#DESERTO INQUIETANTE# GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: POEMA ----



Deixai a imagem ser delineada pelo espírito
Com sensibilidade e inteligência,
- conceber-se e gerar-se sozinha,
tornar-se arte, literária, poética, plástica,
trans-literalizar-se -
Inter-médio dos traços que dais na tela da alma,
Inter-médio dos vazios que deixais nos papéis
Que assumistes e não cumpristes,
fictícios, imaginários, fantasiosos,
atitudes e ações adversas, contrárias,
Inter-médio da intuição de revelar sonho interdito,
alegria breve, o nítido nulo,
Perquirir as carências e desejos de realização
Aliás, nem soubestes performá-los, dar-lhes vida
Não é tão simples, ad-vem da dignidade e honra,
A autenticidade do que reside no subterrâneo da alma.
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Deixai a balada nascer dentro de vós como rumor de águas
de cachoeira, a sonoridade da queda no lago, no rio,
nascer o cântico do amor, a ópera do silêncio
sinfonia do verbo da solidão,
como um vento despertando as folhagens,
na madrugada serena, tranquila
na manhã nublada, ensolarada, chuvosa,
na tarde suave, clima ameno,
em qualquer instante...
Não vem de supetão, vem de longe e de muito tempo,
Sentir-lhe presente, sentir-lhe as anunciações,
Sensibilizar-vos in totum,
Dons e talentos abrindo-se, despetalando-se,
Criando perspectivas, horizontes à distância.
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Como é que tendes de súbito esta serenidade
de quem recebesse uma hóstia sagrada em plena desgraça?
Por que já verbalizastes as sensações pós inspiração,
Conheceis estas dimensões, estais sempre desejando
Saber mais, mais e mais?
Deve ser de versos que lestes e nem vos lembrais,
de telas que vistes, de músicas que ouvistes,
de esculturas que tocais, de peças a que assististes,
de sorrisos que percebestes nos lábios de uma criança,
de brilho que vistes nos olhos de um homem
que vos contemplou com sinceridade e amor,
de mágoas, ressentimentos, ódios
que acumulastes, remoestes,
de vossas recusas em mostrar as neuroses e psicoses
nas estantes de livrarias, nos métiers da mídia,
não comestes leva-do-diabo,
sendo aconselhável serdes amarrado
na sombra como um asno,
idéias, utopias, ideais que vos habitais,
quereis divulgar aos universos e horizontes...
imprescindível mergulho no regaço psíquico,
arrancar-lhe os interditos...
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Às vezes,
No chão do rumoroso deserto em que pisais,
Deserto de angústias ardentes
a cobrirem o peito de sombras,
Deserto de lembranças, recordações de cargas negativas,
Deserto de tristezas e carências inomináveis,
Deserto de sonhos e esperanças de completude,
Deserto de quem não sentis o corpo e alma aderidos.
Assim não vos sentindo existir,
Ausência, falta, falha,
Quem sois de quem é em vós,
De quem estais sendo neste instante-já,
Quem de vós sois,
brota o milagre da canção
no fundo da solidão inquietante
em que vós debateis
nalguns instantes
de vossa vida
nasce a verdade do Ser.

#RIO DE JANEIRO(RJ), 15 DE SETEMBRO DE 2020, 04:15 a.m.#

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