VERBO VAZIO DA PERDA GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: PROSA



Se bem que o sentido não seria bem este que surgira à mente em átimos de segundos, esvaecendo-se, contudo poderia considerá-lo como sendo não inspiração para investigações e avaliações no concernente às sensações da existência, mas uma idéia a ser des-envolvida, a náusea que inda não se apresentara.

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Passaram-se várias horas desde esta anotação, desenvolvê-la-ia mais tarde, calma e tranquilamente, todavia não me surge ínfima idéia de que sentido me referia, da coisa que anunciou-lhe, perderam-se no tempo passado. Deveria sentir-me incomodado, irritado, alfim perder idéias em nada há de agradável, conformar-me é o mais aconselhável, perdeu, está perdido.

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Não vou deixar o início ao léu das coisas, mister criar, inventar sentido para ele, não diria tornar-lhe inestimável, de valor nunca dantes pensado e imaginado, conferindo-me importância, mérito sem limites e fronteiras, inscrevendo-me o nome nas tábuas da inteligência, sensibilidade. Provar-me que fora egrégia a perda, dera margem a outros sentidos não imaginado um dia seria capaz de patentear. Faltam-me o engenho e a perspicácia para refletir a respeito de idéias, restam-me apenas sentimentos de perda.

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Escrevo a esmo, ouvindo apenas o som dos digitos tocados pelos dedos, são apenas oito por não me utilizar dos polegares de ambas as mãos. No ínterim da digitação, a perquirição contundente sobre a razão de necessitar deste som. Pode até ser que por intermédio dele a idéia perdida seja de certo modo resgatada, recuperada, mesmo que transformada, as palavras e seus sentidos querem transformar-me a vida, o que para mim é impossível para elas é em demasia possível. Não sinto qualquer presença de resgate, encontro-me disperso e alheio a tudo o mais. Seria pudesse acreditar a cuja-dita idéia acha-se nas entrelinhas, não se manifesta por o incólume desejo seja instigar-me a espremer os miolos, conferindo as minhas capacidades. Dons e talentos não são, fossem, não teria perdido. Nauseia-me jogar fora as palavras ou desistir-me delas. São verdadeiramente difíceis de serem encontradas, e significarem as intenções desejadas, queridas.

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Aqui e agora estou pensando quando a idade for um peso nas costas, não mais conseguir registrar idéias nos versos ocultos da página em branco, o outro lado da arte literalista, o que farei de minha vida. Seria o fim da picada ficar só olhando as coisas acontecerem e des-acontecerem, à espera do fim inevitável, idéias, sentimentos, sensações, emoções, pensamentos outros, mas impossibilitado de anotá-los, nem dizê-los sendo possível. Triste isto.

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Retorno ao início, releio com toda atenção e cuidado. O que mais chama a atenção sendo poder considerar o sentido a náusea que não se apresentara. Náusea de quê? Após o sentido advém a náusea? Dele ou da coisa que lhe dera vida? A única coisa a causar-me isto seria a verdade, viver com a verdade na alma é indigesto, antes as dúvidas, inseguranças, medos, alfim são húmus para investigações constantes, não se efemerizam, tornam-se inda mais presentes.

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Não adianta qualquer esforço para pensar a idéia que se esvaíra, tenho de contentar-me. Deixo, então, o vazio como testemunho da perda, se ele é tão eficiente como sempre se revelara, com efeito dará vida a outros sentidos, o outro lado deles, se não a cara, ao menos a coroa, a tiara que lhes cobre a cabeça da existência e das labutas por algo a patentear seja prova de que não a passei em brancas nuvens.

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Contenta-me o verbo vazio da perda. Não houvesse ido dormir após registrar o início, houvesse continuado, teria com genialidade descrito o verdadeiro sentido da idéia que surgira. Dormi, esqueceu-me tudo. Isto é normal: algo que me vem à alma, à consciência, deitado, instantes antes de dormir, no outro dia de nada recordo-me, mesmo que seja palavra única.

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Vão-se os anéis, ficam os dedos.

#riodejaneiro#, 22 de julho de 2019#

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