GRAÇA FONTIS PINTORA ESCRITORA E CRÍTICA LITERÁRIA POEMATIZA O AFORISMO #O QUE É ISTO - SEM INSPIRAÇÃO# ----




SOB LUMIAR


Mas há um lume, não apaga
Quando as palavras oscilam
No espaço ainda sem destino
Dourando desejos e ânsia
Nas trevas rochosas que entrava
O chamado da "tão-só-intuição"
Pré-sentida no amor e...
No canto martirizado da guitarra
Com ou sem riscos ao descerro
No conforto régio da fina pena
Ao relacionar ironias, tédio, dever servil
No corpo exultante, irrefreável emoção
Retido no escrínio escuro, lateja e atina
Com cara soberana, gozo e riso
No recurso do refutável, risca o indesejado
Altivo, desincorporado das curvas duvidosas
E do peso da carência que adultera
A penderem do "Eu" imaginário em desrazão
Ao encontro do nunca vira
Em vã identificação do inusitado
Ditos claros de límpida expressão
Editados no regalo da solidão servente
D'onde mais as lembranças escorrem
E a mente transigeia instantâneas
Às ínfimas teias que tecem
Dentre tênue lumiar, efemeridades
Da magia dos elementos
Compostos em exposição
Aos ventos contingenciais sem dimensão
Na cumplidade do espírito passivo
Prestes a vazar em voo a imobilidade
Ou... lentidão, como a do broto para hastes
Das hastes às rosas fascinantes
A desabrocharem num repente
Com a luminosidade ofuscante do sol
Aquecedor de ásperos e úmidos pântanos
Cominando com esplendor a sintetização
Das cores, luzes... poesia!
Humos para o "Poeta, de ontem
De hoje em constante cintilâcia
Mesmo incompreendido!
GRAÇA FONTIS
Rio de Janeiro, 26/08/2019
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O QUE É ISTO - SEM INSPIRAÇÃO?#
GRAÇA FONTIS: PINTURA
Manoel Ferreira Neto: AFORISMO
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Não importa a dimensão contingencial de um momento; importa sim o que se é possível realizar com ela. Momento assim revolucionou as ciências, as artes; momento assim deu origem a obras-primas na Literatura, na Poesia; momento assim espiritualizou alguns homens. Assim, esse momento, qual seja, de medo, angústia, tristeza, depressão, desconsolo, solidão, é necessário, faz a diferença, são pedras de toque do novo, da re-novação, da in-ovação. Todos os homens vivemos à busca da felicidade, entregamo-nos plenos e inteiros a este desejo, vontade, e a felicidade não concebe fruto algum, não dá origem à revolução nas ciências, nas artes, obras primas não vem à luz... Viver as contingências é a luz, é o arco-íris, são os raios numinosos do sol.
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Eram de ontem e de sempre os impactos de amor, brincos de palavras suspensos nas orelhas, verbo impuro e antipático conjugando a meiguice elástica dos abraços, vagos dons das constelações, vazios talentos reintegrando o eidos poético da alma con-templando os hiatos das memórias, a essência do poeta mais senil que a existência que existiu, a vida que vivenciou - eram de ontem e de sempre as pétalas das rosas vermelhas e lilases a atormentarem-me, provocarem-me à síntese das flores e da luz....
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Quão difíceis são estes estados de alma, medo, angústia, tristeza, depressão, desconsolo, solidão. Há quem não consiga conviver com eles, suportá-los, aproveitá-los como húmus de outros tempos, entregam-se, sucumbem.
E todos estamos sujeitos a este momento contingencial. Jamais pensara fosse acontecer comigo, nó górdio na garganta, o coração pulsando descompassado, o olhar perdido na distância, irritação, nervosismo.
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Eram de ontem e de sempre o som de minha pena a deslizar no papel, perturbar-me por vir com evidência o bico de minha pena ser a neblina que cobre a montanha, a ambiguidade difusa entre mim e o que penso, todo o bosque me re-colhendo através da minha mão nítida e transparente, a eterna ampulheta da existência ser virada e revirada - e eu com ela, meu grão de pó, a disposição que tenho para ficar bem comigo e com a vida, para não desejar, ansiar, aspirar com mais fervor do que a suprema confirmação e selo eterno...
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Mais do que acostumado com a inspiração presente sempre, até a iluminação pres-ent-ificada, criando, criando, criando, compulsivamente, por vezes acordando com textos ou poemas na cabeça por serem realizados... Vem o momento inesperado de nada estar produzindo, criando. Antes, se projetava algo a ser escrito, não era possível única letra, era sentar e escrever, improvisadamente. E, neste momento, para amenizar as dores e sofrências, experimentando projetar algum poema ou texto, mas o que surge de idéia, de inspiração é acompanhado: "Não vou dar conta do recado. Prefiro a pena sobre a mesa do que porcaria numa ou algumas páginas".
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Talvez o momento tenha origem: não estar satisfeito com as criações, desejando outros voos, outras luzes - mas nenhum indício de re-novação se revela, o resultado sendo "empacar", e no lugar do que não agradava, não satisfazia, dava náusea, a presença de um vazio sem limites e fronteiras. Outras explicações, outras razões para não estar produzindo coisa alguma. Num momento assim nada adianta ficar escarafunchando as coisas à busca de motivos, razões. Não se lhes encontra, o criar torna-se ainda mais complicado. Notoriamente situação de Sísifo: jamais resposta será encontrada, a fertilidade da imaginação criando coisas. Só uma solução: deixar as pedras rolarem montanha a baixo. Nalgum instante o retorno à produção, à criação, e até de modo diferente, satisfazendo e felicitando mais. Aquelas razões desejadas para superar o momento não importam mais, não possuem mais qualquer validades. Infantilidade procurar razões para as coisas que acontecem, no movimento das contingências é que são superadas suprassumidas.
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Eram de ontem e de sempre os olhares perdidos, as línguas que compõem os sentidos dos vernáculos litteris dos sentimentos de alegria, contentamento, angústias, do nada e do vazio que caminham de mãos entrelaçadas pelas veredas da vida que artificia o destino, a liberdade e a consciência de esta vida ser um sítio numa ilha onde reside alma sensível, haver um barco que me transporte para onde eu nada deseje que não o veja, uma canoa que me leve de Itaoca a Paquetá logo ao amanhecer - eram de ontem e de sempre as cortinas se abrirem devagar, devagarinho, quase parando, luzes, cenários, o proscênio estendendo a visão do espectáculo, eram de ontem e de sempre, os amantes se abraçarem, beijarem-se, desejarem boa noite entre si, "Amo você", dito com o coração, o sono, os sonhos...
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Sentei-me à mesinha de trabalho determinado a escrever, mesmo que tivesse de queimar todos os neurônios, espremer os miolos, arrancar tufos de cabelos na calvície, mas um texto escrito. Engraçado, muito engraçado: não parei um segundo para pensar, refletir, meditar, à mercê do fluxo de idéias, pensamentos, sentimentos e emoções.
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Agora pouco me importa se este texto seja renovação, inovação, aprofunda as minhas coisinhas, é novo tempo que começa, é obra-prima, está revolucionando tudo o que antes fora escrito. Isto é ninharia para mim.
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O importante é que o texto está escrito.
#riodejaneiro#, 24 de agosto de 2019#

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