COMENTA Ana Júlia Machado, POETISA E ESCRITORA, O TEXTO /**INSCREVA-SE NA LÁPIDE**/


Texto do escritor Manoel Ferreira Neto, mais uma vez sublime. Daria pano para manga. Mas em uma palavra, poderia dizer somente, que está a alertar para o viver consciente.
A erudição per si não significa que possui consciência. Em relação ao escritor poder-se-á enunciar que viveu anos e anos preso à erudição e era influenciável aos comentários dos outros. Considerava-se uma pessoa de coração mole…não agia com a consciência mas com a “pena” de ferir quiçá o próximo. Por vezes, inconscientemente, foi brusco com alguém sem se aperceber. Não murmurava a consciência…somente o que lhe parecia de acordo com a sua erudição. Chegou à conclusão que o coração que se derretia não lhe dava a felicidade que pretendia. Que aqueles dizeres antigos como se ouvisse a minha mãe,… nada dizem-lhe, Até porque nem sequer foi criado pela mãe biológica, e as que o criaram é que lhe tinham dado os bons conselhos. Família não escolhe-se, mas amigos e uma mulher, podemos fazê-lo e chegamos à conclusão que a família foram aqueles que nós escolhemos e não a que nos impingiram.
Estar desperto para a vida é aquele que participa com absoluta transparência da vida incandescente em suas múltiplas eventualidades. É o homem do presente, admitindo seu instante atual e vigilante ao seu progresso integral. O ser consciente é responsável, domina bem seu livre-arbítrio. Livre de grilhetas, solto do pretérito, edifica hoje seu futuro, cônscio. Assim, vive integralmente o hoje em todas as ações, todos os sentimentos, todas as aspirações.



Não há quem não conheça o quão é complicado este encontrar-se consciente. Na maioria das vezes protestamos automaticamente aos fatos que consideramos intimidadores, nos resguardando ou agredindo, e fazemos isto sem de fato parar e estimar se o risco realmente existe ou é uma mera compreensão distorcida.
Este tipo de atitude leva ao desfecho falso de que tudo que importa vem de fora e, portanto, somos padecentes das ocorrências e das pessoas. Na verdade não nos passa pela cabeça que nós próprios podemos ter criado, com nosso comportamento e atitude, tais intimações ou então, que não compreendemos com nitidez, em virtude dos nossos condicionalismos, o que de fato ocorre.
Sem Estarmos conscientes, não assumimos a nossa auto- responsabilidade, não autenticamos o que temos que mudar em nós, não nos aceitamos como somos e, portanto, não mudamos. Sem mudança, o mundo extrínseco insistirá feroz, viveremos numa luta constante pela sobrevivência, convergindo por posturas e reconhecimento, combatendo por espaço, lutando permanentemente uma luta inútil de vida e morte.
E como dizia Clarice Lispector- Desvendei que eu preciso não saber o que considero – se eu ficar cônscia do que penso, passo a não poder mais meditar, passo a só me ver pensar.
E Manoel no crepúsculo da sua vida tomou consciência do que pretendia e foi à procura do seu amor. Deixando tudo e todos onde residia. Meteu-se a caminho para viver o amor com o seu amor para eternamente. A sua verdadeira Família.
Termino dizendo….
Quem aguarda que a existência
Seja composta de aparência
Pode até perdurar pateta
Ou fenecer no isolamento
É necessário haver cuidado
Para mais tarde não amargar
É necessário saber viver com consciência….
Toda calhau do curso
Você pode afastar
Numa flor que possui acúleos
Você pode se unhar
Se o bem e a imperfeição existem
Você pode eleger
É necessário saber viver



Ana Júlia Machado.



**INSCREVA-SE NA LÁPIDE**



Saber não é ter consciência. A consciência é plenamente ação, sentido. A consciência é responsável por decisões categóricas, radicais, abissais. Momento de outros horizontes, universos, momento de buscas, realizações, interesses, projetos.
Por longos, longos anos, trouxe comigo sabedorias , mas recusava a consciência, por ter de agir, tomar decisões peremptórias. E o pior de tudo: íntimos advertindo-me, aconselhando-me a agir, tomar decisões, virar as costas. Agradecia-lhes o carinho, a amizade, o amor. Por vezes, a confissão da verdade singular, peculiar, pessoal é muito difícil, complicada. Mas a consciência, quando arma seu barraco, instala-o, nada é difícil, complicado: confessar é o mesmo que tomar um cálice de vinho bem saboroso. Meu coração sempre foi mole, bem frágil. No crepúsculo da vida, há-de se endurecer, sem perder a sensibilidade, como diz Che Guevara. Estou endurecendo o coração, sem perder a sensibilidade. Àquelas sabedorias, estou virando as costas. O que interessa primordialmente são a vida, a felicidade, a alegria, os prazeres. Seria que no crepúsculo da vida, não teria forças suficientes para as decisões radicais, deixar o coração mole eternizar-se?
Quem não conhece aqueles dizeres: "Mamãe dizia que...". E a reflexão posterior: "Ah, se eu houvesse ouvido a mamãe..." Não tive mãe para mo dizer: fora ela apenas biológica. Tive mães, quatro, que me criaram, e me disseram todas com as letras em riste: "Viva a sua vida. Esqueça-se de sua família." Não as ouvi. Ainda acreditei que seria possível alguma contacto, relação. No crepúsculo da vida, entendi perfeitamente o que disseram. Estou virando as costas à família. Sou filho de mim próprio. Hoje, minha família é a minha esposa, a minha mulher, a minha companheira Graça Fontis. Agora, sou eu e ela.
Como escritor que sou, a História investigará até ao "talo" as origens. A família, conforme ela, será sempre lembrada. A História pode fazê-lo: é de seu direito insofismável. Particularmente, não assino embaixo.



Manoel Ferreira Neto.
(22 de setembro de 2016)


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