#DÁDIVA DE ENRABAR AS MISÉRIAS DA ALMA# GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: SÁTIRA ====


Senhores e senhoras, probos doutores e personalidades e demais presentes neste Congresso de Psicanálise:

Vacas e ovelhas pastoreiam no eclipse de imagens inóspitas, sombrias, comem os grãos de trigo das paredes do vazio, bebem na bica do chafariz a água que lhes saciam a sede do nada. Que são as vacas e as ovelhas para os homens? Aquelas seguem os bois por todos os cantos e recantos, as ovelhas seguem o pastor? Isto de seguir é vergonhoso? Que tristes são os homens, considerados sem rumos e erregês. Senis vestidos de roupas largas, cores escalafobéticas rezam, debulham as contas do terço da morte próxima, sentados na porta do cinema, virgínias decepções do orgulho. O carteiro entrega o nada envelopado em mão do professor de Física Quântica, o açougueiro esvazia os bolsos entupigaitados de ócios do ofício.

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Amo de paixão o verbo que se conjuga com as ardências da rebeldia por denunciar o que de latente há nalma, o que de pecados e pecadilhos reside nas moléstias psíquicas, o que lá fora armazenado de sentimentos pujantes de ressentimentos, de tesões e libertinagens não sentidos e realizados acompanhados de breve estremecimento de prazer, presentes nas neuroses, de sua raiz gritam as insolências, rasgando as verdades, as irreverências, tecendo as maledicências da natureza humana.

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Oh, não julgai sento-me no rabo de minhas defecções, defectivando os prefixos das condutas alheias, sufixos das neuroses, pronunciando-lhes com veemência, sejam auscultados e ouvidos sem dúvidas, e jamais olvidados, simplesmente para envelar as desgraças da personalidade, caráter, um ato de justificativa.

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Afianço que não tenho rabo, não me fora dada a dádiva de enrabar as misérias da alma, as sombras sim residem-me, acompanham-me a cada passo, não seria sentando-me nelas que justificaria as razões de existirem. As sombras pertencem a cada um, quem pode vê-las ou senti-las? Quem deseja conhecê-las profundamente cabe apenas deitar-se no divã e matraquear suas indecências, o terapeuta, analista, psicólogo, psicanalista, seja quem for verbalizará até a verborreia mais íntima, aquela que concebe o desejo de enfiar a cabeça na terra, não a tirando mesmo que o diabo faça milagres, ou sair correndo sem olhar para trás.

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Vejo em todos os lugares, no teatro, e em tudo que está escrito nos textos, poemas, os gostos por todos os arrebatamentos e gestos descorteses da paixão, os descendentes terão uma selvageria genuína e não apenas uma selvageria com formas agressivas. Homem cursa sua própria escola de tormentos e privações físicas, sendo cruel até consigo próprio, e na prática voluntária da dor vê um meio necessário à sua sobrevivência.

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Sobre o Rabo das Defecções do Homem, assim concluo o meu breve discurso; se não satisfiz com todos os méritos o que esperáveis que professasse, é que não tenho rabo algum, mesmo que vós digais: "O eminente doutor é o que tem mais rabo defectivo."

#RIO DE JANEIRO(RJ), 23 DE OUTUBRO DE 2020, 06:02 a.m.#

 

 

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