#É NA AMBIGUIDADE QUE SE REALIZA A LINGUAGEM E O ESTILO# GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: FILOSOFIA ----


No discurso poético, a relação entre as camadas verbal e significativa deixa de ser arbitrária, ganha necessidade. A maneira de significar significa. No sentido rigoroso da palavra, poesia é uma tomada de medida, somente pela qual o homem recebe a medida para a vastidão de sua essência. O homem se essencializa como o mortal. Assim se chama porque pode morrer.

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Poder morrer significa: ser capaz da morte como morte. Somente o homem morre e, na verdade, continuamente, enquanto se demora sobre esta terra, enquanto habita. Seu habitar se sustenta, porém, no poético. Hölderlin vislumbra a essência do “poético” na tomada de medida através da qual se cumpre plenamente o levantamento da medida da essência humana.

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Como diz Lacoue-Labarthe: Holderlin pensa a hybris sagrada de Antígona a partir da blasfêmia. No concernente à prosa poética a musicalidade da prosa, tecida com as linhas da sensibilidade e da ambigüidade, se transforma na poética que nela habita interiormente, tornando-se poética da prosa, e realizando a musicalidade, através da qual se re-presenta e dedilha “[...] a lira nos momentos em que analisa a essência dos seres e das coisas em torno de si”, conforme a orelha de Ópera do Silêncio, de Newton Vieira.

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O tempo nessa “orelha” pensado e in-terpretado são os tempos idos e vindouros, o homem mergulhado “nas profundezas éticas tão esquecidas quanto fundamentais no mundo contemporâneo”.

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A verdade do discurso poético, nessa perspectiva de interpretação e análise que fazemos, são as situações e circunstâncias no quotidiano, o que mesmo vivemos e experimentamos, recriadas e criadas em busca de tecer o lirismo, musicalidade e beleza na prosa, que nos identifique, real-ize o nosso reconhecimento no que fazemos.

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Qual é o tema central desse comentário de Holderlin? A consciência e sua relação com a inconsciência. Isso aparece em fórmulas como: “É um grande recurso da alma que trabalha em segredo esquivar-se da consciência no grau mais elevado da consciência...” ou “No ápice da consciência, ela sempre se compara com objetos que não têm consciência, mas que assumem em seu destino a forma de consciência” .

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Neste sentido, a mais alta consciência é a da finitude. Consciência que Antígona adquire no momento em que se dá frente a frente com a morte.

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Enquanto no discurso científico o vocabulário e a ordem expositiva são instrumentais, justificados apenas pela fidelidade com que simbolizam um conteúdo mentado que deles independe, no discurso poético a convenção se desfaz e refaz individualizada. É justamente esse “luzir sensível da idéia” na camada sensível tornada significativa, que os estetas têm localizado seu domínio. Será falsa, em estética, a reflexão que não partir dessa totalidade como de um dado originário de nossa experiência. A tarefa de cada indivíduo singular consiste em nada mais senão na própria purificação espiritual e corporal.

Acreditamos, hoje, abertamente, no tangente à “estética”, não mais exatamente o que Kant vinculava a essa palavra quando denominou a doutrina do espaço e do tempo uma “estética transcendental” e entendeu a doutrina do belo e do sublime na natureza e na arte como uma “crítica do juízo”.

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Acreditamos que a “estética” nasce na experiência concreta da vida em suas situações e circunstâncias, dores e sofrimentos, e a busca da consciência, do viver quem estamos no mundo, diante do mundo, dos homens, das coisas e dos objetos, é na ambigüidade que se realiza a linguagem e o estilo.

#RIO DE JANEIRO(RJ), 16 DE OUTUBRO DE 2020, 10:42 a.m.#

 

 

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