**PLEONASTICAMENTE O PATENTEAR CRÍTICO NAVEGA PRECISO A ESSÊNCIA DAS EMOÇÕES, EXPURGA/EXPLANA PARADOXOS EXISTENCIAIS** - TÍTULO E PINTURA: Graça Fontis/PROSA POÉTICA: Manoel Ferreira Neto


Não havia ainda pensado e sentido o que iria registrar nas laudas, preenchendo-lhes os vazios, tecendo-lhes as redes com os fios do sido, e toda a prevenção se converteu em simpatia. Continuo a saborear as atitudes quase implorativas, rogativas, um composto de atos e sentimento, de atitudes e emoções, de entregas e harmonias, de intuições e inteligência, de chantagens e perjúrios, de contemplações e sabedorias. Desde toda a eternidade sobrevoando os horizontes todos, de todos os tempos, assim me vejo, não há possibilidade de olvidar os homens são águas que passam, e os silêncios que sussurram e cochicham não são outra coisa, e o que dizer no tangente à solidão de mãos entrelaçadas às utopias, seria que fossem águas que passam?
Costumo exagerar as coisas, movido pela paixão desvairada, pelos medos, inseguranças, indecisões, fugas; pode não ser tanto, ser adorado como um deus, e adorado ao estilo do Evangelho. Se me perguntarem o que teria acontecido para que eu reconheça que há exagero nesta afirmação, descendo do Olimpo, não saberia responder em hipótese alguma, e diria até que não tive qualquer intenção de não continuar com toda esta pretensão, empáfia, embófia.
Adorado como ninguém? Sim, adorado como ninguém. De que modo soube que era eu? Tenho falado comigo muitas vezes, e jamais descubro nada. Há que imaginar nunca que as dis-córdias entre mim e eu próprio sejam tão paradoxais em nível de estabelecer alguma antipatia, mas são conversas sérias e sinceras, e no frigir dos ovos rimo-nos por desperdícios de palavras para mostrar exclusivisticamente as contradições e nonsenses.
Achei-me sempre frio nisto de descobrir a verdade atrás da vida que decidi por ela, olho-a de esguelha, quem sabe o espírito maligno que reside em mim e sempre mostra a melancolia da paisagem seja o único responsável por nada descobrir atrás da vida que escolhi, prefiro deixar as situações surgirem espontaneamente, não desenho ao longe a sua fisionomia, não elenco ornamentos e arrebiques para seduzir com falácias da falta do ser, de forclusions.
Águas descem a originária rua direita, em direção às nostalgias e esquecimentos de tempos que envelhecem, morrem. Se renascessem das cinzas, tornassem outros, em cujas alamedas, becos mostrassem a beleza, dignidade! Buscassem palavras a expressar, ao sabor de esperanças, desejos íntimos de corações selvagens, rebeldes e solitários, de mentes humildes e sinceras. Se... Mas não.
Se os olhos adquiriram a destreza de lerem as diferenças, refiro-me à posição das vírgulas, que seguem à esquerda das intenções e interesses, podem, com certeza, perceber que, no comenos das emoções, a respiração segue ritmos perdidos nas espiras do tempo que só identificam as estratégias e tragédias, incidentes a serem utilizados, manuseados para complicar as perspectivas, embaralhar os dispositivos - quem sabe o desejo seja, de antemão e revezes, conservar o mistério que habita no íntimo, espírito, encobrir as correntes-algemas que identificam a essência da realidade humana.
O mistério identifica a pré-sença de insignes senhores quem sustentam a personalidade e caráter alienistas.
Se levassem as águas não só o lixo, sujeira deixados nas ruas pelos transeuntes, não importando se nativo ou turista, mas também interesses espúrios e ideologias chinfrins, substância de mentes retrógradas, as pedras reluziriam ao toque dos primeiros raios de sol surgidos após a chuva. As pedras, limpas; de por baixo delas, os detritos nauseabundos, acumulados ao longo dos séculos e milênios, permanecem nítidos a olhos cegos ou fechados.
Se a plenitude da alma não se derramasse em abundância, às vezes, nas mais vazias metáforas, pois que ninguém pode dar medida exata às próprias urgências, definições ou sofrimentos, e já que a palavra é o “dedilhar a lira nos momentos em que analisa a essência dos seres e das coisas em torno de si”, quando antes deseja enternecer as estrelas, as outras existências, por mais insípidas que fossem, teriam, pelo menos, a possibilidade do inesperado, inusitado, excêntrico.
Aventuras trazem consigo peripécias sem fim, o cenário, paisagem transformam-se.
Pensar, como quem sobe ou desce a originária rua direita, é pensar um caminho, é pisa-lo e senti-lo por baixo dos pés, “sentir-lo” interiorizando-se em cada esperança.
Ver nosso próprio nome figurando na estante de livros a serem vendidos, na livraria à esquerda da originária rua direita, é provação tão dura que forçosamente deve implicar algumas angústias percucientes, desesperos íntimos aos olhares perquiridores da capa.
Denomino objetivo quem se propõe temas, sem jamais se colocar como assunto da obra. Mas a coeva cólera, no sentido de confundir a sua personalidade com o tema escolhido, não saberia admitir esta relativa liberdade. Assim, encontra modo e estilo de desferir fúrias e cóleras, analisando ao seu bel prazer, condenando ao desconhecimento.
Que tenho feito senão argumentar sobre uma intuição encontrada pelas ruas de meu tempo, necessariamente pela originária rua direita. Não desferem fúrias e cóleras em nome dos Valores, mas de seus interesses. Disse-o. Quanta vez?
O turista, ainda jovem, observará que as mulheres são lindas; ainda maduro ou idoso, as arquiteturas, originais e maravilhosas. O melhor lugar para verificar é a sacada do restaurante Casa Velha, com a condição de ali se deixar ficar algum tempo, numa noite de sábado, acotovelado no corrimão da sacada. Conversando com alguém, ouvirá que os limites todos devem ser transpostos, quem não o fizer será impiedosamente golpeado, quem sabe até exposto aos olhares de quem passa, numa gaiola, indo embora para casa, na originária rua direita. Nada existe na história atual que diga os limites podem ser transpostos, ao contrário, nenhum limite pode sê-lo, e quem ousar fazê-lo, com efeito, será expurgado, ou no mínimo convidado a não transitar pela originária rua direita, a não habitar a cidade. Colocar suas atitudes e ações na algibeira, seguindo para outras terras.
Essas palavras críticas ou encomiásticas, quem pode definir numa perspectiva ou noutra, sem se enganar quanto ao estilo, necessitando investigar a linguagem, deixá-la expressar-se livremente, são como se as tivesse apanhado em flagrante delito, atravessando a originária rua direita, com uma confissão arrancada por hábil subterfúgio. Sinto-me tomado por brusco, rápido movimento de cólera, dizendo: “Confundo desejos com a realidade”.
Desisto dos encômios, das críticas, que são modo disfarçado de agradar aos amigos, desagradar outros, transeuntes nativos ou não, alguém que ama, à noite, à porta do Museu, da sacada da Casa Velha, olhar as luzes ofuscadas que iluminam a originária rua direita, pondo-me a representar o homem duro e frio quem, em suas relações com os homens, acentua os aspectos mais viris da originária rua direita: esperança, cinismo.
O pior é que a admiro por suas luzes, à noite, mais do que a amo. Sinto que tem realidade apenas dentro dos limites da fidelidade e da pureza de tradições e puritanismos, e que, alguém, transeunte ou turista deixa-se ofuscar diante da beleza. A originária rua direita deixa de ser ela mesma assim como a água fá-lo a partir do ponto de ebulição. Atravessando-a, sinto crescer a multiplicidade de sentimentos, dubiedade, ambigüidade; isto de encômio e crítica num só lance de vozes é ainda condescendência, um espírito receoso de repressões.
A felicidade vem da ausência de unidade, saber se é encômio ou critica a quem ama trocar um dedo de prosa à porta da Livraria, da Papelaria, Sapatarias, colocar em dia as últimas novidades, na escadaria da igreja, do antigo cinema. Vivendo o espírito do mistério próximo da felicidade, estou pleno de desejos de saber o que, em verdade, dizer; a realidade de transeunte quem sou dá-me liberdade de suspender juízos, referindo-me à originária rua direita.
As duas imagens, de encômio e de crítica, superpostas, revelam-se transparentes, uma embaixo da outra, e compreendo que a diferença entre é superficial; que, no mais profundo do ser, com todos os sentimentos, vícios possíveis, o que justificam as dúvidas, o que explica o transeunte, quem, sob inspiração, busca dizer algo a respeito da originária rua direita, intuo a necessidade de percuciência.
Se pudesse haver um ato, um ato que me desse foros de cidadania com quem atravessa a originária rua direita?! Se me pudesse apoderar, nem que fosse com palavra dúbia, ambígua, polêmica, das suas memórias, esquecimentos e esperanças, para encher o vazio do coração, ainda que tivesse de me envolver com a insatisfação de todos por me dirigir à originária rua direita sem haver intuído, in-vestigado o porque de assim se chamar, de ser reconhecida deste modo, poder-se-ia dizer reconheço identidades e maravilhas.
Quem sabe seja uma explicação de assumir este lado de minha personalidade, caráter, psíquico, o exagero, movido pela paixão desvairada, dizendo que isto de ser adorado como um deus é um exagero, diria ser adorado como ninguém. Não é intenção esmiuçar o fato de descer do Olimpo. Saboreio as entregas e doações, atos e sentimentos que são a apoteose do homem. Em que aposento se fecha para rezar, para evocar a felicidade, a harmonia, a paz, senão num escritório, isto se referindo à minha função, aos dons que me foram doados gratuitamente. São sentimentos que não estão nas cordas de nosso tempo estes que me perpassam o espírito enquanto me encontro neste escritório, preenchendo os vazios de entre desejos e sonhos, esperanças e utopias. Creio não haver alguma prova de semelhante estado da alma. Se houver, mostre-me este estado de alma, com certeza cada um de nós irá identificar suas características, suas diferenças.
Oh! Boa lágrima inesperada! Não preciso de recursos de estilo, é tão vulgar e esquisito como expor a minha intimidade nos salões literários, mas aqui senti muito forte o sentimento de que me reconheci na imagem refletida no espelho, e não restou alternativa senão verter lágrimas, a emoção de conhecer-me, de me identificar com os sonhos e utopias que perpassam o âmago da alma. Esboço um sorriso no rosto, indagando-me o que importar que os olhos não sejam sempre afeitos ao choro, nem que esta noite chuvosa, sempre por ocasião do Dia de Finados chove, só muito poucos Dias de Finados em minha vida pude conhecer e saber que não chovera, esta noite parece exaltar sentimentos mui diversos da melancolia, nostalgia, saudosismo...



(**RIO DE JANEIRO**, 28 DE JANEIRO DE 2017)


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