#HORAS CHEIAS DE IMPERFEIÇÕES VAZIAS# GRAÇA FONTIS: PINTURA/ARTE ILUSTRATIVA Manoel Ferreira Neto: AFORISMO



"O silêncio que nos retrate somos nós, mas o silêncio in-fin-itivo é que é o silêncio vivo de nós." (Manoel Ferreira Neto)
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Se as vozes tudo perguntam, se as vozes a tudo res-pondem, se as vozes a tudo perquirem - a Esperança do Verbo de Ser é o Amor Pleno à Vida? A Esperança é a Luz de todos os caminhos da Vida? A Esperança é o Olimpo das conquistas? -, as quimeras nada indagam, questionam o vazio, só oferecem respostas, são músicas que fluem, permitindo que os sons se mostrem livremente, con-sentindo que ritmos e melodias ressoem livres e re-presentem o cântico do Ser atrás da Vida, longínquos nos pretéritos dos tempos, a verdadeira música se faz ouvir menos porque os homens dela são merecedores e mais, porque necessitam dela.
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Resta-nos apenas encontrar o tom com que abordar os sentimentos, com que artificiar a sensibilidade e subjetividade dos sonhos, desejando a cada passo, seja no deserto ou na floresta íngreme, no inferno ou no Beco do Mota, meretrizes, homens de bons princípios dando voltinhas escusas, cachaceiros, jagunços, de frente a Catedral Metropolitana, revelar o íntimo: "Eis o Ser de mim!...
sob as nuvens e sob os ventos,
sob as pontes e sob os túneis,
sob as labaredas e sob os sarcasmos,
sob o cárcere e sob o esquecido
sob os espetáculos e sob a morte
sob a lâmina de vento no pescoço,
sob o perigo atmosférico e risco fatal viral,
sob o som da melodia de serenata,
executando canção com falsos acentos
e violações da métrica...
apresentando a Vesperata da Meia-Noite
com reversos ritmos, perversas melodias,
quebra da sonoridade...
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Achado o tom para as abordagens à busca de revelações, esperamos que se abram vários eixos e que eles cubram o mundo por cima, um sudário, o calor do aconchego, o estar amparado e seguro dos acontecimentos quotidianos do medo e do desespero, signo da fé, são as características que lhe residem.
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Aumentando o calor, a sombra também se aquece, sentimos o sol na pedra acima de nós, ele, bate, bate, como um martelo sobre todas as pedras, e é a música, a vasta música de meio-dia, vibração de ar e de pedras sobre centenas de quilômetros, ah, como antigamente, ouvimos o silêncio.
Silêncio...
A verdadeira música,
Fragmento de destino,
De lei originária...
"Como é radiante
o silêncio no róseo
fulgor da aurora!..."
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Sim, não é o mesmo silêncio que nos acolhera há anos, quando nos encontrávamos sem rumo e destino, mente vazia, desesperançados e angustiados, necessitando ouvir vozes que nos dissessem algo sublime sobre a vida, mesmo que quimeras, algo percuciente sobre o que é isto - a eternidade. Disse-nos o silêncio mais que isto, mostrara-nos o sublime e a possibilidade de atingir a sublimidade desde que estivéssemos dis-postos a abrir-nos, deixando as coisas entrarem, deixando a vida espiritualizar-se de verbos e sujeitos da verdade, a boca vem de longe, sozinha, experiente, vem sorrir, aurora, para todos, a língua vem de dentro, acompanhada, fissurada pela algazarra, muvuca das críticas, náuseas...
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Desde então, o silêncio acompanha-nos, ouvimos-lhe as vozes todas.
O prazer faz com que toque a tristeza da felicidade. É extremo. Conhecemos a voluptuosidade do voo e do pairar do pássaro neste lugar nenhum, macio e claro, para onde o prazer nos arremessa antes de esmagar-nos no chão. Conhecemos a voluptuosidade de imobilizar o tempo num átimo de segundo e de prender por meio do corpo o corpo mesmo do tempo, antes que se esvaeça, tendo apenas aflorado. Conhecemos o penar e calar do silêncio, tão fino e tão atento, que, fazendo disfarce do tormento, mostramos que o não padecemos e sabemos que o sentimos. Conhecemos o êxtase e o logro do êxtase. Numa palavra, experimentamos agora a falsa eternidade da união e não reconhecemos nisso o nosso presente, não desconhecemos as futurais perspectivas do sol numinando os campos de algodão, sine qua non a ênfase.
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Tantos séculos de silêncios
armazenados atrás das cabeças
conferem à solidão uma densidade de chumbo,
e os minutos entre as palavras e as imagens
que vamos dizendo a nós próprios
passam como horas,
entre as utopias que vamos tecendo
perpassam-nos tão insustentáveis, leves, suaves, serenas.
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Até o momento em que os lábios, ou melhor, os maxilares se descerram, e são agora as palavras que parecem violar uma proibição, tabu, como uma rachadura fendendo um muro sagrado.
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Vivemos horas cheias de uma imperfeição vazia e tão perfeitas, por isso mesmo, tão diagonais à certeza "retângula" da vida. São horas caídas nesse mundo de outro mundo mais cheio de orgulho de ter mais desmanteladas angústias.
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Se pudéssemos ser sarcásticos a ponto de nos imaginar rindo, riríamos, sem dúvida, de nos imaginarmos vivos, felizes, rindo em plena madrugada, até a barriga doer. Se pudéssemos ser satírico à moda e estilo de nos concebermos vertendo lágrimas pujantes naquele instante-já do gozo e do climax, creio aí não ser a violação da proibição..., mas o deflorar aquele segredo mais recôndito da alma. Vivemos horas impossíveis, cheias de sermos nós... e isto porque sabemos, com toda a carne de nossa carne, que não somos uma realidade.
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Que horas, ó companheiro de nossa "solidão",
que horas de desassossego feliz,
horas de cinza de espírito,
dias de saudade espacial,
minutos de jogos mentais,
antes do Apocalipse que está bem longe inda,
séculos interiores de paisagem externa.
Nada vale a pena, ó nosso amor longínquo,
senão o saber como é suave saber que nada vale a pena,
que as vozes simuladas em quimeras
merecem o olhar aberto,
os ouvidos atentos às coisas que existem,
as línguas em riste tecendo e crocheteando autenticidades
são portadoras de venenos fatídicos, fatais,
merecem o coração livre para auscultar-lhes os silêncios,
Não é o muito saber que sacia e satisfaz,
mas sim o sentir e o saborear-lhes internamente as vozes.


#RIO DE JANEIRO(RJ), 05 DE MAIO DE 2020, 07:45 a.m.#

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