**NÁUSEA DO VAZIO/VAZIO DA NÁUSEA - XXIII PARTE** - Manoel Ferreira


A caminhada da vida... Tantas intempéries, tantos percalços. Precisamos respostas. Entregamo-nos aos questionamentos, indagações, mergulhamos profundo em nós mesmos, nalgum cofre da inconsciência a luz.
Esquecemos das dimensões trans-cendentais; centramo-nos nas contingências, vazios, náuseas, nada, efêmeros, angústias, tristezas, solidão, são o que nos dará a resposta de que tanto necessitamos. Foge-nos o outro, foge-nos a entrega, foge-nos o amor. A vida são contingências, é através das buscas do que há atrás delas que nos encontraremos, virá-las pelo avesso, às avessas. Perdemo-nos. Andamos na sombra, nas trevas. Zumbis no mundo.
Pus a minha vela no cantinho da janela. Um símbolo. Senti que era o momento de partir, de seguir a viagem. Estava livre para esta jornada. Não sentirei solidão. Sem amarras, sem algemas, sem correntes. Abrir a "gaiolinha", deixar os pássaros voarem, voarem, voarem. Abrir as dimensões sensíveis, emoções, sensações, sentimentos, mesmo sem saber verbalizá-los, deixá-los livres. Chegarei ao meu destino, chegarei à colina. A liberdade de amar não me deixará sozinho.
Sentado naquele restaurante, alheio a tudo que estava acontecendo, pensava na minha vida, inventariava os éritos do passado. Olhei de soslaio, percebi uma jovem mulher olhando-me muito profundamente. De repente, levantou-se de sua mesa, aproximou-se da minha: "Posso sentar-me aqui com você?" Disse que sim, puxei-lhe a cadeira. "De hoje em diante, considero você meu namorado." Enquanto pensamos na vida, a vida está acontecendo, a vida acontece. Não esperava mesmo que uma mulher fosse ser tão direta comigo, sem me conhecer, dizer que me considerava seu namorado. E tais palavras deram panos para mangas. Ficamos muito tempo conversando, expondo-nos. Disse a Berenice o que achava podia fazê-lo. Segredos, mistérios. Ela não. Abria-se espontaneamente. De início, fiquei espantado com tanta sinceridade, dizia-me tantas verdades. Sensível, sincera, verdadeira - foram as virtudes e valores que percebi nela, senti-me admirado. "Quê mulher fantástica!... Não será que esteja sonhando? Só pode... Nada acontece assim deste modo."
Deixei-a em casa.
- Sérgio, então...
- Então o quê, Berenice?
- Quando nos encontraremos novamente? Disse sério mesmo. Considero sim você meu namorado. Não saí do restaurante com você de mãos dadas apenas como uma aventura, aventura de poucos minutos. Um beijo, um abraço. E nunca mais.
- É o que deseja mesmo, Berenice?
- Sim... Quero você na minha vida.
- Podemos tentar, não é verdade? Se não der certo, cada um segue o seu próprio caminho.
- Tudo vai dar certo... Depende de você exclusivamente.
- Como assim: depende de mim? Não entendi.
- Deixe para lá...
Não houve beijo. Apenas um abraço de despedida.
- Amanhã nos encontraremos, Sergio...
- Virei vê-la...
- Está bem...
Fui eu a procurá-la sim no outro dia. Não me saiu da mente um só segundo por todo o dia. Queria reencontrá-la, ver mesmo que não estive sonhando, Berenice era uma verdade. Alguma coisa não estava bem em mim, mas não soube verbalizar. Estava estranho, apesar de sentir-me alegre.



Manoel Ferreira Neto.
(31 de março de 2016)


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