TRANSEUNTES ANÔNIMOS E A SOLIDÃO DO CÁRCERE - UMA LEITURA DO POEMA "TRANSEUNTES ANÔNIMOS" DA POETISA, ARTISTA-PLÁSTICA, PINTORA E ESCRITORA Graça Fontis




Ano apenas após a escritura deste poema, a escolha da pintura que iria ilustrá-lo, lembra-se-me haver comentado com a Poetisa e Artista-Plástica, Pintora e Escultora, Graça Fontis, sobre as grades no verso "... Aqui, detrás dessas grades...". Disse-lhe acerca de quem está atrás das grades vê o mundo em concomitância com as suas dores e sofrimentos, a sua solidão, e quem está fora das grades, as fugas, medos, condutas e posturas equivocadas levam à solidão. Hoje, relendo o poema, o olhar de fora e o olhar de dentro do cárcere, não necessariamente de prisão por delitos em todos os níveis. Digno de tirar-lhe o chapéu, reverenciando a artista pelos versos finais da solidão dentro do cárcere e fora dele:
"E mergulhar neste mundo intenso,
Enigmático, um colorido fantástico
Camuflando segredos invioláveis
Subjetivados em rostos e sorrisos
Atitudes relevantes e previsíveis
Desconhecidos casuais... sensuais
Por instantes... imortais."
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A humanidade está condenada à falsidade, à farsa, à hipocrisia. A dor do personagem, espreitando, da janela do cárcere, a solidão dos homens livres, a sua própria solidão.
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Há quem negue a própria solidão do cárcere, as dores nele vividas. Conheço professor de matemática assassino, quem numa conversa com ele, tendo-lhe perguntado se se arrependia do crime cometido, respondeu-me categoricamente: "Faria o mesmo outra vez." Nessa época, era prisioneiro, mas trabalhava na Recepção Pública do Presídio. Existem as suas exceções, com efeito. Há quem se arrependa de seus delitos.
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Imortais por estas condutas, que sentido tem? E que sentido tinha o seu delito, para fugir de sua solidão, carência? Eis o sonho da solidão: a "Imortalidade..."
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Como criar, inventar, fazer a imortalidade? Eis os sonhos, os ideais da personagem, aquando fosse libertada; a res-posta ao questionamento o poema não oferece, a intenção da artista fora a reflexão, reflexão que se encaixa, adere-se com justeza às conjunturas sociais do momento, quando se mata para ver o sangue correr, a Justiça anda de calças curtas. É esta a responsabilidade do Artista, em quaisquer níveis das artes, isto é, levar os homens a refletirem e buscarem outros horizontes.
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Contudo, artistas estão transgredindo esta responsabilidade: servem-se de suas artes para proveito próprio, satisfazerem suas vaidades e orgulhos pessoais, de tudo são capazes para se virem sentados numa cadeira do Olimpo, os rumos da sociedade, o destino dos homens não lhes dizem quaisquer respeitos; a solidão tem composto versos às pencas, vestem-se poetas e escritores com o objetivo sine qua non de angariarem amigos, seguidores, mas não tem qualquer noção da responsabilidade das Artes. Vivem hoje cercados de amigos, amanhã serão esquecidos juntamente com os versos compostos, famosos por um momento apenas. Não são artistas, nada compreendem e entendem do sentido e significado das artes, são prisioneiros de suas vaidades, o que artificiam não tem valor algum, e são cegos para isto, não tem a capacidade de enxergar nada são nas artes. Prisioneiros. Os que estão atrás das grades terão a sua liberdade algum dia, arrependem-se ou não. Os artistas servidores de si mesmos permanecerão encarcerados por sempre.
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Mister descrever as coisas para melhor compreensão e entendimento de minha interpretação deste poema inestimável. Graça Fontis encontrou nas Lembranças do Facebook esta obra escrita há um ano, marcou-me na Lembrança, enviou-me. De imediato lera. Escrevia esta interpretação, quando ela estava escrevendo. Não sabia ela que estava eu fazendo uma crítica ao poema. Escreveu: "Viver é arte de se caminhar no nirvânico universal com o pé na realidade, recolhendo poesia." Eis a resposta que deixara suspensa no poema.
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A liberdade das grades é viver a realidade e criar Arte, consciência, valores éticos e morais. Assumam ou não a grande maioria dos artistas, mas Arte é Responsabilidade com os Homens, com a Humanidade.
Manoel Ferreira Neto
(Rio de Janeiro, 31 de agosto de 2017)
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**TRANSEUNTES ANÔNIMOS**
Espreitando da janela
Via rostos brancos, negros,
Descontraídos e risonhos,
Outros tristes.
Pessoas soltas e jocosas
Aparentemente livres.
Iam e vinham a todo momento
E em cada cabeça...
Pensamentos diversos,
Planos e ambições,
Só eu os via.
Ali permaneci horas e horas,
Analisando suas fisionomias
E o que trariam na alma.
Quanto a mim... ninguém
Que perceba minhas angústias
Ou que sequem minhas lágrimas,
Principalmente ao entardecer.
O pôr do sol me deixa mais triste,
Talvez pelo medo de não mais
Vê-lo ao amanhecer.
Aqui, detrás destas grades
Invulneráveis, torno-me vulnerável
Aos próprios pensamentos
Sentenciam-me a alucinações
Constantes, a auto-punição
Pelo que não fiz
E o que não entendo, mas sinto.
Por instantes desejei ser um
Desses transeuntes anônimos
E misturar-me ao povo,
À poeira do asfalto ou
Ao burburinho das lojas;
Fugir para sempre deste mausoléu
Tépido e frio
E mergulhar neste mundo intenso,
Enigmático, um colorido fantástico
Camuflando segredos invioláveis
Subjetivados em rostos e sorrisos
Atitudes relevantes e previsíveis
Desconhecidos casuais... sensuais
Por instantes... imortais.
Graça Fontis
(31 de agosto de 2016)

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