que o nosso encontro é o responsável por conhecer a minha sensibilidade, o que me transcende, o humanitário que reside e habita em mim. Você tomou em mãos a "pedra lascada" e foi polindo, polindo, tornando-a "pedra polida". E, ao longo do tempo, das experiências e vivências, fomos nos unindo mais e mais, fomos aprofundando a nossa "unidade", o nosso "verso-uno". Não existe hoje Portugal e Brasil, existe uma espiritualidade nossa, espiritualidade e união.
Somos "Verso-Uno", Aninha Júlia, e isto me orgulha e felicita de modo que você, quiçá, não seja capaz de compreender e entender, mas sente no mais recôndito de seu espírito.
Beijinhos, minha inestimável Amiga.



Manoel Ferreira Neto
(21 de julho de 2016)



REFLEXÃO...
(Ana Júlia Machado)



Granjeei que para ser bem-aventurada não chega ambicionar...
Enxerguei que o tempo afinal não é terapêutico….
Que a dor não vence…só vence o pesar fugaz
Que o embuste não derruba, mas corrói
Que o hodiernamente não é imagem de outrora...
Apreendi que logramos prantear sem expelir pingos, o que dói a dobrar
Que os autênticos dilectos não ficam, muitos são roubados pela injustiça…há quem chame justiça…eu designo, roubo….
Que o sofrimento não fortifica, revolta….
Que triunfar nem sempre eleva...porque o mundo não é dos humildes vitoriosos
Percebi que idealizar é mascarar,….porque quem alcança o que pretende, não carece fantasiar…..
Que a pulcritude não acha-se no que contemplamos mas naquilo que experimentamos ao avistarmos…,o que me interessa contemplar uma flor, se não gostar da natureza….
Que a estima não acha-se quando se pretende...mas sim na expugnação do quotidiano
Apreendi que os vocábulos só possuem força se forem proferidos com sentir e possuir sensibilidade do distinto para os decifrar
Que executar é superior ao dizer…palavras leva-as o vento
Que o olhar não engana, os olhos são o caleidoscópio da nossa alma
Que existir é instruir-se com os equívocos...quem não erra passa a vida a ser um pateta….um imbecil para a sociedade…mas, que igualmente existe os que erram propositadamente para lesar o próximo…
Percebi que nem tudo depende da vontade...porque a lei da selvajaria existe…



Ana Júlia Machado


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