#SONHA MAIS QUEM GARIMPA QUIMERAS# GRAÇA FONTIS: Pintura Manoel Ferreira Neto: PROSA



EPÍGRAFE:
"...no ver-so de sol pó-ente, na pá-lavra pó-esia uma página branca mina."
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A poesia é lança, posso atirá-la a uma distância tão grande nenhum espírito será capaz de sabê-la, é-lhe estabelecer difícil; é livre no silêncio de tambores e baterias, na pó-eira de terra batida nos pés, na lama cobrindo os sapatos, nesse rito de dores e fé adormecida, de sofrimentos e esperanças esquecidos, no pó-ema de terra ardente, no ver-so de sol pó-ente, na pá-lavra pó-esia uma página branca mina.
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Busco o sentido das coisas, da vida, estar-no-mundo, de ser-no-mundo, o outro de meu eu, o eu do outro, o significado das palavras ditas, não ditas, inter-ditas, e dos gestos feitos e não feitos pelos homens conhecidos ou desconhecidos, amados ou não amados, das atitudes sonhadas e não sonhadas, desejadas ou não desejadas, das esperanças ao acaso do tempo. Busco a sensação do prazer e da dor, o sentimento do belo e do sofrer por vivê-lo na carne, a emoção da crença e da descrença, a alma do uni-versal, e o espírito do verdadeiro belo, a carne do eterno e o verbo do efêmero, a língua da fé mística, a linguagem do misticismo, o estilo do amor platônico ou carnal; busco do riso a lágrima do desconhecido, da lágrima o sorriso do desconhecido, do certo ou do dúbio, do razoável ou ambíguo, do plausível ou paradoxal, eu busco a vida sublime ou plena, enfim eu busco o por quê de tudo, o por quê da busca é o tudo que busco na mutabilidade do tempo, na efemeridade dos minutos e segundos, na inconstância do dia e da noite, na inconsistência do real e da verdade, nesse uni-verso partido a cair sobre a minha cabeça.
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Poesia – sagrado enlevo puro, religião da humanidade inglória, a vida ganha alegria, surge mais uma esperança, sou lembrança e fantasia, ventura de viver. Ah, se essa rosa não fosse provisória, pudesse perfumar o mundo impuro. Sonha ventura quem no mundo insano, perdido nos domínios da angústia e desespero, semear pensa sentimento humano.
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Construo castelos, mansões, barracos e casebres com palavras, frases, sentenças e períodos, re-vestindo idéias, sentimentos, emoções, sonhos, utopias no espaço vazio do papel, no papel vazio do espaço, a sondar o terreiro da folha branca, a in-vestigar o baldio dos sonhos no terreno das ilusões e fantasias, a abrir valas do pó-ema a parir o filho-livro. Os longes e distantes de minha vida se misturam de saudade, amor, encontro e partida, promessa, espera e ansiedade. Não sei senão sonhar, sonhar com a águia vislumbrando do topo da montanha a manhã que se inicia, sonhar com o eterno na idade da cria, pois só a criatividade eterniza no tempo os versos e estrofes do espírito.
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Sou jegue de carroça a puxar a carroça da perdida humanidade desde as primevas ilusões do ser humano até as fantasias da história em busca do “ser” nas inconstâncias do tempo e espaço, nas inconsistências dos desejos e vontades da vida, nas dialéticas do ser e do não-ser; sou burro de carga, canga e viseira, engenheiro do uni-verso, operário a misturar o concreto-poema com o alicerce sonho-desejo, estilo-linguagem, forma-símbolo, a fincar pilares e radicais greco-latinos, sufixos latinos-gregos, bóia fria, candango de livro de por baixo do braço, na mão inerte na coxa com ele roçagando os pelos e a carne, a comer palavras, a buscar saciar-me a fome de sentidos e verdades.
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Poeta – arauto incensador da história, que sonha e ideal-iza por bons dias no futuro... É de poeta a idéia que busco, para fazer do ver-so a minha glória. Sonha mais quem garimpa quimeras e fantasias, quem graça e amor, saudade e desengano, melancolia e nostalgia, nas místicas idéias aprecia. Sonho paz e pó-esia, desejando sempre amar o mistério das raízes, o mistério de verdade. Meu canto, se con-templo a aurora e o crepúsculo de um mesmo dia, não tem sentido, não tenho lira ou viola, não sei dedilhar a harpa ou guitarra, sou um poeta perdido, não sou de nenhuma escola. Tenho no peito uma seta; dor pungente que persiste... Sou triste por ser Poeta ou poeta por ser triste?
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Por que escrevo? O que é isto – escrever? Escrever – é isto? Escrevo porque escrevo, e por não saber que fazer do tempo que ficou em aberto, da vida que desejei e não pude torná-la real e verdadeira, do amor que em mim habita e o espírito não pode superar a razão e o intelecto, e sou obrigado a insistir em procurar mostrá-lo através de palavras,a gestos e atitudes; e porque é também o único modo de supor e pré-supor a vida em aberto, o vazio que é a possibilidade do múltiplo, o múltiplo do vazio é a possibilidade do verso, o sonho do in-verso, a utopia do ad-verso, a fantasia do re-verso, a quimera do avesso. Poeta – graça por Deus concedida à humanidade, para os sentimentos seus mudarem todos em saudade do ser na continuidade do criar e na criação do contínuo. Quero cantar poesia, paz, amor, felicidade, graça, esperança e alegria, mas canto apenas saudade. Se em nada vejo beleza, se não consigo vislumbrar o belo, se não posso sentir o estético, se não mais sinto alegria, penso fugir da tristeza, quando faço poesia, quando crio espírito e sentimentos que elevam da contingência pura e dorida à transcendência reluzente e feliz.
“As palavras dos homens são efêmeras e passam ao mais leve vento, mas as de um poeta e escritor são eternas e nem o tempo as pode apagar”
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O que é isto – escrever? O que é isto – na pó-esia prosear, na prosa poetar? Escrever – é isto? Escrevo porque é onde in-vento as esperanças verdadeiras do belo uni-versal, crio o que desejei ser por inter-médio dos sofrimentos e dores, e a vida de veredas sinuosas e truncadas não me dera qualquer chance de sentir fundo e pró-fundo, re-crio a felicidade que sonhei na infância, quando descobri as letras eram a vida, eram a lança que podia lançar aos horizontes e infinitos e sentir a sua trajetória em busca do além de todos os finitos. Escrevo porque formo esse mundo bacarmatiano e transcendente na imanência cubana, passageira, esquecida, “cinzida”.
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Os poetas cantaram, compuseram poemas, idílios amorosos, elegias nostalgias, mas ficaram sepultadas no esquecimento as manchas negras da escravatura e os vazios brancos da miséria e da fome. Aprenderam religião pelas igrejas piedosas, místicas, ascéticas, jogando os joelhos por terra e suplicando “miserere” ao céu. Aprenderam beleza nas formas grotescas, confusas, rústicas e brutas.
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Escrevo para quem escrevo e não para me limitar, espoliar-me, e não para des-garrar esse cordão umbilical indubitavelmente preso, enraizado à essa chama acesa e em aberto. Escrevo porque escrevo e certo de que em algum lugar qualquer há de alguém estar dando um impulso e rolando nosso mundo incerto, perdido, confuso, desumano morro abaixo. Escrevo porque escrevo e não para que fique o não dito pelo dito ou um parêntese em aberto, mas porque é o que inda me resta a fazer livre, aberto (e a mim é o que me basta).
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No fundo, no fundo, vou embora para “Pasárgada” de Bandeira. Vou enveredar por sertões e veredas, ler Baudelaire em Francês, escrever minhas prosas re-versas em pó-emas nessa Gerais bucólica, buliçosa, de Dirceus, Marilias e Gonçalves. No fundo, no fundo, vou embora para “Pasárgada” de Manuel Bandeira. Porque aqui sou poeta-prosador, desconhecido, de vanguardas, fazendo poesia sem rima, verso branco nessa Minas de provincianas Gerais. Vou embora para “Pasárgada” de Manuel Bandeira.
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Escrevo não por mero passatempo – o tempo não passa por mero escrever ou por escrever os meros sentidos que me satisfazem nos minutos do ser nostálgico e melancólico – que ficou em aberto, mas por sentir na carne, no ego indeciso do eu indecifrável, corrupto, marginal, nesse grito preso, engasgado na garganta, no olhar envelado de sombras as estrelas brilhantes que figuram no céu distante de todos os horizontes, ainda em aberto. Escrevo por uma liberdade aparente que ficou em aberto, e sinto ímpetos de segui-la por todas as veredas por onde passar e por todos os caminhos por onde trilhar em busca do eterno e da eterna criatividade do ser.
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Ando de olheiras de procurar poeticamente dias e noites adentro nos bares da cidade sem poetas, artistas, escritores, boêmios vadios, operários vadios, operários do nada (que é tudo no vazio) e no entra-e-sai de prostitutas e bichas deslumbradas. Ando angustiado de catar pó-ema-ticamente solidões e medos pelas ruas e becos, alamedas e avenidas, carentes no ver amargo os horizontes nos olhos vermelhos da insônia de ontens anteriores a quaisquer outros, desejando avidamente a esperança e a fé de outras luzes à soleira dos subterrâneos, e só encontrando loucos de poder e glória, de conforto.
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Amo deveras, mas não posso amar nem proclamar meu amor, amor louco, alucinado, desvairado, reprimido. Sou apenas instrumento, eu vim para lutar inda mesmo que meu sangue escorra em lágrimas, escorrendo em lágrimas de amor, lacerando minhas veias no combate da hipocrisia, da falsidade, da farsa, guerreando pelo bem, por justiça demandando. Sou apenas instrumento, vim para lutar pelo povo que me fita perguntando por meu sim, pelos meus versos e prosas de paz, misericórdia, solidariedade, de alegria e felicidade, de amor e esperança, esse povo que em mim busca seu Deus, sua eternidade, seu paraíso celestial, e que sem mim fica ateu, desesperançado, inglório e perdido, morrendo dia a dia à mercê das realidades e razões retas e certas. A vocação tem natureza individual, é dom particular, carisma que é só meu e está em mim, mas não pode concentrar-se no bem próprio, pois há de trabalhar na promoção da justiça e amor comuns. Não posso emudecer os clamores do meu povo que reclama novas esperanças, nova fé, um mundo em absoluto re-(n)-“ov”-ado.
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Pó-esia anda de automóvel derrapando nas curvas...
#RIO DE JANEIRO, 21 DE MARÇO DE 2020, 23:34 p.m.#

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