CRÍTICA LITERÁRIA POETISA E ESCRITORA Ana Júlia Machado ANALISA E INTERPRETA A SÁTIRA #Nadica de Nada#




Nesta sátira/ heterónimo do escritor Manoel Ferreira Neto “*NADICA DE NADA*onde intitula-se como o Quinzinho de Parafusos a Menos, é sem dúvida uma crítica à sociedade, quem somos, do que habita por si e por si…está aqui patente a intenção de refazer uma trajetória do malandro, personagem-tipo comum em diversas acções de um dramaturgo, com a intenção de elucidar um pouco mais os comportamentos harmoniosos abrangidos no feito do autor.
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A eleição do parasita, ao mesmo tempo que está a facultar e acrescentar a erudição (pessoal e profissional) nas mais distintas áreas das ciências humanas. Até a Primeira Guerra, aguçou-se (não sem padecimento) o raciocínio analítico quanto à aplicação dos cognomes dados, ou impostos, nas mais distintas forças sociopolíticas e científicas. Afastar o facto cortês do artístico igualmente se apresentou um repto ao trabalho, assim como diferenciar as discrepantes revelações harmoniosas de tal personagem, seja na melodia, no teatro ou no romance, a fim de elaborar a pequena análise e parâmetros para perceber esta personagem.
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À medida que vou lendo, analiso que mesmo aqui o malandro não se deixa amarrar, ora é o miserável, ora o fanfarrão, ora o libertino, e por aí vai. Tão-pouco seu papel, nos fragmentos eleitos, é exclusividade do grupo masculino, de destinada categoria social, ou etnia. Homens e mulheres, ricos ou pobres, brancos ou mulatos combinam a ampla tribuna de Quinzinhos emersos no escrito do autor. E apesar de, na sociedade, o malandro seja um infortúnio, pois deteriora, propositadamente ou não, alguém, sua récita artística possibilitará à coletividade deleitar-se, ainda que por pouco tempo, o sabor da independência, da infracção, da bravura, do triunfo do débil / versus o forte, de chacotear dos possantes, de cobiçar à vontade, sem ter que comprometer-se. O auditor detém-se do lado do falacioso não porque o povo aplauda o engodo, mas porque o defraudado é bobo, medíocre, pouco espevito e coloca-se a jeito para ser ser burlado visto que o essencial resultado da malandragem é subir seja a que custo for alguém, o teatrólogo não desvendará complicações em criar pessoas susceptíveis de serem atraiçoadas, a sociedade e os valores atuais tudo possibilita Aliás a conclusão que tirarmos do dia-a-dia, quanto mais a plebe sente-se abandonada, marginalizada, degredada dos planos ministeriais e maltratado nos seus direitos ínfimos, mais essencial é a aparência do Quinzinho dos Parafusos. Sempre habilitado a executar o ofício de, pelo rir, acalmar, suspender, a circulação do engenho de ruminar sensualidade em que muitas ocasiões se alteram no mundo real.
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Será papel do escritor nesse caso, graças a sua fina competência de análise e sensação (acedida por Hermes, criador do intercurso, quiçá), reproduzir essa figura e pô-la em circulação, o Quinzinho é um grande pensador que entoa, baila, habita o instante e regozija-se. Deambula e vai do Rejo da imaginação ao mais modesto pardieiro, encontra-se acompanhado ou acossado por mulheres, arremessa-se. Nem sempre se dá bem, mas, enquanto resistir a encenação, interpreta, e bem, o seu papel.
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E seu fecho não deixa de ser o quão bem representa este papel- remição, na eventualidade mesma residirei saboreando o paladar das sensualidades da independência e do discernimento.
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Como sempre deixo para o escritor a liberdade de fazer com o comentário o que bem entender. Pois fico com a sensação que algo falta ou não condiz com o que o escritor redigiu e sua ideia.
Ana Júlia Machado
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De excelência a sua análise e interpretação, Aninha Júlia. Condizente com a obra, com o seu interdito, Ópera do Malandro, de Chico Buarque de Hollanda, a minha inspiração. E Quinzinho de Parafusos a Menos é o malandro pensador da quotidianidade das coisas e do mundo. Um malandro na minha obra tinha de haver, pois que sátiro de condutas e posturas morais e éticas satirizando o mundo e a sociedade sugere um pequeno burguês, tirando o corpo fora de suas traquinices pequeno burguesas, mas um malandro, aí sim, vira o mundo de cabeça para baixo, toca a alma dos homens e da sociedade, donde já se viu um "malandro" criticar a normalidade das coisas humanas. Com este texto, descobri que a sátira dos marginais adentra tanto na alma dos homens, da sociedade que a corrói ipsis litteris. E são eles que tem a chave para a consciência da viperinidade da humanidade. Seria mesmo que Quinzinho tenha parafusos a menos? Não. Tem parafusos muito a mais.
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Parabéns pela análise percuciente, aliás de sua maestria como crítica literária. Beijos nossos a você e à nossa netinha Aninha Ricardo.
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**NADICA DE NADA**
GRAÇA FONTIS: PINTURA
Quinzinho de Parafusos a Menos: SÁTIRA
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Engolir o nada inteiro, mesmo mastigando bem, é difícil: pode ficar atravessado na garganta e levar a egregíssima pessoa à morte, pode ser indigesto, causando indesejável diarréia, daquelas que é melhor ficar sentado no vaso o dia inteiro, gritando alguém: "Traz um gole de café para mim!" ou "Traz o meu suquinho de jenipapo". Então, como o nada é delicioso, só de falar nele a boca fica saturada, o aconselhável é comê-lo às nadicas, pedacitos pequeninos, sente-se-lhe o gostinho, um primor. Nadica de nada à passarinho com um aperitivo faz-se necessária a moderação.
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Não é só comestível o nada, a nadica de nada, serve a outros propósitos sutis e são mais que recomendáveis para a vida fresca e saudável.
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Nadica de palavras para dizer o que se pensa e sente, não um resumo, não uma economia, não uma síntese, mas a essência, mais ou menos o "dizer na lata" dos paulistas e paulistanos.
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Palavras à nadica de nada frontalmente é pior que o sacratíssimo sapo seco na garganta por sempre, jamais se terá resposta, a nadica obstrui os neurônios, necrosa os miolos e o cidadão por toda a eternidade ficará con-templando ao léu do vazio a imbeciloidia. Deus me livre de palavras à nadica.
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Nadica de preconceitos, discriminações... Conforme forem eles a Lei bate com o martelo, ver-se-á o sol nascer quadrado, as estrelas convexas e côncavas. Mas preconceitos e discriminações à nadica, dose a dose, côdea a côdea, soma o absoluto da verdade, e nem Deus vai negar: de bago em bago enche-se o papo.
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Nadica de preceitos morais e éticos: o bem não vence o mal, o mal não é vencido pelo bem, o eterno é a redenção das contingências, o efêmero é a ressurreição das náuseas e vazios, nossa, a vida no mundo e no além é a plenitude do tempo, de trigo em trigo, de joio em joio, a bestialidade dos conceitos e definições se fazem presentes, presentificam-se nas frestas do vazio das nadicas do nada, do nada de nadicas.
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Nadica de valores eternos, do absoluto das verdades imortais, temperada com sal grosso, pimenta malagueta, se se quiser, pimenta do capeta, limão galego, desperta e alimenta os instintos do coice afiado para as hipocrisias e simulações, só a sombra delas, ainda que furtiva, já leva um tão, tão bem dado que atravessa todas as fronteiras do inferno, indo parar nas terras serenas do "PQP". Aconselha-se o temperado moderado porque as orelhas da pessoa podem ficar em pé, tempestade de vento não as abana mais.
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Nadica de poemas de amor endereçados à amada, sem revelar o nome do remetente, acelera-lhe o coração, faz-lhe sentir aquele frenesi na libido, só lhe restando ler as obras de Apuleio ou as do satírico Manoel Ferreira, para o clímax perpétuo.
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Nadica de solidariedade, com tempero à moda gaúcha de churrasco, de maledicências, farsas, dissimulações, é asseverar com garantia e segurança, depois do Juízo Final, frente ao eminentíssimo São Pedro, refestelar na sombra da Árvore Proibida, antes de ir para as prefundas do inferno, o paraíso celestial é apenas baldeação.
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Nadica de taradice, temperada a molho pardo de frango ou galo velho, canela de perdiz de preferência, faz a vítima do estupro gozar de paixão e êxtase, a violência é fissura do capeta por estar no lugar do tarado. Aconselha-se ao tarado colocar meia xícara de açúcar no molho pardo ou na canela de perdiz, caso contrário jamais, em tempo algum, sua "coisinha" se erejerá... De tarado a viado o limite é ínfimo, num átimo de segundo a ruela gira.
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Nadica de analfabetismo, daquela que conjuga o verbo Ser sempre no "era" deixa de ser imperfeita, torna-se perfeita, se o analfabeto entrega-se de corpo e alma a comer e degustar as salsinhas da estupidez, aquela que sintetiza o desejo incólume, insofismável da essência do nada da inteligência e sensibilidade e o absoluto das verdades.
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Nadica de nada - leitura não assídua, pois que o risco de nadicar pilhérias, mangofas, sátiras, sarcasmos, ironias, cinismos, assim isentando-se por completo da consciência de que o mundo e as coisas são risíveis, dizem haver sido castigo de Zeus por o considerarmos o deus dos despautérios, e nadica de nada é o manifesto da humanidade em prol da liberdade e da fissura por criar o mundo - existe e sempre existirá, mesmo que o Tempo seja abolido, o futuro é para a frente e para trás e para os lados.
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Nadica de quem sou, de quem vive de mim e por mim, só no nada do efêmero; vazio, náusea do ser e não-ser satisfazem o meu apetite do eterno, ressurreição, redenção, na contingência mesma estarei degustando o sabor das concupiscências da liberdade e do livre-arbítrio.
#RIODEJANEIRO, 06 DE MARÇO DE 2020#

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