MARIA ISABEL CUNHA ESCRITORA CRÍTICA LITERÁRIA E POETISA COMENTA O AFORISMO 633 /**SER VERBO DO NADA SOU**/



Uma verdadeiro ensaio sobre o Amor e a necessidade de o verbalizar. Sem verbo, o Amor confina-se ao silêncio, ao nada de ser. O Amor será sempre bendito e nunca amaldiçoado. “ Sem o verbo da carne... o verso é eternitude solitária à luz do deserto” Quanta verdade nesta afirmação. E o autor rejubila quando refere o encontro da sua amada que o completa e sublima, dando-lhe a verdadeira noção do Verbo Amar. Fenomenal prosa poética e filosófica. Parabéns.


Maria Isabel Cunha


#AFORISMO 633/SER VERBO DO NADA SOU - TRAVESSIA DE MINAS GERAIS AO RIO DE JANEIRO#
GRAÇA FONTIS: PINTURA/ARTE ILUSTRATIVA
Manoel Ferreira Neto: AFORISMO


EPÍGRAFE:


"Sem o verbo da carne, sem a carne das volúpias, sem os ossos dos conflitos da psique, o verso é etern-itude solitária à luz do deserto." (Manoel Ferreira Neto)


Verbo do nada de ser...


E o nada "persignou-se das" (Deus me livre disso,
nessa acepção regencial do verbo)
Das falácias egrégias do absoluto
Que edificam as contingências
Com promessas da Verdade, Redenção, Ressurreição,
Das verborréias incólumes do eterno
Que habitam os abismos inconscientes,
fugas, justificativas, mentiras, medos,
Que residem as misericórdias trágicas
De sentimento dos limites do homem
Temor arcaico-mítico de afetos
Dignos de louvor...
Tremor erudito-místico de afagos
Indignos de elogios, reconhecimentos...


E o nada persignou-se das (Deus me livre disso)
Dialéticas genitivas
Estranhas do ponto de vista da língua
Libertar a Katharsis do espírito moderno
Às vésperas de ser romanticamente moldado
Moldado de pectivas de pensamentos, de idéias
Do vazio, dos manques-d´êtres (sei lá se
o plural de manque-d´être seja assim escrito,
Invento quiçá uma gramatiquice no francês
Ou registro falácias das verborréias,
Em Português, sigo a trilha das novas gramatiquices,
como dizem os gramáticos, sandices de um tresloucado,
mas criando sentidos, metáforas verbais da apoteose
almática das dores e sofrimentos),
Moldado de pers de imaginações férteis do fútil
Para amenizar as paranóias, anestesiar as esquizoidias.


Ser verbo do nada sou...


Coração represo, silêncio intrínseco do mundo, mar branco com ondas nas lentas dos cerros, barcos negros de casas, mastros de ramos de árvores...
Sou de verbo o nada de ser...


Silêncio profundo, silêncio cósmico de astros rolando pelo espaço vazio, nuvens desprendem-se das mechas de neve que arrasam, em planura, a última arrogância das coisas... a penúltima insolência das in-verdades... a anti-penúltima petulância das efemer-idades, Idade do Efêmero, e das Fugas instantes pósteros.


E o nada "persignou-se das" Deus me livre disso
Quimeras monossilábicas que urgem
Das carências dia-lógicas, verso-lógicas
Do "Deus me livre disso",
Na acepção regencial da consciência
Que as envolve, evolve as utopias da estética...


Ser verbo do nada sou... débil lembrança de um momento nunca abarcado pelos sentidos, JAMAIS SENTIDO PELO INTELECTO, de uma verdade só memória, sem tempo, cheiro real do mistério fluído da hora, tantas vezes evocada saudosamente... imaginário das sinas e sagas re-colhidas na rua José Bonifácio, poeirenta e esburacada, felizmente hoje asfaltada, e a casa onde o quotidiano das coisas grosseiro, violento, promíscuo acontecia, por tempo limitado mas deixara traços e marcas, não existe mais.
Acabo de confirmar isto, passando defronte ao lugar. A falácia de uma tragédia transforma os universos dos sonhos e esperanças: prostituta fora estraçalhada nos trilhos da linha férrea por trem de passageiros na minha tenra infância, todos diziam que suicidara, era prostituta, apaixonou-se, o objeto de seu amor deixou-a, vinte e nove anos se passaram, dissera-me pessoalmente, num supermercadinho, comprando produtos de limpeza, prostituta que con-vivera com ela que, em verdade, fora atravessar a linha férrea, tendo o trem de passageiro buzinado, prendera o chinelo de dedos no dormente, não dera tempo de se desvencilhar dele, atravessar...


Sou o nada do verbo ser e verbo do nada de ser...


Com uma estrela branca aos pés e ao lado, e uma meia-lua vermelha do lado oposto e ao alto, emerjo, alfim entre os astros, doce e belo, irmanado ao absoluto dos meus instantes-limite, regressado à in-verossímil pureza que ignoro em mim.


Nas minhas noites de sendas perdidas, murmuro uma cantiga ou penso na eternidade de alentos últimos e derradeiros que habitam o seio humano, e repito baixinho, quase em silêncio, um nome, "PROFETA DE NADA VAZIO."


A sós comigo entre o meu Cristo e as flores colhidas no crepúsculo, com que ornamentei o criado-mudo de minha alcova, mergulho nas águas sagradas con-vertidas em felicidades e alegrias, na fresca noite chovendo sobre mim o piedoso orvalho da paz e de todas as auroras sublimes e divinas.


Tantos sonhos de ouro, tanta esperança, que do gênio a fortuna, suspirando a brisa de lágrimas ardentes, convida à prece solene, cantando dos tempos as vozes e graças da imortal verdade, da indubitável in-verdade.


E o vazio se fez carne do verbo, se fez liberdade e responsabilidade; e o nada se faz estética dos in-fin-itivos ócios do oficio de retirar a sua carne, descarnar os ossos, para que o "vazio" se re-vele, re-vele suas a-dialécticas do sagrado e profano nos interstícios dos acontecimentos dia-a-dia.


Crio emoções que sonham, re-versam desejos de amar livre o silêncio. Edifico linhas no uni-verso, nas noites de carências latentes, aladas de esperanças do encontro, das flores se abrindo no jardim de primaveras do que há-de vir. Num verso silábico de ilusão, crio, re-crio o além numa palavra monossilábica de ternura, invento o aquém num som suave de pá-lavra sin-tagmática e esvoaço as bordas do abismo de vazios... O que sinto em mim dentro recito de fantasias a melodia do encontro. Sou a liberdade musical de sentimentos que me perpassam a alma de vontade do gozo... clímax... prazer.


Sem o verbo da carne, sem a carne das volúpias, o verso é etern-itude solitária à luz do deserto.


Este cântico, quem sabe lírico, quem sabe metafísico!, quem sabe idílico, quem sabe verbal do ser!, quiça produto imaginário feito na madrugada, entre nostalgias, entre alegrias do amor, entre desejos de a-núncio e re-velação de sentimentos inda por virem à luz, que se compôs, que foi recitado em silêncio, há algum tempo, é mais que um cântico, é mais que uma canção, é mais que uma pintura, cores, traços, criações, subjetividade, intimidade, verdades da alma sedenta de amor verdadeiramente amar o outro nas suas diferenças, comunga-las, torná-las utopias e verbos de esperança. O tempo que penso como medida de todos não é apenas uma medida de relação de meu pensamento? Então...


É arco-íris esplendendo cores, que colore o croqui do in-fin-itivo in-finito de arte e engenhosidade, são pingos de chuva deslizando no vidro da janela, é chama na lareira, aquecendo o corpo do inverno, é chama, é poética do fogo, descortinando as fumaças efêmeras de ontem, de outroras antes de quaisquer outras outroras. É cântico composto de dentro dos recônditos da alma, perfumada de lágrimas pujantes, de suores da labuta, arrematada nas ad-jacências, cerzida nas bordas,
andou por anos latente nas profundezas do coração, venceu chapadões, venceu estradas de só poeiras, varou florestas silvestres, varou abismos e montanhas, selvas de pedras,
muitas grades e cavernas, muita lama e privações, muitos mata-burros e obstáculos.


Cântico composto na solidão de ruas boêmias, cantadores tropeçando nas pedras, nos buracos das calçadas, no silêncio de estrelas, da lua, das alamedas desertas,
pirilampeando a escuridão, o breu de terrenos baldios, que sendo o amanhã, tempo de outros sonhos e fantasias, templo de novas esperanças, de fé outra, no alvorecer se complementa, absolutiza-se, etern-iza-se, e cresce como o fermento, como aboio que na distância, no longínquo dos confins do Infinito, escuta-se, glorificando o berrante.


No per-curso, de-curso, in-curso deste cântico
- comedido, lento, mas constante -
Temperado de suspiros, lágrimas e sangue, o homem transita do escuro pleno, do breu absoluto, da escuridão completa, para inicializar a madrugada, para iniciar os idílios da aurora se anunciando na passagem dos ponteiros do relógio suspenso na parede.


Mesmo que os fantasmas da noite, mesmo que os monstros dos pesadelos, mesmo que os "capetinhas" da madrugada em tocaia re-tardem o verso, posterguem as estrofes, atrasem as rimas, num murmúrio, num sussurro, este cântico conquistará a claridade, realizará os primeiros raios de sol, plenificará as pétalas de flores des-abrochando, exalando o perfume inebriante das etern-itudes da sublimidade do Verbo Amar.


Travessia da madrugada de Minas Gerais, rumo ao meu querido e tão amado Rio de Janeiro, olhando o nada da noite, os seus abismos misteriosos, con-templando os vulcões de sonhos e utopias outros, repousar nos seus braços no encontro, o início de uma viagem na Arte dos sentimentos e emoções, sendo esposa e companheira das artes carioca, minha paixão verbática dos sentimentos que nutro por ela.


(**RIO DE JANEIRO**, 13 DE MARÇO DE 2018)


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