**NO PROSAICO LAMENTO "ANSEIOS & DESEJÂNCIAS" INERENTES E INTERDITOS NÃO REALIZADOS NO CONTEXTO INVOLUNTÁRIO DA ALIENAÇÃO** - TÍTULO E PINTURA: Graça Fontis/PROSA POÉTICA: Manoel Ferreira Neto


Quem me dera agora tivesse a harpa para "dedilhar" o soneto ao silêncio!...



Oh, palavras des-memorializadas, des-moralizadas, contudo res-guardadas, entretanto resgatadas, todavia salvas, ditas de novo, re-ditas, tornadas a dizer, não importando se repetidas, desde que haja fôlego. Poder da voz humana re-criando novos vocábulos, in-ventando inusitados vernáculos, e dando sopro aos exaustos, exauridos, crispação do ser humano, árvore irritada, contra a miséria e a fúria dos ditadores, contra a pobreza deslavada e o desvario dos autoritários. E as palavras subindo.



Quem me dera agora tivesse a harpa para dedilhar o soneto ao silêncio!...



Ex-istência ser o in-acreditável e in-concebível do não-ser - como literalmente mágoa, como essencialmente desgosto, como naturalmente des-esperança, como simplesmente desolação. Daqui atento um bocado do mundo e se o contemplo estouvado, padecendo de uma dor superior do que pretendi, permaneço cônscio de não haver sido aniquilador arrogado, arrojado, apesar de hospedar o alheamento de não o haver auxiliado a elevar como incumbia, insinuando estas asseverações que os dois jeitos opostos do meu proceder espelham o meu alheamento humano, legando-me a convicção que a eles só debandam aos homens dotados para buenas-dichas eminentes… Quem sois? E como referia Friedrich Nietzsche, Vós não sois águias, por isso não entendestes o prazer no deslumbramento do espectro. Quem não é pássaro não deve adejar sobre báratros.



Quem me dera agora tivesse a harpa para "dedilhar" o soneto ao silêncio!...



Frestas à vista para a sinuosidade dos horizontes que mostram imagens dispersas nos interstícios das perspectivas, no íntimo dos acordes angulares, no âmago das visões, pontos de vistas – "o melhor perfume está nos menores fracos" -, quiçá a-nunciando a verdade in-consciente do verbo de tecer sendas ek-sistenciais, veredas con-tingenciais . em direção à vida do eterno des-figurado de dogmas, des-entrelaçado do absoluto hades, des-membrado da verdade dúbia, ambígua, se a liga me ligasse, eu também ligaria a liga, mas, como a liga não me liga, também não ligo a liga. Quiçá revelando a in-consciência estética do sublime de compor o indicativo presente do que a a-mortalidade de princípios e raízes, de sêmens e mitos, por vezes havendo sementes e húmus, do vazio em plena náusea do nada.
Flores, folhagens mirradas, respingos de orvalho nas flores que des-abrocham, taciturnidades, pesares, saudades integrais, melancolias sarapalhadas pelos terrenos baldios da alma, não-ser. Se é que se logra credenciar os futuros se desperdiçaram no báratro do tempo, os espaços imergiram literalmente na infinidade dos transatos do não-ser, mister observar de encena no sentido do infindo as dissimulações que se desvaecem acessíveis no passadiço de ventosidades de nascente, que eterizam susceptíveis no abismo à face das claridades do dia, experimentando nos intervalos do âmago o oco, o literal do zero!... ...! !...



Quem me dera agora tivesse a harpa para “dedilhar” o soneto ao silêncio!...



Frinchas à luz dos linces dos olhos con-templando as linhas cambaias do universo que desenham in-terditas palavras metrificadas de in-auditos mistérios do des-nada sonet-ificando as tragicomédias do absoluto divino, sonet-izando a sátira lavada dos idílios compactos das sorrelfas subjuntivas do “era” verbo defectivo da morte pretérita do gerúndio de ser que atravessa as pontes partidas do jamais-sempre, do sempre-nunca, das arribas impretéritas da essência, dos confins partícipios dos fundamentos, metafísica do nonsense, teoria do conhecimento das partícipes nonadas do eidos-para a sepultura do além, tumba dos confins, mausoléu das arribas, jazigo da etern-idade, cárcere eterno do mais-que-perfeito infinitivo, antropologia de lendas e rituais das florestas onde se abrigam os mistérios, exegese das declinações genitivas das ipseidades e facticidades da con-tingência dos encontros e des-encontros, alfim o sem-ocaso à re-velia do crepúsculo e entardecer da in-olvidável sombra pálida do não-ser de estrofes des-providas de sensibilidade e provérbio do espírito, de rimas e métricas destituídas de razão e anedota da alma.



Quem me dera agora tivesse a harpa para “dedilhar” o soneto ao silêncio!...



Grimpas à sombra de vernáculos da palavra, linguistificando os ditos da imperfeição, inter-ditos da perfeição, a fala do des-presente dos ideais e utopias, o diá-logo do des-pretérito das idéias, escarafunchando as poeiras do nada, pós da inutilidade, cobrindo os vazios do sem-nonada, “porfim” do inconcebível da in-leveza do insustentável ser, ser de abas largas que diminuem ao longo das vivências e experiências, no per-curso da morte para a vida, não a morte luz da vida-para a perpetuidade, perenidade, não a escuridão da morte-para o aquém do gênesis. A árvore do ser, por inter-médio das dialécticas das nonadas em direção às pontes partidas carnavalizam os abismos de ventos, ventos do redemoinho, ares do catavento, atrás das montanhas que não visualizam o além da inconsciência da travessia das con-tingências de lágrimas, enclausuradas aos limites, obstáculos, impossibilidades do ser-para a vida... vida é sentir não a sua profundidade, despertar e espíritos para a realização do sublime amor ao eidos da espiritualidade, ser vida é templorar no tabernáculo do ser o buraquinho da sensibilidade e espiritualidade.



Quem me dera agora tivesse a harpa para “dedilhar” o soneto ao silêncio!...



Apanhar e albergar népcias insofismáveis e ilícitas que flutuem formais nos duradouros locais do anil celestial, caminhar, divagar nas periferias desenxabidas das vias, repousando à indolência da bofetada extensa, da tapa inócua, espertando com o gorjeio dos pássaros, o melodioso sulco da natura, continuar a expedição de sem abas e eirados, sem narteces saídas para o in-exequível, sem margens e beiras para o inolvidável. Ex-istência ser o in-acreditável do não-ser - como literalmente mágoa, como literalmente desgosto, como naturalmente des-esperança.



Quem me dera agora tivesse a harpa para "dedilhar" o soneto ao silêncio!...



Augúrio apaziguado, vagas plácidas, medos entupigaitados de nuvens claras e escuras embatem na face das casas, deslizam pelos muros desenhados de lodo, pichados de letras mortas, escorrem largamente pela terra. O meu pensamento fosforece. Minhas idéias reluzem-se. Evola-se no ar umedecido dos pingos de chuva que caíram por instantes, suspende-se o ergo non sum. Estou nu por dentro, vê-se nitidamente a minha intimidade tímida, envergonhada, vexada, e a inocência é aí, agora ainda, por sempre, na eternidade do instante, no momento da efemeridade, e a ingenuidade é lá, por algum tempo, na etern-itude do momento.
A lua vai alfim aparecer. A neblina alastra ao meu horizonte sem fim, aos meus uni-versos por serem, os olhos doem-me da nitidez estéril, do nítido nulo, da aparência frígida, da folha limpa por escrever. Timbre de prata, flutua! As cordas da lua tremem.



Quem me dera agora tivesse a harpa para "dedilhar" o soneto ao silêncio!...



Passam a legenda e os anjos, passam os mitos e as fadas. Passam os ritos e as bruxas. Que é que isto quer dizer? Ou nada quer dizer? Devo estar velho, a solidão ec-siste insuportável. Ou quê por ela? De repente a vida ficou muito mais extensa. Os olhos deambulam muito longe, a longitude da correspondência entre o horizonte e o infinito. Tão extensos, tão longe que tudo atrás fica lendário, tudo atrás é conto do vigário, é estória da carochinha, é causo de tropeiros e andarilhos. Respiro devagar, trago a fumaça do cigarro lentamente. Como se me balanceasse o corpo ao ritmo sereno do universo. Noite ofegante, olho-a. Pela janela, ao alto, sobre o negrume dos pinheiros, silencioso céu. Estendo-me na rede, extenuado das memórias do dia, do cão que latia incansavelmente por estar preso pela corrente, do barulho da água que enchia o tanque de lavar roupas...



Quem me dera agora tivesse a harpa para "dedilhar" o soneto ao silêncio!...



É no silêncio que vivo, aprenderei outra linguagem? É na solidão que prolongo os dias, aprenderei outro estilo? Não há palavras ainda para inventar o mundo novo. Não há sentidos ainda para revelar o outro dos sonhos, utopias, dos verbos que hão-de ser. Estou só, horrivelmente povoado de mim. Valeu a pena viver? Valeu a pena trilhar as estradas de poeira? Valeu a pena passear pelas manhãs, con-templando as folhas verdes umedecidas do orvalho da noite? Matei a curiosidade, vim ver como isto era, valeu a pena. É preciso que tudo des-apareça para que tudo possa re-construir-se - re-construir-se através de um "deus único", um "deus final". Não sei ainda a linguagem do mundo que terei de re-inventar, o estilo da ec-sistência que terei de re-criar, a forma da imanência que terei de re-fazer, o enredo do cotidiano que terei de artificiar.



Quem me dera agora tivesse a harpa para “dedilhar” o soneto ao silêncio!...



Astros submersos - a maior loucura do mundo se explica por certo modo de perder esta outra cena, e o fantástico não é outra coisa senão a dissolução da fantasia. Terra estéril, sobrevivente eu. Clamo a morte do homem, rogo o fim da raça, anuncio a sua vinda. Choro meu de alegria, ó anjos da nova pura. Riso meu de tristeza, ó querubins da nova inocência. Cântico dos anjos da anunciação, dos anjos das trevas e do desastre, os sinos nos domos das igrejas, basílicas, catedrais, bradam para o vazio do mundo, para o nada dos confins do infinito. Virgindade do meu sangue, um Deus Menino vai nascer. Os deuses nascem sobre o sepulcro dos deuses.
E um silêncio longo, feito da neblina ao longe, encobrindo a montanha, da cidade sepultada em solidão, do cerco à volta do espaço para além, abre-me de um abandono final - o de quem está ao pé e já nem se olha, já nem se sente, já nem se vê, já nem se pensa, já nem se vislumbra. O espaço esvazia-me até ao limiar da memória, onde alastra o meu cansaço, o afago quente de um coro, o aceno de sinais que se co-respondem como ecos de um labirinto. Num bafo secreto afloro o que estremece sob os gestos alfim apaziguados.



Quem me dera agora tivesse a harpa para “dedilhar” o soneto ao silêncio!...



Quem dantes me encaminhou exultação e à minha fação espezinhou sendas desconhecidas, desdenhou horizontes longínquos, saudando comigo o deleite das patenteadas... Ao meu lado permanecia quando desabotoei para o entoo, para os sonidos da existência, para a música de cânticos de buscas... Indiferença imprevisível, obscuras realidades... Veracidade prestes, querença sumida, inculpabilidade furtada, que, como faíscas, assolaram meus esboços, meus devaneios... Manipulação desmedida, suja magia, trevas que corrompem a alma... a vida! Imergido no reentrante do sofrimento, na angústia, na dor, na tristeza... a claridade em momentos se avizinha, mas não me granjeia, extraviado no báratro, nutro que consigo tateá-la... Mas quando, a que ponto? Meus olhos já embaciados vociferam por auxílio, bradam que me encontrem... Me achem... Que me libertem...



Quem me dera agora tivesse a harpa para "dedilhar" o soneto ao silêncio!...



(**RIO DE JANEIRO**, 21 DE JANEIRO DE 2017)


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