FERLUCI SURGE DO CÉU GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: PROSA




Acaso está a tratar-me como idiota, imbecil? Estou a enganar o que sinto íntimo e forte? Não é o que consta no pasquim, digo-vos com categoria, como alguém quem descera os degraus empurrando com a mão direita abaixo um indivíduo sem caráter. Estava-lhe a expulsar de seu local de responsabilidades e deveres.
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Antes de tudo, digo-vos que se esqueceram da língua e linguagem, estilo e utopia de dizer o que vai dentro. As palavras não podem negar, em que nível de questionamento, dimensão possa intuir, nada há a negligenciar a verdade de que no íntimo, quimera ou fuga, não importa, os sentimentos coincidem com as alegrias, antes das tempestades, de quaisquer invernos. Isto é o que não entendem, imaginam, questionam, não sabendo como acolher estas palavras nos espíritos sedentos, estas metáforas, sombras, ácidos críticos, leite antes derramado em taças de cristais. Gelado, alimentar o desejo de dormir, conciliar o sono de imediato.
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O que indago de mim é a verdade das imagens que construo no espírito, expressar vontade de ir além, desconhecer limites à compreensão humana. O estilo encantar de modo que cada um viva lembranças e desejos esquecidos na curva do tempo, de todas as ilusões que se revelam no espírito, esvaecem-se, torne-o a busca radical, entregando-se inteiro...
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Esqueceram-se todos de que as imagens se me revelam súbitas e sou quem necessito de as revelar, tendo, às vezes, de desconsiderar o tempo, tornando isto imagem guardada a sete chaves, algo que se aproxima e se distancia num piscar de olhos. Tudo são desejos que me surgem no íntimo, nada resta.
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Vêm-me ao espírito a engenhosidade e arte, mesmo que intuições, transformando em utopias, essas verdades que são encontradas nas viradas de esquinas e subidas meditamos e queremos, custe o que custar, sejam nossas verdades...
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Não entendem estas imagens, esqueceram-se de as palavras revelarem delícia e questionamentos! Não nos esqueçamos o amor pela fonte de esperanças nas gotas que deslizam no vidro da janela; não nos esqueçamos as dores nos habita e nos causa esquecimentos, lembranças...
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Aí, será que ninguém é capaz de entender estou encostado na amurada da sacada da residência, no céu a imagem de Lúcifer, desenhada nas nuvens azuis, escuras, claras, nesta tarde de início do ano, este que esperamos tanto ultrapasse as nossas expectativas de sucessos e amores contidos no peito, sedentos de carinho e compreensão.
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Lúcifer surge do céu.
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Herege. Ateu. Palavras facilmente pronunciadas pelas línguas que expressam a alma humana, desconsiderando haver segredos nela só Deus mesmo compreende e entende, perdoa com carinho e compaixão, antes mesmo de solidariedade. De imediato, a verdade absoluta. Nada há que consiga mostrar a imagem expressa no céu, Lúcifer surge do céu...
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Engraçado: não compreendo o que nas entrelinhas poderia significar esta ironia, surgida no espírito, tornando-a algo que contemplarei por longos anos até que a defina em letras e sílabas separadas. Isto o que me vai no espírito, dentro vou alimentando os frutos da semente que venho regando ao longo dos minutos e segundos, desejando surja das origens das terras Deus. Não podia. Deixo-me seguir a imagem que vou delineando a partir das transformações feitas no toque dos ventos e frios de algum lugar perdido nos confins, além de qualquer indício de quimeras. Tudo isto que nos vai surgindo no espírito. Sinto o sussurro de silêncio no per-curso das águas que seguem as vias e alamedas à busca da completude. Sigo viagem, passageiro que sou, viajante da ressurreição.
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Se carrego Deus no espírito, a minha cruz à busca da redenção, creio isto ser questão irrevelante, embora a nossa verdade, o que importa é estar assistindo imagens se revelando aquém de aléns, em nosso espírito, alma, corpo. Deus? O que importa a Deus se rompemos limites, e tudo o que dizia respeito era nos confundir com prazer a luz que nos ilumina o berço de origens simples, à porta de casa, olhando as estrelas, sabendo-as distantes, impossíveis de serem tocadas, sentidas na carne e pele, isto após os ossos que nunca emagrecem...
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Esqueceram-se de sentir a poesia de sons, imagens, visões de realidade outra além desta continuidade de idiotias, esta realidade que nos torna quem somos à luz de que Deus surge dos céus, a Bíblia mostra a todo custo, através da sabedoria e inteligência de intuição e imagem única, invisível, os segredos de realizações, felicidades, e todos os sofrimentos e dores no mundo, o nó górdio, corrente, algema a tolherem-nos a liberdade de continuar criando e desejando a realidade nos satisfaça a sede de tocar-nos além do que possa compreender, e isto é a sabedoria de entender-nos.
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Ninguém entende. O que posso dizer, então? Nada me sobra senão que a continuidade de me transcender, até me perder com a completa inteligibilidade das imagens, aí sim terei atingido à sorrelfa os minutos de felicidade e prazer, dimensões difíceis de abraço, pois que se deslizam entre fugas, justificativas, medos, e sou um ser que cumpre destino determinado e projetado, escravo de linguagens e estilos, isto unido ao processo histórico, existencial, e em todas as dimensões serão ainda reveladas.
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Se não soube acentuar as palavras antes, transcendo-me, o encanto com o registro, linguagem erudita e clássica, difíceis de serem intuídas, num piscar de olhos, enquanto a imagem no céu revela claridade onde antes era apenas sombra obscura, despertando desejos e sonhos esquecidos desde há muito e tudo o que resta é o silêncio absoluto, nada mais a ser revelado.
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Não me entendem. O que isto importa, se a caravana segue caminho, não sabendo por onde irá passar, se haverá pequenos buracos a fazê-la balançar, se em ritmo lento, enquanto no campo vou contemplando as imagens da natureza que se revela nas folhas verdes de árvores ao longo do vale, da chapada. Imagens, e tudo o mais, não importando o que passou, nalgum sítio se mostrarão nítidas, e tudo são outras esperanças a se manifestarem ao longo do caminho perseguido...
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O que fazer então, se ninguém pode entender o que vou deixando nítido e nulo, aos meus olhos e compreensão, sabendo serem o que alimento no espírito, resta-me a esperança de que no decorrer dos anos e do processo histórico as intuições e sensibilidade mostrem isto que ora sinto, sendo difícil de vislumbrar, Lúcifer surge do céu, Deus surge das origens da terra.
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Paradoxo. Duas imagens que se opõem desde a eternidade, nada há que possa aproximá-las, contradições radicais, característica de homens portadores de neuroses profundas e irreversíveis, e o que lhes resta é ser quem são.
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Mas não é assim que alguns homens se sentem em horas de estarem a refletir, a partir da imagem surgida no céu, Lúcifer, alimentando os famintos e sedentos, e Deus surgindo das profundezas dos abismos. Inversões radicais. Ninguém isto pode entender, mas não há espécie de parábola dos tempos em que vivemos, in-versos, dos nossos anseios e aspirações ao léu deixados!...
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Digo de buscas íntimas, do leite ao ácido crítico, deixando o doutor, o intelectual, o imbecil, analfabeto, com a tampa da caneta tocando os lábios, enquanto garatuja um bilhete a quem de sua amizade e interesse dirigindo-se. O que lhe dizer só o tempo revelará, pois que me surgira, após imagem resplandecida no céu, Lúcifer, deixando-me a liberdade ou escravidão de tudo desconsiderar, não mais lendo única palavra disto que lhe escrevo com orgulho e parcimônia diante da efemeridade do eterno e imediato.


#RIO DE JANEIRO, 23 DE MARÇO DE 2020, 19:53 p.m.#

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