*IMERGEM-SE/EXPANDEM-SE SENSÍVEL E INSTINTIVAS, DELINEANDO-SE COM IMPARCIALIDADE E SATIRICIDADE, DEBILIDADES DO ESPÍRITO - I PARTE** - TÍTULO E PINTURA: Graça Fontis/SÁTIRA: Manoel Ferreira Neto


Bons dias!



O sinal da pubescência, adolescência, juventude talvez seja uma extraordinária vocação para o tabernáculo de imbecis, onde as felicidades e virtudes nem chegam a ventos do inverno e da primavera, as melancolias e dignidades nem abarcam as chuvas torrenciais do verão para as felicidades solenemente fáceis e sensaboranas, para as alegrias temporonas e verdes de sentido. É sobretudo e sobremodo uma precipitação às glórias de tantos outroras em direção ao risível e insosso, é desta precipitação que os freqüentemente freqüentadores de tais tabernáculos começam a contar as contas do terço aos trinta e oito, idade esta bem característica pela ilusão do ridículo e estúpido, do despautério e nonsense, como convém à intimidade do ser humano, da humanidade por milênios de sua existência, pela sociedade carente de princípios e idoneidades. Em geral, alguns dotados e inteligentes, curta inteligência de imaginar a vida antes de um sonho e de uma seriedade, jogaram as cartas e se despediram absolutamente nus, as cuecas ficaram dependuradas na cabine do toilette, as calcinhas no cabide do banheiro, algumas ainda a serem usadas, outras esperando o tempo de serem devidamente lavadas. Seus momentos de felicidade são bruscos e impiedosos. Nesta abundância de tão egrégias idéias e pensamentos, nesta prodigalidade tão espontânea quanto medíocre, a vida imita a curva das grandes imbecilidades e paixões, repentinas, exigentes, generosas, por vezes compassivas de si próprias. O objetivo não é o de construir, mas o de excitar, sem chegar aos limites da entrega e da volúpia, a intenção de queimar, as palhas somem nos horizontes da fumaça medíocre dos sentimentos tão espúrios quanto ininteligíveis. Pensamentos virtuosos e sinceros são permitidos apenas aos mui virtuosos e inconsequentes quanto basta a um cretino e idiota, aos simplesmente insanos e aos despirocados de primeira viagem ao redor da imaginação fértil.
Sem sombra de dúvida, desculpem-me a intrujice e galhofa, mas algum estético está condenando por vezes este texto por estar me servindo de uma linguagem tão medíocre, sem sombra de dúvida. Não me resta a mínima dúvida de que a virtude seja uma palavra sem qualquer significação neste recinto tão peculiar e interessante de se observar de longe, neste tão peculiar tabernáculo de imbecis. Até mesmo as línguas ferinas são unânimes em dizer e mostrar suas explicações e justificativas de estar eu me referindo ao templo do deus dos hebreus, durante a peregrinação destes pelo deserto, símbolo da convivência ou encontro entre Deus e o homem. Ninguém é contudo tão esperto – e não sei se sabeis vós mas o antônimo de Manoel é esperto – para perscrutar o íntimo de seu risível, interstício de sua mofa e galhofa. Não pretendo dizer os freqüentemente frequentadores do tabernáculo de imbecis não têm princípios ou lhes falta o senso destes mesmos princípios. Mas ninguém para dizer que não me refiro a um restaurante ou barzinho deste imenso mundo e solidão de todas as juventudes e adolescências, de todos os amores e paixões.
Ao contrário, tais imbecis em seu próprio tabernáculo têm sua moral bem definida e caracterizada, solene e construída com o suor do corpo e da alma, e sonham calda de morango, tomando bem um suco de limão capeta, o açúcar ou o mel faltaram à mesa, só no final de semana as coisas ausentes da despensa estarão presentes. Ninguém tem a devida coragem e senso de autenticidade em rir, rir destas palavras todas que só têm sentido talvez nalgum outro rincão do mundo e não templo do deus dos hebreus. Ninguém deseja estar rindo de tão tamanha imbecilidade, mas sabendo de antemão que nalguma terra, seja daqui ou dacolá, mas nalgum lugar existe um tipo assim tão cretino e imbecil quanto outros que conheço e seguem frequentando assiduamente o tabernáculo de imbecis, contando suas piadas de salão e mesmo as picantes como tempero, colocando a vida alheia em dia.
Estamos numa fase bem avançada e de experiências elementares do ridículo e do risível, quanto se observa nalgumas tabernas à beira das estradas e das esquinas, que têm cuidados especiais com as senhoras e ainda mais com as grávidas. Jamais são capazes de atacar a dois um adversário, pois os muros da presença são inatingíveis, isto seria não apenas covardia mas auto-piedade. Quem não observa esses mandamentos fundamentais e elementares, “é porque não é homem”, e assim fica o cachorro que interrompeu a sua passagem, e os olhares se encontraram na distância de tão grande similaridade de caráter e compostura, saindo quando desejou, aí o outro continuou dirigindo o seu automóvel. Cenas assim estão latentes nas ruas e esquinas de todos os lugares, desde cidades e metrópoles, até lugarejos e choupanas no meio do mato e capim que circundam o ambiente em que nada mais diz qualquer respeito, nem mesmo a dignidade de homem e indivíduo.
Não creio que alguém possa com isto, com toda esta imbecilidade e cretinice, id-ent-ificar alguém em especial ou em algum lugar específico, senão em qualquer lugar há os freqüentemente frequentadores do tabernáculo de imbecis. Não me refiro a ninguém, aliás não creio que se possa acreditar em única palavra aqui dita, mesmo porque estou apenas seguindo o fluxo de minha experiência e vida, num outro ângulo, num outro ponto de vista bem diferente do que já fiz, desconheço sim os seus sentidos mais profundos. Não me refiro a ninguém, o que for dito acerca deste escrito será apenas um murmúrio de outrora, quando há tantos outros inda a conquistar e cuidar.
Tenho reparado sempre nas caras de compaixão a meu redor, quando vejo passar um indivíduo cercado de amigos e conhecidos, íntimos e colegas, enfim a todos os homens que convivem comigo neste mundo, ou sou eu quem convivo com eles?! Também aqueles que são acompanhados pela polícia. E, mesmo sem saber o que fora o seu delito ou culpa capital, é caguincho e sem qualquer pudor ou moral, ou simplesmente não-conformista, exclamam: “Pobre Homem!...”, ou ainda com certa admiração e ternura na voz “Deve de ser ele um grande vigarista!...”
Em última análise, não é isso o que desejava dizer, não é isto o que intencionava escrever. Gostaria de estreitar cada vez mais o cerco a uma verdade cuja força neste instante sinto bem no íntimo de minha rebeldia e da qual a outra não era senão um prolongamento, uma continuidade, uma verdade que vai desde as pequeninas rosas tardias de uma casa de religiosas até as mulheres da manhã de domingo, os seios soltos nos vestidos leves e os lábios úmidos. Não é muito comum que um homem se sinta com o coração puro, inocente, ingênuo, a fonte originária do amor e da compaixão. Pelo menos – assim posso expressar o que de súbito e imprevisível se incidiu no olhar e não pude nada mais dizer -, meu dever é considerar como verdade aquilo que tão singularmente me purificou, mesmo que esta verdade possa parecer a outros uma blasfêmia, uma acusação, uma necessidade de tentar o risível e insosso. A verdade que me iluminou e sagrou por todo o sempre foram a ironia, cinismo, sarcasmo, mas isto não responde a questões outras, mas se observa e evita, tão simples quanto um suco de maracujá ou jaca, embora fique eu tão mole.
Sozinho, sentado no sofá, sinto-me como alguém a quem se agarra pelo pescoço, e que clama sua fé qual palavra derradeira. Tudo em mim protesta contra semelhante resignação.



(**RIO DE JANEIRO**, 09 DE JANEIRO DE 2017)


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