#ÁGUA LUSTRAL OCEÂNICA DE ALGUMA PRECE# GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: PROSA POEMÁTICA ===


Eu só, irredutível, princípio e fim,

Meio e continuidade,

Fechado, único e para sempre,

Onde vozes enigmáticas sussurram

Para as quimeras de tempos antigos

Lendas e mitos, causos, tristes trópicos,

Para os equívocos memoriais

Mentiras, enganações, trafulhas,

Ases da Canastra e Rei do Pôquer

Disputando as importâncias do jogo,

Ninfas passeando abertas às noctívagas quimeras,

Sereias deitadas na rocha sentindo prazeres,

Musas sarapalhando os passos de inspirações e

Reais jogos da mente, perspicácias do intelecto,

Do silêncio e o som das ondas marítimas suaves, singelas,

Ausculto-as, escuto-as, ouça-as em silêncio,

O que dizem, expressam,

O que escondem, guardam,

O que interditam,

Só, sem céu, nem inferno,

Nem eternidade após a morte,

Mas à busca de sentido para a vida assim mesmo

Quê alucinante!

Assim mesmo,

Como é fascinante imaginar-me em você, oh, vida,

Oh, oceano lustral de alguma prece,

Na sua fulguração!

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Nesta madrugada, assim que me acordei,

Pus-me no sítio donde me vira ao espelho e olhei,

Espelho em pé, encostado à parede da alcova,

Quiçá não fosse vagabundo, sim libertino,

O espírito maligno não deixa dúvidas,

A tudo bate o seu martelo, impossível negligenciar princípios,

Quaisquer relações com as ciências, religiões

Não existem, tudo está quebrado,

Diante de mim, límpida, nítida,

Estava uma pessoa que me fitava com inteira Individualidade que vivesse em mim e eu ignorava. Aproximei-me fascinado, olhei de perto.

E vi, vi os olhos, a face desse alguém que me habitava,

Era-me e eu jamais imaginara nem de longe fosse.

Pela primeira vez tinha o alarme

Dessa viva realidade que era eu,

Desse ser vivo que até então vivera comigo

Na absoluta indiferença de apenas ser

E em que agora descobria qualquer coisa mais,

Que me excedia e me metia medo,

Acariciei o peito até ao umbigo,

Largando à solta a mão nas axilas,

No lugar das cócegas, a deliciosa sensação da cáritas,

Gesto, sensações diferentes, suave o sentimento de carícia,

Há vida atrás da vida,

Uma irrealidade presente à realidade,

Mundo das formas de névoa, garoa, neblina,

Mundo incoercível e fugidio,

Mundo da surpresa e do aviso.

O próprio presente pode ter a voz do passado,

Vibrar com ele à obscuridade de mim.

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Um fulcro,

Uma certeza fora de mim,

Intrinsecamente fora, por mim escolhida,

Mas existindo na realidade, conferido com ela,

Ordenando-a, fixa e apesar de tudo mutável,

Obedecendo-a, respeitando-lhe a sabedoria, saber,

Metáfora das contingências,

Aberta à liberdade de re-fazendas,

Limite máximo da minha direção,

Fronteira de um itinerário perseguido,

Alucinação, desvario

Do meu impulso cego e absurdo,

Paixão des-conexa, des-virtuada,

À través ilusões do eterno, desvario das alegrias fúteis,

Devaneios das perquirições, indagações profusas,

Não posso mais fingir que nada observo,

Tudo me é de todo indiferente,

A indiferença é-me iníqua, inóspita,

Não posso ver-me empalidecer, secar, chorar,

Não posso, não posso!

Sine qua non colocar

Em causa a relação do homem consigo mesmo.

Sinto-me como se estivesse na Caldeira do Diabo.

Sinto náuseas,

Quero encerrar-me num claustro para sempre.

Creio que a minha intenção em estar escrevendo isto

É lavar tudo com água lustral oceânica,

Lavrar diamantes do vale de alguma prece.

Desejo desperdir-me; aquele aceno de mão irrevogável.

Não desejo que me retenha,

Diz-me respeito, escrito nas montanhas,

Mister isto patentear.

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Velha solidão,

Desde a revelação da vida no espanto do mundo,

Olho-a com uma angústia sem razão.

Mais velha do que o tempo!...

São indiferenças vazias,

A nulidade do pensar,

A inutilidade de perquirir fundamentos,

A ignorância que se não sabe ignorante.

#RIO DE JANEIRO(RJ), 24 DE OUTUBRO DE 2020, 10:06 a.m.#

 

 


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